Ascensão e queda dos "marqueteiros"

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A Operação Lava-Jato, que investigou o escândalo do Petrolão, teve 79 fases ao longo de sete anos, executou 1921 ações de busca e apreensão, produziu 349 prisões preventivas e 211 prisões temporárias, denunciou 195 pessoas por nove tipos de crimes diferentes, cujas sentenças somadas chegaram a 3093 anos, 11 meses e 23 dias de prisão, envolveu quatro mil milhões de reais em dinheiro público desviado e foi conduzida por dez juízes de três instâncias.

Como consequências políticas mais relevantes, gerou a prisão de Lula da Silva, candidato líder das sondagens nas eleições de 2018 pelo PT, de centro-esquerda, esvaziou as hipóteses do outro partido de poder, o PSDB, de centro-direita, cujo candidato, Geraldo Alckmin, não chegou a 5% no sufrágio, e ajudou a eleger um deputado medíocre, Jair Bolsonaro.

Os números judiciais resumidos no primeiro parágrafo e os efeitos políticos descritos no segundo são tão avassaladores que não é prudente reduzir-se a Lava-Jato a uma só faceta. No entanto, grosso modo, podemos dizer que o sistema de corrupção sistémica no Brasil, envolvendo construtoras e agentes políticos, serviu sobretudo para os segundos, à conta das primeiras, pagarem os elevados custos das suas campanhas eleitorais. Isto é: um político favorecia uma construtora num concurso público e, em contrapartida, esta doava-lhe, por baixo da mesa, dinheiro para pagar materiais de propaganda, gráficas, tecnologia e, sobretudo, a "marqueteiros políticos".

Nada contra os "marqueteiros políticos" mas o seu preço alucinado foi uma das causas da corrupção. Ser "marqueteiro" tornou-se a profissão rentável da moda no país ao longo dos anos 90 e início dos anos 2000, um pouco como os influencers de rede social de hoje.

Não se sabe o que vai acontecer com os influencers no futuro mas ser "marqueteiro" é coisa do passado: após os tais sete anos da Lava-Jato, passou de profissão cobiçada a ostracizada. O mais famoso deles, João Santana, devolveu cerca de 10 milhões de euros pagos por políticos (com dinheiro das construtoras, na sua maior parte) para não ser preso na Lava-Jato.

Nas eleições de 2022, conforme analistas de tendências, "o caríssimo 'marqueteiro profissional' será substituído pelo muito mais barato 'cidadão marqueteiro'", disse Viktor Chagas, professor de Comunicação da Universidade Federal Fluminense, à BBC Brasil.

"É o sujeito comum que simultaneamente vai à rua com camisa do candidato, participa de grupos de WhatsApp e contribui fazendo circular memes sobre um candidato. Trata-se de um militante organizado, coordenado mas também espontâneo", completa.

Em 2016, Krystal Lake, 22 anos, tornou-se viral nas redes sociais ao usar um boné com a inscrição 'os EUA nunca foram grandes", em contraponto ao slogan de Trump "faça os EUA grandes outra vez". Foi alvo de manifestações de ódio e de solidariedade nas redes, tornou-se notícia no jornal The New York Times, e abalou mais as estruturas da campanha dos Republicanos do que qualquer "marketeer" dos Democratas. E de graça, ao contrário do careiro Santana e seus pares.

Em São Paulo

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