Alexandre Meireles: “Não vamos ter uma sociedade evoluída se não conseguirmos fazer a transição geracional”

Presidente da Associação Nacional de Jovens Empresários defende apoios para ajudar startups a passarem o vale da morte e evitar o que aconteceu à Farfetch que, perante os problemas financeiros, teve de ser vendida à pressa para sobreviver. Texto: Bruno Contreiras Mateus e Ana Maria Ramos (TSF).
Alexandre Meireles, presidente da Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE)
Alexandre Meireles, presidente da Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE)Reinaldo Rodrigues /Global Imagens
Publicado a

Para o presidente da Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE), os eleitores mais novos podem ser decisivos nas legislativas caso se mobilizem para votar, mas é preciso conhecer as propostas dos partidos que contrariem a necessidade de emigrar. Há dois pontos essenciais: melhores salários e acesso a habitação. Alexandre Meireles critica ainda que, em 50 anos de democracia, pouco se fez para mudar a gestão das empresas e levar os jovens a lugares de tomada de decisão. 

Falamos cada vez mais em inovação, criatividade, empreendedorismo. Qual o diagnóstico que faz do mundo empresarial jovem em Portugal?

Eu acho que os jovens são o que temos vindo a apelidar de geração mais bem preparada de sempre. Nós, enquanto País, enquanto sociedade, investimos e muito bem na formação destes jovens. Temos tido agora alguns problemas em captá-los e em retê-los para que eles possam gerar, aportar mais valor ao País. Eu vou dizer aqui, já que estamos a investir neles, que possamos aproveitá-los para trazer valor. Acho que há ainda um grande caminho para fazer nesse campo. Os jovens sentem que, neste momento, quer em termos de salários, quer em termos de políticas de habitação, têm melhores condições lá fora e saem do País. Acho que é um tema fulcral na nossa sociedade e que temos que rapidamente olhar para ele.

Já que estamos em contagem decrescente para as eleições… Impõe-se perguntar: Os jovens são decisivos na contagem de votos? Isto porque o PS tem tido uma preocupação em resolver algumas das questões que preocupam os jovens, ainda que insuficiente, como a plasmada no Orçamento do Estado para 2024… O PSD anunciou ontem medidas dedicadas aos jovens, nomeadamente no IRS, na isenção do IMT e Imposto de Selo para jovens e até numa Garantia Pública que permita ter acesso a 100% à compra da primeira habitação…

Falando do futuro e do que é que pode ser o país e quais são as propostas neste momento dos principais partidos, acho que estão todos a falar dos jovens e estão todos a sentir que os jovens são importantes. Como disse e muito bem, o PSD, por exemplo, apresenta a proposta do IRC de quase uma taxa fixa até aos 35 anos, o PS já tinha em sede de Orçamento de Estado os 100% de isenção de IRS também para os mais jovens. Tudo isto são pontos importantes. Falou no início se os jovens vão ser ou não decisivos nas eleições. É óbvio que os jovens votam menos, tradicionalmente votam menos que os mais velhos e, portanto, se os jovens forem mais às urnas do que foram, podem ser decisivos porque podem ter um sentido de voto diferente, mas nunca saberemos. Agora, importante é o que efetivamente nós vamos ter para fazer a retenção destes jovens em Portugal. E em que é que nós vamos acreditar? Nós só conhecemos as ideias dos principais partidos. Agora, repare, nós não vamos ter uma sociedade evoluída e não vamos continuar a evoluir se não conseguirmos fazer algumas transições, como a transição geracional que temos aqui. E para isso precisamos que estes jovens, que fizemos o investimento, fiquem cá. Há uma coisa muito interessante, nós usamos o chavão da geração mais bem preparada de sempre, e algumas pessoas até acusam de ser o chavão, mas eu fico preocupado é quando nós não tivermos a geração mais bem preparada de sempre, ou seja, quando a geração a seguir à nossa for mais mal preparada do que nós, e assim é que é o nosso grande erro enquanto sociedade é que não evoluímos enquanto educação e não preparamos melhor a geração seguinte à nossa. E eu acho que é preciso cuidar destes jovens e garantir-lhes condições para eles ficarem cá. E sem rodeios, são duas coisas. Salário e habitação. São os principais. A componente fiscal é obviamente importante porque toca no rendimento disponível. Mas há aqui dois pontos que são fulcrais à nossa sociedade e é a grande razão porque os jovens saem de Portugal. É o salário de habitação, porque um está inteiramente ligado com o outro.

E nesse sentido, que caminho é que a ANJE também tem trilhado, digamos, para ajudar a fixar esses jovens em Portugal?

Fizemos uma coisa que foi bastante interessante, uma carta de auscultação aos jovens. Fomos a 56 municípios diferentes – para irmos a todo o país, para termos uma realidade. Foram mais de 400 jovens e depois mais de 250 empresas que fazem parte da nossa rede de incubação e que também participaram nesta carta. No fundo, era perguntar aos jovens quais são as grandes preocupações. Três ou quatro, obviamente, salários e habitação no topo das questões, burocracia e depois também o baixo nível de literacia financeira e digital. Esta carta depois foi entregue ao Governo, três ministros que a receberam. E desta carta também saiu já um programa, que eu acho que é interessante, que vai ser lançado dia 29, que é o projeto de aumento da literacia financeira e empreendedora nas escolas. Nós vamos numa primeira fase atingir 22 escolas, foi com a Secretaria de Estado da Juventude e com o IPDJ. É importante referir também que o Prémio Jovem Empreendedor vai na 25ª edição e há 25 anos que nós damos apoio, quer em termos de notoriedade, quer em termos financeiros, a projetos que nós consideramos que são inovadores e que podem transformar a sociedade. Alguns deles, seguramente, não tiveram o sucesso que desejávamos, mas muitos deles continuam a ser hoje ainda empresas de referência. A ANJE tem quase 40 anos, fazemos 38 anos este ano.

E têm apostado muito nas ações de formação. Acha que a formação e a requalificação de competências são a melhor forma de combater o desemprego jovem?

É uma das formas de combater o desemprego jovem. Apesar de eu aí sentir que até é transversal não só aos jovens, mas a todos os setores da nossa sociedade, principalmente também, falando concretamente da questão dos empresários, onde há um baixo nível de capacitação. Fizemos vários projetos como os nossos aceleradores digitais, onde tivemos quase centenas de empresas que participaram, onde tentávamos – é verdade que foi na pandemia, houve outra oportunidade, outra abertura – dar mais capacitação, mais skills, passando aqui a palavra, peço desculpa, aos empresários para que estivessem mais bem preparados. Agora a formação é a base de uma sociedade educacional, de capacitação, transversal a todos e nós apoiamos sempre os jovens empresários a fazer um business plan, todos esses pontos. Há ainda uma grande diferença geracional de empresários com um perfil face ao jovem. Acho que não se fez muito bem o caminho da transição de aproveitar todo este talento jovem e que é preciso dar aqui um empurrão para que estes jovens de 30 até 40 anos, que até alguns mais jovens, possam começar a estar nas tomadas de decisão das nossas PMEs e possam começar a decidir o futuro do país. Nós temos dois problemas da nossa economia: demasiado pequenos e demasiado expostos à dívida bancária. Acho que qualquer jovem hoje tem outra apetência para gerir culturalmente a questão dos sócios e da fusão e da partilha de capital. Acho que os jovens podem trazer essa novidade.

Já o disse, num artigo de opinião que o “Orçamento do Estado (OE 2024) teria sido uma oportunidade para estimular o investimento por via fiscal, mas a proposta de lei apresentada pelo Governo é muito conservadora nesta matéria”; o que espera do novo Governo para ajudar a estimular o investimento empresarial?

