Podem as algas ajudar a combater as alterações climáticas? A Timac Agro, ramo do grupo Roullier especializado na nutrição vegetal e animal, sediado em Saint-Malo, em França, acredita que sim. A multinacional acaba de lançar uma nova gama de bioestimulantes nos quais as algas têm um papel central. Ou não fosse a Bretanha a zona com maior variação de marés - 13 metros separam a maré alta da baixa - o que confere a estas algas autóctones uma grande resistência ao stress hídrico e às variações de vento, de salinidade e de temperatura, entre outros. E é essa resiliência que a Timac Agro pretende aportar à agricultura, "ajudando no melhoramento da performance genética das várias culturas, na sua tolerância ao stress e na sua capacidade de melhor captar os alimentos", explica Jessica da Costa, diretora de desenvolvimento de produtos e mercados da Timac Agro Internacional.
Criado em 1959, no cais de Saint-Malo, na Bretanha, o grupo Roullier tem as suas origens nas algas, já que o primeiro investimento do fundador, Daniel Roullier, foi a aquisição de um depósito de algas calcárias usadas, à época, para melhorar a fertilidade das terras agrícolas bretãs. Ao longo dos anos, e com muita investigação e desenvolvimento pelo meio, o grupo, que está presente em Portugal desde 1994, tem vindo a evoluir na sua oferta. Os primeiros bioestimulantes que colocou no mercado datam de 1990. Hoje assumem-se como "verdadeiros especialistas" na matéria.
"Há muitas empresas de fertilizantes a recorrer às algas, mas elas não são todas iguais. É preciso ter experiência para saber que a qualidade dos extratos que se produzem e a sua combinação com outros elementos vai ter a qualidade necessária para o agricultor e, sobretudo, que se conseguirá sempre produzir com a consistência necessária", diz o diretor de laboratórios da Timac Agro. Frank Jamois sublinha que a multinacional francesa, que está presente em 70 países e dispõe de 74 unidades industriais, é uma "empresa-chave no desenvolvimento de produtos a partir de extratos de algas", com experiência não só a nível laboratorial como industrial. A prová-lo está a nova linha de produção de bioestimulantes que a empresa inaugurou, em outubro, na sua fábrica em Pontrieux, e que representou um investimento de 3,7 milhões de euros.
Os desafios da agricultura
Mas o que são bioestimulantes? De forma muito simplificada, são produtos que promovem o crescimento das plantas, estimulando o metabolismo interno das mesmas. Ou seja, pode dizer-se que são uma espécie de vitaminas que vão maximizar o potencial da planta, melhorando o seu desempenho em geral.
Jessica da Costa compara a nova gama ADN, que atua em três pilares distintos, maximizando o potencial genético das plantas, limitando o impacto do stress no seu desenvolvimento e aumentando a absorção e transformação dos nutrientes, no trabalho desenvolvido por um desportista de alta competição, que precisa de trabalhar intensamente para melhorar a sua capacidade muscular, de ter uma mente forte para lutar contra o stress e a fadiga, e de nutrientes equilibrados e de qualidade numa quantidade otimizada" para obter os melhores resultados.
E nos campos, o objetivo é mesmo esse, respondendo aos crescentes desafios com que os agricultores se debatem, num mundo em que as alterações climáticas trazem dificuldades acrescidas, mas onde há cada vez mais bocas para alimentar e menos solos aráveis. "Em 2050, haverá 10 mil milhões de pessoas no mundo, o que só por si é um desafio imenso", lembra Sylvain Pluchon, diretor de investigação e desenvolvimento da área da nutrição vegetal da Timac Agro. "Precisamos de produzir mais, mas com melhor qualidade, de forma mais sustentável, protegendo os solos, otimizando o consumo de água e o aproveitamento dos nutrientes", defende.
Citaçãocitacao2 mil milhões de euros é a faturação glonal do grupo Roullier, que conta com 97 fábricas e 8500 trabalhadores em todo o mundo
A Timac Agro acredita que os bioestimulantes ADN, que chegarão ao mercado português a partir de janeiro de 2022, são a resposta a estes desafios. São o resultado de quase uma dezena de anos de investigação e desenvolvimento no Centro Mundial de Inovação Roullier, onde são estudados mais de 600 tipos de algas diferentes.
Criado em 2015, o CMI é resultado de um investimento de 30 milhões de euros, dos quais cinco milhões em equipamentos. Ocupa 20 mil metros quadrados de área total, dos quais 1200 m2 são de estufas onde são reproduzidos os climas e os solos de diferentes continentes.
Há ainda uma estufa de fenotipagem, que é única no mundo, garante Sylvain Pluchon. Com um sistema totalmente automatizado e robotizado, tem uma capacidade para três mil plantas e permite medir o seu crescimento e acompanhar o seu estado fisiológico, "facilitando o trabalho e acelerando a capacidade de encontrar soluções com bioestimulantes", explica o responsável. Este é um hub de investigação desenvolvido em parceria com o Institut Nacional de la Recherche Agronomique (INRA).
Aposta em Portugal
O CMI conta com 161 colaboradores de 20 nacionalidades distintas e tem 279 parcerias ativas de pesquisa no mundo. Submeteu, só no último ano, seis pedidos de patentes ligadas ao desenvolvimento sustentável, sendo que o grupo conta com mais de 50 patentes registadas no âmbito dos fertilizantes. Não tem ainda nenhuma parceria ativa com entidades do sistema científico nacional, mas Sylvain Pluchon garante que, em breve, isso poderá mudar, no âmbito de um projeto de investigação sobre as alterações climáticas.
"Trata-se de um projeto colaborativo, que envolve cerca de 10 países, e um deles é Portugal. Queremos estudar os efeitos das alterações climáticas em pormenor sobre as culturas e, em Portugal, o efeito maior que se sente é a seca, pelo que iremos estudar a eficiência do uso dos recursos hídricos", explica. À espera de aprovação de Bruxelas, Sylvain Pluchon refere que, em média, os projetos colaborativos têm uma duração de quatro anos e um orçamento que ronda os dois milhões de euros.
Citaçãocitacao25 milhões é o volume de negócios da Vitas Portugal, que emprega 160 trabalhadores. Eram 25 em 2010
E Portugal, onde o grupo Roullier conta com duas unidades industriais em Setúbal, além de uma adega em Almeirim (Falua) e outra em Monção (Quinta dos Hospitais), foi um dos países que colaboraram nos ensaios para o desenvolvimento desta nova família de bioestimulantes. A gama ADN foi testada, nos últimos dois anos, na vinha, no milho, no olival e no tomate para a indústria. "Conseguimos, em média, redução na aplicação de fertilizantes químicos na ordem dos 50%, mantendo ou até incrementando os níveis de produtividade e melhorando outros parâmetros qualitativos que também são importantes para o consumidores, como o teor de açúcar ou a firmeza da fruta", explica Marco Morais, diretor da Timac Agro em Portugal. Rui Rosa, diretor-geral da Vitas Portugal, mostra-se confiante no sucesso dos novos produtos: "Esperamos uma recetividade bastante grande porque são produtos que vêm responder às necessidades atuais do agricultor".
* A jornalista viajou a convite da Timac Agro