Agentes imobiliários: uma profissão liberal sem rei nem roque

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Não é novidade que o setor imobiliário em Portugal tem crescido exponencialmente nos últimos anos. Aliás, é o tema do momento, analisado e escrutinado nos mais variados meios de comunicação. Mas há um problema estrutural no setor do qual pouco ou nada se fala: as condições de trabalho dos agentes imobiliários que ora são freelancers, ora trabalham a recibos verdes. Estas condições laborais potenciam a existência de profissionais a exercer sem formação, licença e, mais grave, em situações de trabalho pouco dignas.

É, por isso, urgente refletir sobre a regulamentação da profissão e a criação de um enquadramento legal para a moderação imobiliária. É necessário ponderar as vantagens de passar os agentes imobiliários a empregados a tempo inteiro, sendo que a mudança beneficiaria não só as empresas, mas também os compradores/vendedores.

Para começar, devemos recordar-nos que, em 2022, e segundo a Associação dos Mediadores do Imobiliário de Portugal, ninguém sabia ao certo quantos agentes imobiliários existiam no país.

Posto isto, considera-se uma prioridade a necessidade da comunicação legal dos agentes imobiliários que representam determinada agência. Só desta forma se poderá aumentar a transparência e a responsabilidade, garantindo que os profissionais estão devidamente autorizados a trabalhar em nome da empresa. Esta medida é especialmente importante para garantir a segurança dos clientes.

Este problema crónico do setor promove também a aplicação de elevadas taxas de comissão de venda para compensar salários parcos e irregulares. As consequências negativas desta prática afetam, não só os agentes, que acabam por não ter um rendimento fixo e estável, mas também quem procura comprar ou vender casa, já que o preço do imóvel é, regra geral, inflacionado para permitir o pagamento das comissões de venda.

A falta de estabilidade financeira é uma preocupação entre os agentes imobiliários que trabalham como freelancers ou a recibos verdes. O rendimento pode variar muito de mês para mês, dificultando a capacidade de manter uma vida financeiramente estável. Com a fixação como empregado a tempo inteiro, o profissional teria direito a um salário fixo, com um bónus variável, proporcionando maior estabilidade e segurança.

Além disso, permitiria o acesso à proteção social em caso de falta de rendimento, essencial especialmente em caso de lesões, doenças ou mesmo nos meses sem rendimento.

Em conclusão, a criação de um enquadramento legal poria um travão numa profissão liberal sem rei nem roque. Promover a contratação de agentes imobiliários a tempo inteiro, potenciaria, não só a estabilidade, a formação e proteção social dos profissionais, como ajuda também a acalmar a especulação do mercado imobiliário que se sustenta, em boa parte, de comissões imobiliárias elevadas. A mudança causa sempre estranheza, mas estagnar também não será solução. É preciso promover a reflexão sobre o setor e o mercado, acima de tudo por quem trabalha, que, analisando bem as coisas, acaba por ser quem mais perde.

Miguel Mascarenhas, cofundador da Imovendo

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