Tenho neste espaço falado sobejas vezes sobre a importância da inovação enquanto fator de competitividade das empresas. Inovar não é apenas criar algo de novo – inovar significa gerar valor (que pode ser económico, mas também social, ambiental ou cultural) com base em novas soluções, sendo que estas podem ocorrer nos produtos, nos processos ou mesmo ao nível dos modelos de negócio.
Há inovações mais incrementais e outras mais disruptivas. Mas a forma mais radical é sonhar com coisas que não existem. Comecemos pela Swatch, uma marca associada a um produto que muita gente identifica como sendo relógio. Na realidade é uma pulseira que indica as horas. O que significa que o verdadeiro negócio não é o da relojoaria, tal como era entendida antes do surgimento do digital, mas o da moda. Aliás, como explica Nicolas Hayek, fundador da empresa, a palavra “swatch” resulta da contração da expressão second watch. A genialidade de tudo isto é que, para muitos consumidores, rapidamente se transformou no terceiro, no quarto, no quinto… enfim, no enésimo relógio. Ou melhor, na enésima pulseira!
Outro caso é o do iPhone, aquele que é considerado o primeiro smartphone com a funcionalidade touchscreen. A visão de Steve Jobs decorreu do facto de ter percebido que tinha chegado a hora de oferecer ao mercado algo que era muito mais do que um telemóvel. Sim, porque quando o iPhone foi lançado, não se tratou de melhorar os aparelhos existentes na altura – tratou-se, isso sim, de oferecer aos consumidores algo que não existia e com o qual eles nem sonhavam: um canivete suíço para o século XXI.
Da mesma forma que chamar papel higiénico a um rolo preto da Renova é também uma força de expressão. Quando se constata que o seu preço é cerca de cinco vezes superior ao de um papel branco de uma marca do distribuidor, o mínimo que se pode dizer é que 1/5 do valor corresponde efetivamente a papel higiénico e 4/5 a artigo de decoração.
Sonhar com coisas que não existem, mas com elevado potencial para gerar valor, é a pedra filosofal de qualquer gestor de marketing. Como afirmou Henry Ford na sequência do estrondoso sucesso do modelo T, “se perguntasse às pessoas aquilo que queriam, elas respondiam-me que era um cavalo mais rápido”. A genialidade de Ford residiu no facto de lhes ter proporcionado uma coisa que não podiam imaginar: um automóvel acessível à classe média.
Sei que os negócios “trituram” a grande maioria dos sonhadores. Aquilo que em geral se exige a um gestor é capacidade de análise, competência na definição da estratégia e rigor na sua aplicação. Mas não posso deixar de prestar o meu tributo àqueles que, sonhando com coisas que não existem, revolucionam o mundo. E, sendo assim, a melhor forma de terminar este artigo é com António Gedeão: “Eles não sabem, nem sonham / que o sonho comanda a vida / que sempre que um homem sonha / o mundo pula e avança / como bola colorida / entre as mãos de uma criança”.
Carlos Brito, professor da Faculdade de Economia - Universidade do Porto