As medidas do diploma contra a precariedade que uniu a esquerda

Projeto de lei do PCP que foi aprovado na generalidade, com os votos do PS, no Parlamento só deverá começar a ser discutido pelos deputados a partir de setembro.
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Na antecâmara das negociações do Orçamento do Estado de 2022, e quando o governo se prepara para propor alterações ao Código do Trabalho aos parceiros sociais, a viabilização pelo PS, no final do último mês, no Parlamento, das propostas do PCP para limitar a contratação a prazo vieram adensar o impasse sobre futuras alterações ao Código do Trabalho.

O projeto de lei comunista, que passou na generalidade, com apoio do PS, BE, PAN, Verdes e das deputadas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, entra para a calha das alterações às leis laborais onde estão já 10 projetos de lei sobre teletrabalho e direito a desligar dos deputados e aos quais se poderão somar propostas do governo para regulamentar plataformas digitais e outras, que estão em discussão ainda na concertação social. As discussões na especialidade não deverão iniciar-se antes de setembro.

As alterações propostas pelo PCP traduzem-se numa limitação forte das possibilidades de contratação a prazo e no endurecimento das sanções para empresas que recorram a falsos recibos verdes. Ao mesmo tempo, revogam o período experimental alargado de seis meses nos contratos com desempregados de longa duração e trabalhadores no primeiro emprego, introduzido nas alterações às leis laborais de 2019 e já parcialmente considerado inconstitucional.

No reconhecimento de falsas prestações de serviço, o texto que passou a primeira leitura pelos deputados deixa de "presumir" a existência de um contrato de trabalho com base numa série de indícios para declarar que esta de facto existe. Passa a contar no leque de falsos recibos verdes a dependência económica: atestada por seis meses de prestação de trabalho ou por 70% dos rendimentos do trabalhador terem origem num único empregador (podendo este ser, por exemplo, duas empresas diferentes de um mesmo grupo ou empresas participadas).
Além disso, o projeto também estabelece que há relação de trabalho quando "o prestador de trabalho realize a sua atividade sob a orientação do beneficiário da atividade".

Mas o PCP não é o único que pretende mexer na presunção de laboralidade. O governo fala em fazê-lo no quadro da regulamentação das plataformas. O Bloco de Esquerda apresentou já um anteprojeto de lei no mesmo sentido, que também entrará na calha das mudanças à lei.

Uma vez atestadas as falsas prestações de serviço, o texto do PCP fixa que o trabalhador tem direito a ver reconhecida a antiguidade, a ver pagas contribuições sociais, a receber por férias não gozadas, assim como subsídios a que até ali não teve direito. Para os empregadores, além das coimas, haverá bloqueio de benefícios e isenções fiscais - por dois anos - e de fundos comunitários - por três anos.

O texto também afasta das leis laborais os contratos de muito curta duração para qualquer setor e limita a um máximo de duas renovações, por dois anos, a contratação a termo. Já a duração máxima da contratação a termo incerto passa de quatro para três anos.

Prevê-se também que deixe de ser possível contratar a termo certo desempregados de muito longa duração ou nos primeiros dois anos de atividade de novas microempresas ou PME e ficam reduzidas a três as razões que justificam a contratação a termo incerto. O acréscimo de atividade excecional, por exemplo, ou a irregularidade de produções ditadas pelo abastecimento de matérias-primas e a execução de obras de construção saem do leque de motivos que permitem recorrer à contratação a prazo.

Noutras mudanças propostas, o PCP quer que deixe de ser possível fixar à cabeça a não renovação dos contratos a prazo e estipula que esta e outras regras da contratação temporária não podem ser afastadas por convenções coletivas. Alarga, por outro lado, as situações de passagem aos quadros quando as regras do recrutamento a prazo não são cumpridas.

O apoio inicial do PS a estas mudanças, para já, recebe fortes críticas das confederações patronais e também mereceu reparos de Francisco Assis, presidente do Conselho Económico e Social. O governo, que continua a prometer discutir as mexidas nas leis laborais na concertação social, considera, por outro lado, "a regulação do trabalho temporário absolutamente central" no pós-pandemia, segundo fez saber o primeiro-ministro na última cimeira da Organização Internacional do Trabalho.


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