“Parábola” é uma palavra ainda em uso. Segundo a Wikepedia, “Parabola” é, principalmente, uma obscura canção da ainda mais obscura banda americana “Tool”..O dicionário aponta mais duas direções: 1) uma curva matemática; 2) uma história plena de significados e ensinamentos escondidos..Já “parabolé”, por algum motivo, lembra-me o nome de alguma indumentária tradicional africana (“O chefe da tribo usava um parabolé cravejado de diamantes quando declarou a guerra”) ou um neologismo carioca (“O traficante encontrado morto tinha uns parabolés estranhos com a polícia”)..Há palavras encantadoras (“veludo”, por exemplo), cortantes (que tal: “patifaria”), fofas (“algodão”), feias (“joelho”), básicas (“pé”), misteriosas (“camafeu”)..Há palavras para todos os gostos. Há duas que nunca sei como utilizar corretamente. Afinal, eu sou um “emigrante” ou “imigrante”..Por favor, não zombem de mim. Esta minha dúvida existencial é tudo menos pueril. As palavras foram feitas também para nos definir. Mesmo que não queiramos. As palavras estão aí à mão de semear. São úteis, são fortes. Podem ser usadas como pedras, como foices, como granadas..Para os brasileiros sou um emigrante, alguém que se foi..Já para essas pessoas que apoiam o Brexit (vejam bem, uso a palavra “pessoas” e não a palavra “ingleses”; o nacionalismo, curiosamente, vive um momento transnacional; há por aí muito boa gente que quer ver os de fora pelas costas) sou um “imigra”..Serei sempre um “imigra”. O tipo com um sotaque estranho. A minha presença, condicional. As pessoas do Brexit têm uma visão bíblica da vida. Como se um Deus raivoso pudesse lançar uma praga até contra a minha descendência: “...e ímpios serão os que vierem da sua semente. Os seus netos e os netos dos seus netos vão nascer marcados pelo cabelo ruim e uma bizarra simpatia pela Fafá de Belém”..O tema é relevante para este cantinho menos por minha causa (sou daqueles “imigras” felizes; não tenho razões de queixa, sou mais do que bem tratado) e mais para comentar os vídeos que pululam pelas redes sociais a mostrar “imigras” a serem ofendidos em território inglês e os efeitos devastadores que estão ter para a imagem do Reino Unido..Tenho amigos britânicos que estão tristes e envergonhados com a atual situação. O Brexit é um embaraço em todos os níveis mas, enormemente, comunicacional..Um movimento que tem Farage e Boris Jonhson como cabeças de cartaz só pode ser mesmo popular para grupos muitos específicos. Um parece uma doninha no cio o outro com o Donald Trump depois de uma bebedeira de gin paraguaio em Las Vegas..Dos vídeos com ofensas xenófobas, o que mais choca é o do paquistanês a ser enxotado de um autocarro por jovem inglês. Impressiona pela aparente calma que o “imigra” demonstra mas também pela passividade dos que estão à volta..O silêncio contra uma injustiça flagrante fere tanto quanto ofensas gritadas..Ofensas, não se engane, ferem como balas. Apesar de, aí está, serem apenas palavras..Ou como diria o meu Tio Olavo: “Xenofobia é algo que faz-me lembrar um dito chinês. Quem tem pés não deve nunca semear espinhos. Nunca sabemos por onde a vida nos levará a caminhar”..Edson Athayde escreve todas as sextas-feiras no Dinheiro Vivo