231 milhões da almofada financeira foram para pagar salários em 2023 

No parecer à Conta Geral do Estado do ano passado, o Tribunal de Contas critica a utilização da dotação provisional, destinada a despesas “imprevisíveis e inadiáveis”, para gastos  correntes. Dos 804  milhões de euros utilizados, cerca de 45%  foram para este tipo de despesa. 
Operações excecionais e financiamento junto de entidades públicas contribuíram para as “contas certas” de António Costa e o seu ministro das Finanças, Fernando Medina. Foto: Paulo Spranger
Operações excecionais e financiamento junto de entidades públicas contribuíram para as “contas certas” de António Costa e o seu ministro das Finanças, Fernando Medina. Foto: Paulo Spranger
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No ano passado estava inscrita no Orçamento do Estado uma verba de 814 milhões de euros de dotação provisional. Trata-se de uma almofada financeira destinada a cobrir despesas excecionais não previstas. Do montante inicialmente orçamentado, o anterior governo socialista gastou 804 milhões de euros, ou seja, 98,8% do total. E cerca de 45% “não foram utilizados em despesas ‘imprevisíveis e inadiáveis’, como determina a lei, mas em reforço de dotações para despesas de caráter recorrente, designadamente as despesas com pessoal e outras na área da educação e ensino superior”, critica o Tribunal de Contas, que ontem entregou na Assembleia da República o parecer à Conta Geral do Estado (CGE) de 2023. “Este procedimento é, mais uma vez, evidência de insuficiências no processo de orçamentação”, conclui a entidade que fiscaliza as contas públicas. 

As despesas com pessoal absorveram 231 milhões de euros da almofada do Ministério das Finanças. O Tribunal de Contas detalha que 87 milhões de euros foram para “estabelecimentos de educação e ensinos básico e secundário”, 86 milhões para a PSP e GNR, e 50 milhões de euros para instituições do ensino superior. Houve ainda outras despesas cobertas com a dotação provisional, que o Tribunal de Contas considera não terem justificação para tal, nomeadamente 12 milhões de euros em aquisição de de bens e serviços por instituições do ensino superior, para compensar o “impacto da inflação”. O mesmo se aplica a transferências correntes de 13 milhões de euros “para o apoio do ICNF [Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas ] aos centros de recolha oficial de animais”, de 25 milhões de euros “para bolsas de estudo no ensino superior” e de 50 milhões de euros “para reforço do Fundo de Financiamento para a Descentralização no domínio da educação” porque, explica o parecer, “inclui financiamento de refeições escolares, despesas com transportes e pessoal não docente”. 

A entidade liderada por José Tavares sublinha ainda que a dotação provisional, “à exceção do ano de 2021, tem vindo a aumentar significativamente nos últimos anos, representando em 2023, duas vezes e meia mais do que em 2019”. Nesse ano, estava orçamentada em 330 milhões de euros, exatamente o valor que acabou por ser executado. 

O Tribunal de Contas questionou o Ministério das Finanças e a Direção-Geral do Orçamento (DGO) sobre o recurso que considera indevido à almofada financeira. Em contraditório, as Finanças e DGO responderam que visou “ assegurar a realização de despesas não previstas e inadiáveis, para as quais não será possível solução alternativa de financiamento, evitando que o Estado entre em incumprimento perante terceiros”. O Tribunal de Contas contrapõe, argumentando que “parte significativa das despesas reforçadas por esta via respeitaram a encargos que, pela sua natureza, deveriam ser conhecidos e devidamente orçamentados”. 

“Não conformidade”
O ‘veredicto’ do Tribunal de Contas à Conta Geral do Estado de 2023 foi de “não conformidade” com a Lei de Enquadramento Orçamental por “não integrar as demonstrações orçamentais e financeiras consolidadas da Administração Central e da Segurança Social”. A entidade diz mesmo que este incumprimento “compromete o objetivo da CGE proporcionar uma imagem verdadeira e apropriada da execução orçamental e financeira” e impossibilita a sua certificação. O parecer entregue no Parlamento “inclui reservas, por omissões e erros materialmente relevantes”, tendo sido emitidas 67 recomendações ao Governo e à Assembleia da República.

Sobre o excedente orçamental de 1,2% atingido no ano passado, de 7371 milhões de euros, o Tribunal diz que seria “metade do verificado”, não fossem duas operações excecionais - a transferência do Fundo de Pensões do Pessoal da Caixa Geral de Depósitos para a Caixa Geral de Aposentações (3018 milhões de euros), e a devolução ao Estado de parte do valor transferido em 2022 para apoio ao Sistema Nacional de Gás (700 milhões).
Em relação à dívida pública, o Tribunal de Contas dá nota que a

redução de 4,6% da dívida consolidada face a 2022, é também reflexo de uma “parte importante do financiamento - mais 18 227 milhões do que em 2022 - ter sido assegurada junto de entidades do próprio perímetro orçamental”. Com Ilídia Pinto 

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