Aos 100 anos, a Tavares quer conquistar o mundo através do digital

Mais do que uma empresa, esta é a história de uma família que, ao longo de quatro gerações, criou uma referência no mundo da joalharia a partir da Póvoa de Varzim. Chega agora a países tão diferentes como a África do Sul, os Estados Unidos ou o Canadá.
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A Ourivesaria Tavares assinala este ano o seu centésimo aniversário. Cem anos que são sinónimo de herança, mas também de inovação, pelo que a empresa arrancou 2022 com nova imagem, novo packaging, o site reformulado e uma nova loja online. O objetivo é apostar cada vez mais no digital, sem esquecer o atendimento físico e personalizado aos clientes. Com clientes fidelizados além-fronteiras, sobretudo nos mercados com maior presença de emigrantes portugueses, como o dos Estados Unidos, Canadá, África do Sul ou Suíça, a Tavares pretende usar as novas tecnologias para chegar cada vez mais longe no mundo.

Situada no centro da Póvoa de Varzim, a Tavares é uma ourivesaria de média-gama alta - especializada em joalharia e que só trabalha com ouro de 19,2 quilates, o chamado ouro português -, que continua a ocupar o espaço que começou por ser casa de habitação, oficina e loja de Virgílio Aristides Tavares, avô de Ana e Carlos. A escritura inicial mostra que a sociedade começou por ser criada pelo bisavô, que patrocinou o investimento dos seus dois filhos e do futuro genro, mas Virgílio Aristides Tavares acabou por desfazer a sociedade e seguir sozinho o seu percurso. Na geração seguinte, a ourivesaria esteve a cargo do pai e do tio de Ana e Carlos que, em 2010, compraram a quota do tio e ficaram com 100% do capital. A quinta geração já por lá anda a aprender os meandros do negócio e dar uma mão nas especificidades do digital e das novas formas de comunicação.

""Nascemos" os dois aqui, por aqui brincámos e fizemos os deveres", diz Carlos Tavares, lembrando que a ourivesaria e todo o seu espaço interior, invisível ao olho do cliente que por lá passa, é ainda hoje, a "casa" dos dois irmãos. Em plena pandemia, com o confinamento em vigor e as lojas encerradas, os dois irmãos encontravam-se religiosamente todos os dias na Tavares para aí ocuparem o tempo, arrumando, organizando, procurando perceber o que poderia ser refeito ou transformado. "Aproveitámos para arrumar a casa", diz Ana Tavares. O irmão reconhece que se tratou de uma fase "emocionalmente muito complicada", mas que foi no legado deixado pelos antepassados que encontraram "a coragem e a resiliência" para prosseguir: "Durante estes 100 anos, se calhar, houve momentos mais difíceis, e com menos facilidades do que as que temos hoje, e que foram ultrapassados".

A loja, que inclui hoje uma sala que volta e meia recebe exposições, mas também permite atender clientes num espaço mais reservado, e uma oficina onde quatro artesãos trabalham, reparando joias antigas ou dando corpo a peças exclusivas desenhadas pela designer da Tavares, foi totalmente remodelada. O processo, iniciado em 2016, foi feito em três fases, contemplou um investimento total da ordem do meio milhão de euros, e foi realizado quase só com capitais próprios. "É um dos problemas do setor, para manter a empresa tira-se à boca, porque é assim que ela se mantém musculada. Primeiro, paga-se aos empregados e aos fornecedores, e depois, se sobrar algum, é para nós. Foi esse o espírito que nos incutiram", refere Carlos Tavares.

E os resultados estão à vista. O ano de 2021 foi o melhor ano de sempre, com as vendas a crescer mais de 16% face a 2019, graças já às apostas no digital, mas também à retoma dos casamentos, um mercado que representa 20% da faturação da Tavares, e que, durante a pandemia, chegou a estar meses parado. "É um negócio muito importante para nós, não só pelo volume, mas pela fidelização. Há famílias a quem vendemos as alianças e que já cá vêm comprar a vela do batismo ou os brincos da menina. Isto é semear o futuro. Alguns deles, qualquer dia já aí tenho os filhos a casar. É sempre uma forma de renovação dos nossos clientes e de chegarmos mais longe", diz o responsável.

Quanto a expectativas para 2022, Carlos e Ana esperam que seja um ano de mudança, de recuperação do passado, mas sobretudo de preparação para o futuro. "O futuro é prepararmos o mercado digital e criar coleções para esse mercado. Se hoje temos uma grande carteira de clientes foi porque alguém, há 10, 20, 30 ou 40 anos a preparou para que agora possamos tirar os frutos dela. E cabe-nos preparar o mercado digital, é um mercado global, mas há alguns cuidados a ter neste setor. Estamos a aprender", refere Carlos Tavares.

O empresário reconhece que esta é uma área de "grandes apostas" e que obrigou a mudar tudo, porque o digital não é só a loja online, são todos os processos que passaram a ser feitos de forma digital, desde as notas de encomenda, às faturas, passando pelas brochuras. E não só. A exposição que a Tavares está a preparar para o final do ano poderá ser visitada na loja, mas também em versão digital, de modo a que os seus clientes em Toronto, Joanesburgo ou Paris possam também dela usufruir.

E é através do digital que a Tavares espera assumir-se como uma empresa nacional - tem já muitos clientes habituais na Figueira da Foz, Lisboa e Madeira - com grande presença internacional, junto das comunidades portuguesas pelo mundo. "Casam lá, mas não abdicam das alianças compradas em Portugal", diz Ana Tavares. A intenção é também juntarem-se a grandes marketplaces internacionais, que lhes darão visibilidade global.

Depois da pandemia, é a guerra da Ucrânia que gera preocupação, designadamente pelo efeito na cotação do ouro. "Se o ouro sobe, o nosso património vale mais, mas só se alguém o comprar. É na venda das nossas joias que nós ganhamos", diz Carlos Tavares, sublinhando que a experiência mostra que as cotações tendem a estabilizar, mas pode levar semanas ou meses. Por outro lado, há o efeito investimento, já que, em épocas de crise, as pessoas tendem a apostar em joias como aforro e segurança. "Sabem que, em qualquer momento de aflição, podem vender o seu ouro em qualquer parte do mundo", lembra.

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