O próximo dia 16 de julho marcará o início das férias judiciais. Durante cerca de um mês e meio, os Tribunais estarão encerrados. Significa isto que todas as diligências processuais, telemáticas ou presenciais, que até essa data não tenham sido realizadas, terão de aguardar, pelo menos até 1 de setembro, para esse efeito. Com exceções, claro: excluem-se deste cenário, por exemplo, os atos a praticar nos processos urgentes, bem como aqueles que visam evitar um dano irreparável (as expressões não são necessariamente coincidentes, embora suscitem dificuldades na hora de interpretar o pensamento do legislador, que, em princípio, soube exprimir-se em termos adequados).
A expressão processo urgente é lata e, como tal, abrange diversos processos. Trabalhando em contencioso administrativo, tendo a associá-la às ações de contencioso pré-contratual. É um instinto. Diferentemente, os advogados habituados às lides do contencioso civil e comercial tenderão a associá-la a providências cautelares ou a ações de insolvência, respetivamente. Já os que lidam com processos laborais, pensarão, sobretudo, em ações de impugnação da regularidade e licitude do despedimento. Estes são apenas alguns exemplos.
Contudo, independentemente da natureza do processo em causa, o dever de cumprimento dos prazos judiciais é cometido a todos os advogados. Por isso, na dúvida sobre o início ou termo de um prazo, manda a diligência que não se arrisque. Com efeito, a regra é clara: quando perentório, o seu decurso preclude o direito a praticar o ato. Existem, claro, algumas "técnicas" para evitar surpresas indesejadas: uma delas, porventura a mais comum, passa por subtrair dias ao prazo (tantos quanto necessários). E se houver dissenso na doutrina ou na jurisprudência sobre o seu termo, o caminho mais cauteloso deve ser concluído com a escolha da tese que considera o mais curto.
Mas... E quando a dúvida não se coloca (apenas) ao nível da contagem de um prazo, mas também quanto ao alcance de um conceito ou expressão contida na lei? Qual é, afinal, o sentido da expressão "atos a praticar nos processos urgentes"? Ela abrange todos os atos de um processo urgente ou somente os que visam evitar "um dano irreparável"? E quando ocorre o termo do prazo para a prática de um ato inserido num processo urgente? Esse termo transfere-se para o primeiro dia útil subsequente ao das férias judiciais ou, pelo contrário, vigora sempre a regra da continuidade?
No passado dia 11.06.2021, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) debruçou-se sobre as referidas questões no acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 1/2021. Afastando a aplicação do critério da autonomia (que, no âmbito dos processos urgentes, considera existirem atos que não se destinam a prevenir um dano irreparável, sendo que só neste último caso é que o termo do prazo se deverá transferir para o primeiro dia útil subsequente ao das férias judiciais), o STJ acolheu o critério da complementaridade: o qual postula que todos os atos a praticar nos processos urgentes são destinados a evitar um dano irreparável. Por conseguinte, tais atos devem ser praticados durante as férias judiciais.
Para fundamentar a sua decisão, o STJ aduziu, entre outros, que se o legislador tivesse tido intenção de suspender o prazo para a prática de atos inseridos em processos urgentes durante as férias judiciais, então não teria distinguido estes últimos dos "atos que se destinam a evitar um dano irreparável". Com efeito, bastaria atentar-se a cada ato individualmente, independentemente de o mesmo se encontrar inserido em processo urgente.
Assim, numa altura em que as férias judiciais se aproximam, este acórdão do STJ vem aconselhar uma atenção (ainda mais) redobrada nos processos urgentes: se dúvidas houvesse neste domínio, elas foram dissipadas.
Duarte Valido Viegas, Associado da Miranda & Associados