
A escassez de água e o aumento da frequência de fenómenos climáticos preocupa várias regiões do país, de forma transversal. Contudo, no Alentejo, o padrão de secas severas repete-se há várias décadas, antes mesmo dos temas relacionados com a sustentabilidade estarem no topo da atenção e das prioridades de agricultores e de produtores de vinho. Hoje, essa consciencialização precoce e as iniciativas pioneiras de alguns dos mais antigos ‘homens do vinho’ tornaram a região mais preparada para enfrentar as severidades. “Podemos dizer seguramente que o Alentejo é uma das regiões mais sustentáveis do mundo, a par com países como a Austrália e a Nova Zelândia, ou regiões como a Califórnia”, garante João Barroso, em entrevista ao Dinheiro Vivo.
O gestor de sustentabilidade da Comissão Vitivinícola Regional Alentejana (CVRA) não tem dúvidas ao fazer esta afirmação porque, diz, “o reconhecimento internacional não engana”, especialmente tendo em conta que a região representa apenas 0,3% da área de vinha mundial. “O PSVA é considerado como um dos melhores programas de sustentabilidade do mundo, e dos mais exigentes”, reforça o responsável da CVRA.
Desde a criação do Programa de Sustentabilidade dos Vinhos do Alentejo (PSVA), em 2015, o trabalho desenvolvido junto dos produtores da região e a certificação que nasceu desta iniciativa, em 2020, já deu frutos que indicam que a mudança está no bom caminho. Em dez anos, “o PSVA construiu uma reputação e mudou a forma de fazer vinho no Alentejo”, sublinha João Barroso que destaca, contudo, a exigência de percorrer o trilho da sustentabilidade. “É preciso muito trabalho, investimento, adaptação de processos, pessoas, plantas...”.
A verdade é que, fruto do esforço de todo o ecossistema vitivinícola da região, cerca de 30% da área plantada de vinha no Alentejo (aproximadamente sete mil hectares) já está certificada. São 23 produtores, uma espécie de clube restrito, à espera de novos membros. “O Alentejo tem muito mais produtores certificados na região do que o referencial nacional em todo o país”, afirma João Barroso.
Portas abertas em novos mercados
O trabalho de transformação da vinha seguindo, passo a passo, o manual do PSVA tem, como refere João Barroso, um impacto interno no negócio, tornando-o mais eficiente, resiliente e funcional do ponto de vista operacional. No entanto, esta preparação materializa-se igualmente em vantagens competitivas na vertente comercial, especialmente nos mercados de exportação. Só para dar um exemplo, o gestor da CVRA aponta a tendência de crescimento do valor médio de venda em licitações internacionais. “Um produtor certificado tem manifestações de interesse pelo seu produto por um preço frequentemente quatro vezes mais elevado”. Isto acontece, essencialmente, nos mercados escandinavos, do Reino Unido e do Canadá, que são muito exigentes no que diz respeito à certificação.
Desde que foi lançado o selo de certificação da CVRA, as exportações para países como a Suécia aumentaram exponencialmente. “Foram mais 250% em 2022”, sublinha João Barroso. Para outros que ainda não exportavam para o Reino Unidos, as portas também se abriram, especialmente depois de um conjunto de ações de marketing com o âmbito específico da certificação de produção sustentável.
Também o Brasil, um mercado muito relevante para a região do Alentejo, começa a crescer e a manifestar interesse na temática da sustentabilidade. “É uma questão de tempo até que faça uma discriminação positiva por este género de atributos”, acredita João Barroso. O mesmo acontece com os Estados Unidos, mercado com tradicional interesse nos vinhos portugueses.
No final de 2023, o PSVA foi reforçado e lançada a versão 2.0, ainda mais exigente. Uma evolução natural, como explica o gestor de sustentabilidade da CVRA. “Houve uma atualização de conceitos, de algumas metodologias de trabalho - como é o caso da agricultura regenerativa e da circularidade - porque é preciso acompanhar a evolução, dar resposta às necessidades atuais e futuras, e manter o nível de exigência que caracteriza o programa”.
Feitas as contas, João Barroso acredita que, aos poucos, os restantes associados da CVRA atingirão a meta da certificação. “Há vários a trilhar este caminho, uns mais avançados do que outros, mas a tendência será para que ninguém queira ficar para trás e perder o comboio da competitividade”.