A rede social dos aniversários

É mesmo a sério, há uma rede social que se baseia exclusivamente no dia de aniversário.
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Há qualquer coisa de fascinante na descoberta de que alguém partilha o mesmo dia de aniversário que nós. Uma espécie de proximidade cósmica, que imediatamente dá informações básicas sobre aquela pessoa – “se fores como eu, detestas isto e adoras aquilo…”

Partilhar o dia de aniversário com celebridades também é motivo de orgulho para muita gente, exceto com Jesus (é uma chatice fazer anos no Natal).

Ora Matt Hagger e Eli Shmerler apostam que esta cumplicidade ligada à posição dos planetas no dia em que nascemos é uma mina de ouro. E por isso fundaram a Doppels, a rede social dos aniversários, que quer tornar os #DoppelsDays uma celebração mundial, 365 dias por ano.

É mesmo a sério, há uma rede social que se baseia exclusivamente no dia de aniversário. Esbarrei com Hagger no corredor de uma conferência tecnológica, onde ele me explicou o princípio da aplicação, que está em lançamento suave – ainda sem grande investimento em marketing e à procura de angariar uma base de utilizadores razoável para se lançar em força.

“É o primeiro motor de descoberta de dias de aniversário”, disse-me Hagger, com um sotaque britânico cerrado e um estilo meio rock a destoar dos outros CEO engravatados. Partilhar o aniversário “é mágico”, declarou. E eu descarreguei a app para ver essa magia, apesar de o meu aniversário ainda estar a uns meses de distância.

Vou confessar que não fiquei muito convencida, talvez porque a aplicação ainda esteja a meio gás. Apareceram-me uns “doppels” esquisitos, incluindo um todo vestido de camuflado e com uma metralhadora na mão, e outro que parecia ter tirado uma selfie antes de ir roubar um banco. É capaz de ser da zona: a Doppels identifica as pessoas que fazem anos no mesmo dia que nós e que se encontram nas proximidades. Ora, se eu estiver aqui perto de bairros onde há atividade de gangues (bem-vindos a LA), sou capaz de descobrir que o Don Corleone cá do sítio faz anos no mesmo dia que eu. Giro, mas não me apetece receber mensagens dele.

A ideia de Hagger é interessante, no entanto. Todos os dias há pessoas a fazerem anos, portanto a atividade na app nunca para. A utilização é gratuita e a monetização estará tanto no envolvimento de marcas como na compra de “prendas” virtuais para outros doppels – uma designação que vem diretamente da expressão “doppelgãnger”, ou sósia. Mas, para funcionar, tem de chegar aos milhões de utilizadores. Tem de ser possível encontrar doppels interessantes em qualquer lado do mundo.

“Comecei a pensar nos aniversários como algo que nos dá informações sobre as relações e a compatibilidade com outros”, filosofou Hagger. É uma das coisas que perguntamos quando conhecemos alguém, mais cedo ou mais tarde. Alguém que faz anos no verão, como eu, sempre teve dificuldade em fazer festas com os coleguinhas da escola porque estava toda a gente a banhos no Algarve ou na Caparica. Alguém que faz anos em janeiro e detesta o frio, como uma das minhas melhores amigas, começou a planear escapadas de aniversário para destinos mais amenos.

A empresa foi criada há cerca de um ano e passou este tempo todo a desenvolver o algoritmo que identifica e faz a correspondência das pessoas com base no dia e na localização. Entra-se com o perfil de Facebook (o que começa a ser um standard chato para quem não tem ou não quer usar a conta) e pode-se enviar mensagens à comunidade de doppels.

Parte da estratégia de Hagger é lançar festas de aniversário “secretas”, apenas disponíveis para quem está na app, com o apoio de celebridades. Foi o que aconteceu em fevereiro em Hollywood, com o aniversário de Big Sean e uma parada de estrelas no evento. A app chegou primeiro ao iOS e só depois irá para Android. O fundador acredita piamente que esta será uma rede social espalhada pelo mundo, com a notoriedade do Twitter. Será que há mesmo mercado para encontrar pessoas “parecidas” connosco em todo o lado? Será que queremos dividir a atenção com tantos outros doppels? Até parece que já não basta ter de escrever mensagens de parabéns em atacado no Facebook, que todos os dias tem uma carrada de notificações de aniversários à espera, no mínimo, de um emoji.

Ana Rita Guerra escreve todas as terças-feiras no Dinheiro Vivo

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