É a mais recente contratação da agência de publicidade BAR e tem 73 anos. . Mais de meio século separa Manuel Peres, o novo craft master - responsável pela qualidade final da publicidade - da mais jovem funcionária da agência, Mafalda Albuquerque, de 21 anos. A favor de Manuel Peres contou exatamente os mais de 50 anos de experiência como fotógrafo, ilustrador, diretor de arte e fundador de agências de publicidade. É um homem com ideias. Cheio delas. Foi co-fundador, em 1989, do grupo Euro RSCG em Portugal, hoje Havas Worldwide, uma das maiores redes de publicidade mundiais e a maior em Portugal. Foi o próprio Jacques Séguéla, o homem que nos anos 70 criou o gigante publicitário francês, que o contratou. Manuel reformou-se com 66 anos. "Fiquei danado." . Vídeo: Conheça a BAR por dentro . Agora, enquanto craft master vai zelar pelo aperfeiçoamento do trabalho de direção de arte da agência, garantindo que as campanhas que saem "têm um trabalho de ourives", diz Miguel Ralha, sócio da agência. Segundo Manuel Peres, está na BAR para "matar a cobra e mostrar o pau. E aí de mim que não o faça". O pau de capataz, claro. Oficialmente só começa a trabalhar na agência a 3 de junho, mas antes dos papéis estarem assinados fez um estágio de quase um mês. "Ou passava no estágio ou contratavam outro", diz. O teste foi um êxito e já teve tempo para "botar opinião, do packshot [a frase final do anúncio] à luz" em duas campanhas. . Foi uma maratona das nove da manhã às tantas da madrugada. É um regresso em cheio aos ritmos impiedosos, mas não se intimida. Até gosta. O célebre "para quando? Para ontem!" fazem desde sempre parte do seu dia a dia. Manuel Peres começou a trabalhar em publicidade em 1965. Passou por 25 agências e diz ter conhecido pelo menos 80, não só em Portugal. Durante uma década, S. Paulo, no Brasil, foi a sua morada profissional. Na altura, diz ter sido uma emigração forçada pelas circunstâncias do país. Em 1975, em pleno PREC, vendeu "o barquinho a motor", pegou no dinheiro e rumou ao Brasil. Nos primeiros meses comeu muito pão, ovo cozido e café. Depois surgiu a primeira oportunidade na publicidade, numa agência acabada de nascer constituída por "três donos, uma assistente e um diretor de arte (ele)". Primeira campanha? Um outdoor para os temperos Arisco. . Fizeram muito dinheiro (os donos), tanto que um dia quando, como habitualmente, foi abrir o escritório deparou-se com uma agência vazia. Donos, nem vê-los. Apenas um bilhete. Saiu-lhe a sorte grande. Em 1978 entrou na MPM Casa Branca. "Na época era uma das maiores agências de publicidade. Só em São Paulo tinha 400 colaboradores." Foi considerado o melhor diretor de arte da agência; e em 1984 o seu trabalho como ilustrador foi reconhecido pelo Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand com um prémio, o ambicionado ouro. Ainda recebeu um convite de um agente para ir para Las Vegas fazer as capas dos discos dos Pink Floyd, mas a saudade da família em Portugal - tinha cá dois dos seus seis filhos - pesou e regressou em 1986. . Foi diretor de arte da Park (parte da rede FCB, outra agência) onde chegou ao conselho executivo. Foi partner e diretor criativo do grupo Euro RSCG Portugal, fundou a Euro RSCG Design, criou a assumiu a direção criativa da Conquest Red Cell Portugal (hoje parte da Young & Rubican Brands). Ou seja, nunca parou. A reforma - forçada depois de uma baixa por motivos de saúde - não o impediu de acompanhar o mercado criativo, de ser chamado por agências a ajudar em concursos, de colaborar com o Clube de Criativos de Portugal, de quem recebeu um Prémio Carreira. Uma "grande injustiça", diz Diogo Anahory, um dos sócios da BAR. "Afinal de contas, a sua carreira ainda agora começou." . A entrada de Manuel Peres na BAR, conta José Bomtempo, outro dos sócios, surgiu na sequência de um convite endereçado ao criativo para fazer uma palestra na agência. "Manuel Peres começou a trabalhar em publicidade em 1965. Testemunhou várias épocas, fenómenos de negócio. Pareceu-nos uma palestra excelente para os criativos mais novos." A conversa com os "40 companheiros aqui da BAR era para ser de 30 minutos e estendeu-se por mais de uma hora", recorda. Daí ao convite para trabalhar foi um segundo. "Estou entre os meus pares", sublinha Manuel. Quanto à atual forma de trabalhar das agências, nada de especial: "Mudou apenas a tecnologia". De resto "é exatamente igual ao que era nos anos 60 e 80". A tecnologia ajuda a que, por exemplo, não tenha de ir a Espanha buscar 60 garrafas de cerveja para chegar à ideia para o lançamento da Imperial. "Hoje já não há tanto trabalho de autor. O grupo de trabalho é mais necessário do que o indivíduo." . Num sector onde a novidade é o motor da ideia, encontrar publicitários com mais de 40 anos é cada vez mais raro. É uma profissão de desgaste rápido. Diz-se que queima depressa. Num dia, o criativo mais procurado vira nota de rodapé. Por isso, considera Miguel Ralha, a contratação de Manuel Peres é "um sinal importante: velhos são os trapos". "Podes até ser velho para jogar futebol, mas nunca para ser artista. És artista para sempre." José Bomtempo reforça: "Não deve haver preconceito, sobretudo na nossa profissão onde se descarta muito cedo o talento. Nós procuramos talento, esteja ele onde estiver." A duração do contrato? "Nunca se falou nisso", diz Manuel Peres. As ideias são eternas.