ANA perde 20 milhões de euros com aeroporto esgotado no próximo verão

A capacidade do aeroporto de Lisboa atingiu o limite e a falta de slots para o próximo verão obriga a ANA a recusar 730 mil lugares em época alta. O CEO da empresa, Thierry Ligonnière, apela a que as companhias utilizem aviões maiores. Concursos para as obras na Portela arrancam em 2023 e início dos trabalhos só no final do ano.
Publicado a

Falta meio ano para a próxima época alta do turismo arrancar e, apesar de todas as nuvens no horizonte sobre a economia em 2023, há já factos em cima da mesa. O aeroporto de Lisboa está esgotado e o crescimento da operação na Portela é um assunto praticamente arrumado. O ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, tinha já admitido que não existem mais slots (faixas horárias de descolagem e aterragem) para o próximo verão e não que será possível receber mais aviões na capital. O CEO da ANA Aeroportos confirma o cenário e explica que, durante os meses de pico da atividade, a gestora terá de recusar 730 mil lugares.

"Infelizmente, a demora na escolha da solução de ampliação da capacidade de Lisboa está a provocar a recusa de voos para o próximo ano. Calculamos que sejam 730 mil lugares que não serão realizados e alguns deles dizem respeito a lugares em rotas que servem hubs e que poderiam ter dado uma conectividade acrescida ao aeroporto de Lisboa. É urgente que este problema seja resolvido", admitiu Thierry Ligonnière ao Dinheiro Vivo, à margem do congresso da Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo (APAVT), a decorrer em Ponta Delgada, nos Açores.

O responsável da empresa que gere os aeroportos nacionais adianta que as perdas podem ascender aos 20 milhões de euros. "Para a economia do país [o impacto económico] representa muito. Para nós, são entre 15 e 20 milhões de euros", aponta.

O CEO da empresa detida pela francesa Vinci garante que a ANA está a "fazer tudo" o que está ao seu alcance para "melhorar a parte operacional e conseguir ser mais produtiva" e, para crescer, aconselha as companhias aéreas a optarem por aviões de maior dimensão, de forma a acomodar um maior número de passageiros. "Estamos a incentivar a utilização de aviões maiores e também o aumento do load factor. Estamos a fazer obras de melhoria no aeroporto, mas em termos de capacidade o salto só será dado quando tivermos a solução do novo aeroporto", admite.

O próximo verão está já a ser preparado com "os parceiros e entidades que operam no aeroporto", para definir soluções e antever os possíveis constrangimentos dos meses com mais movimento para o turismo do país.
Para já, a ANA está a preparar um plano de melhoria operacional de qualidade de serviço e de desempenho ambiental no aeroporto de Lisboa, num investimento 300 milhões de euros, conforme definido entre a gestora e o governo em 2019. Mas obras na Portela, reiteradamente solicitadas pelos vários players do turismo, só deverão arrancar no final do próximo ano, depois de serem lançados os concursos para concretização dos trabalhos.

"Fizemos um plano e esperamos que até ao fim de 2023 possamos arrancar com as obras. Mas para podermos chegar lá é preciso que todas as etapas anteriores possam decorrer com celeridade. Os processos nos aeroportos são sempre complicados: é necessário ter o acordo do regulador sobre o projeto, é preciso fazer uma consulta aos utilizadores, é preciso conseguir licenciamento ambiental", enumera.

Bancos e operadores devem ser ouvidos
Sobre a nova solução aeroportuária da capital, que deverá ser conhecida no final de 2023, conforme anunciado pelo governo, o CEO da ANA diz que é imperativo que se oiçam especialistas entendidos na matéria, e pede à Comissão Técnica Independente que chame à discussão os bancos e os operadores. "É preciso ir buscar pessoas e entidades que estiveram a realizar este tipo de projetos. Muitas vezes são bancos que financiaram projetos de concessão de aeroportos, que apostaram o seu dinheiro no desenvolvimento do tráfego, nos custos de construção, na obtenção de licenças ambientais e que viveram isso na pele", diz.

Thierry Ligonnière garante que a ANA é e será "um parceiro do Estado" e que está disponível para contribuir tecnicamente para o debate, colocando à disposição do país e da comissão "os recursos não apenas da ANA, mas da Vinci, que gere mais de 70 aeroportos no mundo e tem conhecimento prático e real desta matéria". "O problema deste debate é que muitas vezes as pessoas que são ouvidas não têm experiência. Têm opinião, ideias e convicções muito fortes, mas não têm a experiência de ter colocado o dinheiro em cima da mesa e ter feito uma aposta com modelos financeiros e projeções de tráfego. O risco é deles e é preciso ouvir bancos e operadores", apela.

Os aspetos ambientais e financeiros são, na ótica do CEO, as questões mais sensíveis a ter em consideração na hora de apontar caminhos e que devem ser avaliados com ponderação. "Alertei já sobre alguns riscos de escolhermos soluções que depois não possam ser financiadas ou para as quais não se possa conseguir uma declaração de impacto ambiental positivo. A consciência ambiental tem aumentado muito e digo isto pela experiência que temos noutras geografias. As associações ambientais e as pessoas têm uma palavra a dizer na escolha do aeroporto".

A comissão técnica, nomeada por António Costa sob proposta conjunta do presidente do Conselho Superior de Obras Públicas (CSOP), do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável (CNADS) e do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) será responsável, durante o próximo ano, pela elaboração da avaliação ambiental estratégica para o novo aeroporto de Lisboa. Para já, estão cinco soluções em cima da mesa: Humberto Delgado como principal e Montijo como complementar, Montijo como aeroporto principal e Portela como complementar, Alcochete como principal e Santarém como principal ou como complementar. Mas a comissão poderá ainda propor mais alternativas, caso assim o entenda.

*A jornalista viajou para os Açores a convite da APAVT

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt