Quando lançou o Leaf em 2009, a Nissan deu um passo praticamente inédito na indústria automóvel ao comercializar um veículo elétrico em larga escala. O objetivo era fazer da eletrificação uma presença tão comum nas estradas como a dos motores de combustão. A receita deu frutos e, com mais de 600 mil Leaf e e-NV200 vendidos, a próxima meta será a passagem total para os motores 100% elétricos em 2030. Antes, em 2023, a garantia de que todos os novos modelos da marca serão eletrificados.
Arnaud Charpentier, vice-presidente para a estratégia de produto e marketing da Nissan na Europa, Médio Oriente, África, Índia e Oceânia, reconhece que a adoção dos elétricos superou até as expectativas da marca. "Durante os últimos 12 anos, acumulámos muita experiência com o Leaf e queríamos escrever o capítulo seguinte com algo em que confiássemos e que tivéssemos bastante desenvolvido para cumprir as expectativas dos clientes. Mas não podemos negar que o mercado acelerou de forma muito mais forte do que esperávamos", aponta este francês que fez uma parte da sua carreira na filial brasileira da Nissan (o que lhe vale algum domínio da língua portuguesa). "Temos agora confirmada toda uma estratégia com um novo crossover compacto elétrico para o segmento C e um pequeno elétrico para o segmento B em parceria com a Aliança [NDR: o sucessor do Micra]. Levámos tempo, é verdade, mas penso que estamos a chegar com tecnologia e estratégia fortes para a próxima década", assegura.
Para 2022 estão esperados diversos novos modelos, os quais recorrem a métodos distintos de eletrificação: a gama de modelos elétricos será reforçada com o Ariya e o e-Townstar, a que se juntarão os híbridos Qashqai E-Power, X-Trail E-Power e Juke Hybrid. Para Charpentier, uma forma de "preencher a lacuna para todos aqueles que ainda não estão prontos para dar o salto para a eletrificação", procurando democratizar a mobilidade sem emissões com diferentes conceitos, até ao momento em que a tecnologia de bateria avance para diluir preocupações como a autonomia ou tempos de carregamento.
"Quando tivermos a nova tecnologia de bateria - e falamos de baterias de estado sólido -, será provavelmente o ponto de viragem em que o elétrico será mais acessível, mas também terá maior autonomia e um tempo de carregamento menor". O primeiro automóvel com bateria de estado sólido da Nissan deverá ser lançado em 2028.
Diferentes velocidades
Certa é também a noção de que o ritmo de adoção dos elétricos será bastante diferente consoante a região. A Europa, até por imperativos políticos, é uma das que lidera a transição. "Os motores de combustão vão continuar até ao final do ciclo de vida dos modelos que estamos a mostrar agora, ou seja, cumprem o seu ciclo de vida normal. Em 2025, devido à norma Euro 7, iremos parar de lançar novos carros com motores térmicos e a partir desse ano todos os nossos carros novos a lançar na Europa serão elétricos, não meramente eletrificados. Depois de 2030, a totalidade das nossas vendas será elétrica, vamos produzir e vender apenas elétricos. Penso que, em 2030, o Ocidente já estará preparado, talvez nem todos os mercados à mesma velocidade, mas temos tempo para fazer algum ajuste. Aquilo que vejo é que há um real apetite dos governos para seguir esta linha. Se têm os meios para dar validade a essa ambição é outra questão. Do nosso lado estamos preparados, mas não seremos capazes de fazer isto sozinhos enquanto marcas. Precisamos do envolvimento dos governos e das administrações para nos seguirem", argumenta, dizendo mesmo que "isto é uma revolução! Todos os atores do mercado automóvel têm de seguir este caminho. Fazer isto sozinho não funciona".
Hidrogénio implica outra complexidade
Paralelamente, o hidrogénio é também apontado como uma solução realista para a mobilidade sustentável, mas a Nissan está focada, neste momento, no sucesso da eletrificação, algo que é explicado pelo elevado investimento já feito na sua implementação.
"O hidrogénio continua a ser uma solução e temos experiência [na tecnologia], mas para ser franco, estamos no patamar dos elétricos. Vamos começar pelo elétrico, porque em termos de investimento é enorme para os construtores, Vamos passo a passo. O hidrogénio não tem problemas do nosso lado, dos construtores. No entanto, vejo problemas do lado da produção e da infraestrutura, tal como nos elétricos - temos de produzir o hidrogénio, transportá-lo e armazená-lo. É ainda mais complexo. Vamos tentar resolver o lado do elétrico primeiro e depois logo vemos o hidrogénio, que será provavelmente a próxima fonte de energia para a nossa indústria. Mas levará tempo".
Outro aspeto que tem deixado a indústria em dificuldades é o da escassez de componentes, associando-se agora novamente às restrições na China e à guerra na Ucrânia. Sobre a falta de semicondutores, Charpentier argumenta que isso "não altera a estratégia geral" agora planeada, embora admita atrasos pontuais nalgum novo modelo. Já a guerra na Ucrânia é vista como uma "espécie de confirmação de que precisamos de ir para a eletrificação e reduzir a nossa dependência nos combustíveis fósseis. Claro que quando falamos disto temos diferentes situações de país para país. Penso que estamos a trazer a solução, mas cada governo, cada administração terá, provavelmente, de rever a sua dependência em termos de energia, mas isso é outra questão".
Motor24