Acho que aqui já podemos começar, se calhar, a destacar entre os dois partidos, partindo do princípio que será o PS ou o PSD a liderar o próximo Governo, que historicamente sempre foram. E portanto se calhar falarmos do que é que são as duas propostas que eu acho que podem ser interessantes. De um lado, a proposta do PS da questão da seletividade da economia e os tipos de apoio que podemos fazer à economia. Esta ideia em si já não é nova, penso que no Governo do Professor Cavaco Silva já se tinha falado dos Clusters de Porter, como se chamam. Claro que a sua implementação é tão importante como a ideia, a forma e também a execução da mesma para que ela possa funcionar. O PSD tem aquilo que falamos da questão interessante da economia. O PSD tem ido mais à questão fiscal, a redução do IRC em, progressivamente até aos 15%, e também o aumento dos escalões do IRS. Penso que de uma forma geral, todos eles falam do aumento do salário mínimo, do crescimento económico, da manutenção dos nossos rácios de dívida, portanto acho que aí há algum conforto da nossa parte em perceber que temos algumas partes que são estratégicas para o país e que há aqui algum alinhamento. E depois há ali aquelas diferenças naturais entre os partidos e que até são interessantes para depois as pessoas poderem escolher entre um e outro, mas eu acho que ambos os partidos têm ideias interessantes para o nosso país e esperemos que acima de tudo que tenhamos umas eleições e um Governo estável e longo.

E quais são para si as prioridades de investimento público?

Obviamente há temas que são importantes para nós: os jovens são uma prioridade. Eu acho que se fez um bom caminho que nós podemos aprender com ele na questão das startups, portanto foram dadas as condições, foram criadas políticas públicas de qualidade, temos uma universidade pública que formou engenheiros, economistas e pessoas otimamente qualificadas. A questão também do investimento em programas como a Web Summit e outros projetos que trouxeram investidores para o nosso país e que promoveram este mercado de trabalho, este acesso a que as empresas pudessem vir para cá. E que também se pudesse desenvolver aqui o ecossistema das startups portuguesas. Depois eu continuo a achar que a juventude é um ponto essencial na parte do investimento público. Podemos falar também em termos de sociedade e perceber que há áreas da nossa sociedade que também precisavam ter mais investimento público, como a saúde e a educação, porque elas também são importantes para os empresários e mesmo para o investimento estrangeiro. Eu acho que há uma área que é fundamental que o programa de investimento público seja um ponto essencial para que o próximo governo possa investir. Nós falamos muito da questão da exportação, que é essencial, mas falamos pouco de internacionalizar as nossas empresas, que são duas coisas completamente diferentes e, portanto, a internacionalização das nossas empresas era uma área que eu gostava de ver clarinha ou clara com algumas medidas de apoio, que é muito difícil, dada a nossa dimensão, pegar numa empresa e internacionalizá-la com todos os riscos associados. E há outra parte que eu também acho interessante, nós na cadeia de valor, muitas vezes em Portugal, não trabalhamos, não aproveitamos bem o valor acrescentado que as marcas trazem. A indústria tem esse exemplo, trabalha muito a questão do private label, mas deixa muito este valor acrescentado que a marca traz. E era importante termos apoios, nomeadamente, a grande arma é a questão fiscal, em apoios que pudessem dar condições às empresas para desenvolver marcas. E para depois, no futuro, criar mais valor acrescentado, porque esse valor acrescentado é importantíssimo.

E estando nesse ponto, em relação ao investimento estrangeiro e à entrada de talento estrangeiro, o que é que nos falta para conseguir mais e melhor?

Apesar de vários problemas que nós temos na sociedade, acho que Portugal, apesar de tudo, é um país que tem um grande valor acrescentado, é um país atrativo para as pessoas virem. Somos um país seguro, com uma boa educação, que apesar de tudo ainda é uma muito boa educação, com uma saúde também atrativa e esses pontos são positivos. Depois, do outro lado, a questão fiscal preocupa sempre os investidores e muitas vezes não é a questão de ser mais ou menos dois pontos de IRC ou de IRS, é a questão de haver alguma estabilidade fiscal, porque nós empresários, quando programamos um investimento, será sempre, principalmente numa internacionalização, será sempre um investimento a médio prazo e é muito importante termos acesso a estas duas ou três condições de estabilidade para que possamos investir. De resto, eu acho que Portugal tem sido um país atrativo em termos de investimento. É óbvio que o turismo não é bem um investimento estrangeiro, direto, na economia empresarial.

Temos os exemplos dos nómadas digitais.

Os nómadas digitais são um ótimo exemplo. Os centros de competências. As pessoas vêm para Portugal viver e trazem qualidade, aportam mais valias ao nosso país. Agora, acho que talvez a estabilidade, para trazermos mais grandes grupos e mais empresas fortes para Portugal, essa estabilidade fiscal faz um bocadinho de falta.

E estão preocupados com a execução do PRR e com o impacto nos jovens empresários?

O PRR sempre foi um projeto muito importante idealizado e levado a cabo por este governo que agora acaba. Obviamente que nunca conseguiremos, se o governo acabou a meio, fazer o balanço de como é que o PRR foi executado. É factual também que está com alguns atrasos. Acho que nós também, tradicionalmente em Portugal, conseguimos ir recuperando desses atrasos. Fundamental é que não se desperdice, eu diria que nem um euro, nem um cêntimo do euro que se devolva à União Europeia e que se execute a totalidade do PRR. Porque ele tem áreas que são, evidentemente, fundamentais, mesmo sendo com algum investimento público tendo sido a escolha, a área da habitação é uma área fundamental, a área da transição, da descarbonização e da transição verde é outra área fundamental e é importante que o PRR seja executado.

Olhando agora para o número de unicórnios portugueses, ou com origem portuguesa, e o desejo crescente que todos têm é o de que surja sempre um novo unicórnio, que lições é que podemos tirar da Farfetch?

Os unicórnios eram sete, agora com o Farfetch passam a ser seis. Até tínhamos um dos rácios mais interessantes da Europa em termos de unicórnios. As lições da Farfetch são, na base mais geral, as lições do ciclo natural de algumas empresas. As empresas criam-se, umas sobrevivem, outras têm problemas financeiros e não sobrevivem. A Farfetch, para já, ainda não acabou, mas teve problemas financeiros. Acho que é importante que, nesta onda de startups e que nós trabalhamos bem, também se dê agora o próximo passo, que é começarmos a preparar essas startups para que vençam o chamado vale da morte das startups, cada vez mais startups vençam essa parte que é conhecida. Acho que é importante começarmos a trabalhar essa área para termos o menor número de perdas possíveis dessas startups e para que as empresas portuguesas, startups e não startups, possam cada vez mais durar mais anos. E estarem na economia portuguesa.

Voltando à ANJE, o que definiu para o plano de atuação deste ano acrescentado à atual direção?

Nós temos, de facto, três projetos que estão em marcha e que são importantes. Como eu já falei, que foi na sequência da carta de esclarecimento que fizemos ao Governo, que é o projeto que vamos lançar dia 29, para a capacitação na questão financeira e do empreendedorismo nas escolas portuguesas. Temos também um projeto que fizemos com o IEFP, que é a Academia do Empresário, no edifício da ANJE no Porto, que vai ser diferenciador. O objetivo, é claro, é capacitar o setor tradicional da economia portuguesa com o IEFP, com a Secretaria de Estado do Trabalho e pensando mesmo naquele setor que, muitas vezes, quando falamos de empreendedorismo, fica um bocadinho mais esquecido. No empreendedorismo ligamos sempre à parte de tecnologia, startups, mas há também muito empreendedorismo e muito apoio a fazer nesta área. Outra questão que estamos a tentar desenvolver, também na nossa sede, e fizemos a apresentação deste projeto durante na gala do nosso Prémio Jovem Empreendedor, é um Centro de Negócios na nossa sede da ANJE e que permita que empresas portuguesas e a empresas internacionais possam ter um espaço onde vão desenvolver o seu negócio, um espaço para estarem, um espaço para fazerem networking, um espaço para desenvolverem ideias, para partilharem.

Com este ano adicional de mandato, acredita que consegue prosseguir com a missão de desburocratizar, agilizar e otimizar a concretização e desenvolvimento de planos de negócio que aportem valor à economia nacional? O que está a ser feito nesse domínio?

A área da burocracia é a que nós chamamos de custos indiretos, não é? Esses custos que não precisamos, o ideal é que não existissem. Tem um impacto grande nas empresas, tudo demora tempo demais em Portugal. Portanto, este impacto é importante. O PRR tinha uma componente que era interessante nessa área, que eu acho que o Governo escolheu para modernização e agilização do setor público, justiça, máquina de Estado em geral, que também é importante que seja feito esse caminho da transição digital e da modernização do setor público, porque a burocracia muitas vezes está ligada à ineficiência de alguma parte do setor público. Está-se a fazer um caminho. O que procuramos sempre fazer na ANJE é chamar a atenção para essa burocracia e para o excesso da burocracia e os problemas que pode causar à economia e tentar passar a mensagem, porque não temos grandes possibilidades de resolver a burocracia, infelizmente.

Temos falado aqui de uma forma mais genérica, mas eu gostava de lhe perguntar como é que avalia o trabalho do Governo liderado por António Costa nas estratégias para fixar talento e garantir o bem-estar profissional e pessoal, digamos, dos jovens?

Fazer a avaliação do Governo é assim uma tarefa um bocado complexa para mim. O balanço, a história há de o fazer e também precisará de algum tempo. Posso tentar referir o que é que eu acho e o que é que nós achamos que foram pontos mais positivos e se calhar menos positivos ou mais negativos. É óbvio que é factual a questão do emprego, é uma parte importante que este Governo teve. O aumento do salário mínimo também foi factual – há ainda algum caminho a ser feito na questão do salário médio. A dívida pública, outro dos pontos claramente positivos. O que o Governo fez, no limite faz-nos pagar menos juros. Também destaco como positiva a relação institucional que a ANJE teve com o Governo. O que acho que ficou a faltar: uma estratégia nacional económica, um desígnio nacional, eu acho que estamos a falar um bocadinho mais dessa parte, ficou a faltar também a questão fiscal. Eu acho que se podia ter ido mais além, na questão do IRC havia margem, na nossa opinião, para mexer, por pouco que fosse daria um sinal – e nós temos defendido sempre a questão do IRC diferenciado, mas o IRC diferenciado não é na progressividade negativa, no fundo bonificar as empresas, nunca pagarem mais do que a taxa nominal, mas as empresas que pudessem contribuir para o aumento de salários, ter projetos inovadores na área da transição verde, mas acima de tudo que pudessem contribuir para o aumento de salários e para a economia portuguesa e para o rendimento dos trabalhadores, que pudessem ser bonificados em sede IRC, nesse sentido. Era uma das medidas que estava no Orçamento do Estado para 2023, mas depois não vimos grande impacto na medida.

E no domínio tecnológico e de inovação, o que é que falta para potenciar Portugal e para que estes jovens também possam sentir que há aqui um crescimento sustentado na economia?

Em termos de inovação e tecnologias, diria que Portugal está bem. Ou pelo menos não é uma área em que nós estaremos atrasados em relação a outros países. Acho que nesta área até foi feito o caminho em Portugal. O PRR também tinha a sua componente que eu acho que vai poder ser interessante para a inovação tecnológica. Eu acho que há um grande caminho a fazer também por parte das empresas. E aqui volto a dizer que também da parte do Governo pode-se ajudar um bocadinho aqui a transição geracional e que estes jovens também cheguem mais às empresas porque estão mais preparados. A tecnologia não é tão fácil.

Era isso que eu ia perguntar. Há setores muito tradicionais onde dificilmente este domínio tecnológico e de inovação consegue chegar facilmente.

Sim, eu acho que a parte do empreendedorismo não é só criar empresas. Nós podemos ser empreendedores trabalhando para uma outra empresa e estimular novos projetos e novas ideias. O que acho que é fundamental é para termos uma decisiva e uma boa ideia e uma definitiva evolução tecnológica é que a tomada da decisão final seja feita por pessoas que compreendem melhor a tecnologia e que compreendem melhor os benefícios que essa tecnologia possa ter para as próprias empresas. E aí os jovens são fundamentais porque já estão preparados de base com essas condições e já foram capacitados, foram melhor preparados na universidade e cresceram com a tecnologia e isso faz toda a diferença.

O Porto em 2023 recebeu mais de 500 jovens de uma centena para a chamada European Innovation Academy oriundos de 65 universidades de mais de uma centena de países, durante 3 semanas, na faculdade de economia, com o objetivo de tornar o país num hub criativo de startups.  Neste tipo de eventos nascem apenas ideias de negócio para qualquer parte do mundo, ou é um mero estimulo a fixar startups em Portugal?

Aproveito para agradecer também à Câmara Municipal do Porto, foi sempre o nosso parceiro estratégico e acho que tem feito um ótimo trabalho na atração de investimento, quer no apoio a eventos, como acabou de dizer, quer na atração de grandes empresas. Os jovens estão preparados e responsavelmente para tomar decisões e para tomar decisões difíceis e para evoluir na economia. Eu acho que, tradicionalmente, mais idade, mais experiência, ela é muito importante. A experiência é fundamental também para a nossa economia. Eu acho que o convívio entre as duas realidades não está equilibrado. Também, do outro lado, é mais difícil compreender a tecnologia e culturalmente a maior abertura ao mundo e a maior globalização, nomeadamente a fontes de diferentes financiamentos, fusões, aquisições. Acho que isso os jovens estão mais bem preparados e falta fazer este equilíbrio. Se calhar uns menos responsáveis, outros mais responsáveis, um com mais aptidão para um lado e outro para o outro. E neste equilíbrio é que teremos aqui o sucesso do País.

Disse ainda agora que a Câmara Municipal do Porto tem atraído muitos eventos; não querendo entrar aqui numa guerra norte-sul, mas no ano passado Lisboa foi eleita a Capital Europeia da Inovação. Mas há muitas cidades em Portugal que estão a investir na inovação. Acha que, no fundo, no mapa nacional ainda há um desequilíbrio?

Sim. Há um desequilíbrio. Repare, é natural que Lisboa seja a capital do país e é natural que tenha mais acesso, vive mais gente aqui, há mais sedes de empresas cá. Eu acho que aqui o contraponto muitas vezes nem é só fazer entre Lisboa e Porto. Quem conhece o território português sabe que a desigualdade ainda de acesso e de oportunidades é grande. Isso num país tão pequeno deixa-me um bocadinho preocupado e acho que se pode fazer mais por esta coesão territorial, também uma das coisas que se calhar se fez pouco nos últimos anos, ou que até tem-se feito cada vez menos, por esta coesão territorial que é muito importante. As guerras norte-sul são normais, sempre existiram, nós somos cidadãos portugueses, eu acho que Lisboa tem feito, o país tem feito um ótimo trabalho, Lisboa tem os grandes centros de decisão, o Porto tem tradicionalmente a indústria ligada lá e agora recentemente com um grande trabalho, com uma grande universidade, porque o Porto tem também, ainda tem um estilo de vida se calhar não tão caro como Lisboa e eu acho que aí tem ganho pontos e tem atraído cada vez mais jovens e mais empresas com uma grande universidade. Não é só o Porto, a região norte, Porto, Braga, Aveiro. Este eixo, e lá está, com universidades que pontuam no melhor que se faz na Europa inteira, portanto temos condições para atrair todas as pessoas. Falta-nos provavelmente falar de algumas coisas importantes, mas há uma que para os jovens

Outra questão também muito cara, que é em matéria climática. Existe essa preocupação entre os jovens empresários portugueses para as questões climáticas, ou também sentem que os Estados desvalorizam as alterações climáticas e ignoram as provas?

Espero que não. Espero que não o façam. Alguns farão, mas por acaso no caso português, eu acho que o Governo foi uma das áreas em que claramente deu o exemplo e disse este é um caminho e esteve bem nesse caminho. Os jovens portugueses são, na sua generalidade, extremamente preocupados com estes temas da descarbonização. Espero que ninguém acima de tudo desvalorize a ciência. Nós vivemos um bocadinho numa era de desinformação, daí vocês profissionais de jornalismo serem tão importantes para a nossa democracia, do que ver, peço desculpa aqui a passagem, mas ver informação através de fontes não confirmadas, que é o que muitos jovens veem, e depois leva a alguns exageros de desinformação e críticas. Mas quero acreditar que os Estados e os governos não desvalorizam a questão do ambiente. Podem não fazer tanto por ela como deviam estar a ser feito, depois de facto o resultado final fica um bocado aquém do espectável. Nesse aspeto também um português de referência que é o secretário-geral das Nações Unidas tem feito muito por isso e, portanto, também espero que se continue a olhar para isso com olhos mesmo sérios. Mas mais uma vez, os jovens quando tomarem a decisão, acho que vai ser diferente até nesse ponto.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt