Barragens do Tâmega começam a injetar eletricidade na rede este mês

Numa altura em que a importação de energia bateu recordes em Portugal e a Europa fala em racionamento, as duas centrais do Tâmega vão entrar em pleno funcionamento. Mas face à seca severa, serão suficientes?
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As centrais hidroelétricas de Gouvães e Daivões da Iberdrola vão entrar em pleno funcionamento já neste mês. Com uma potência total instalada de 998 megawatts (MW), as duas unidades do complexo do Tâmega vão permitir reforçar o sistema elétrico nacional, numa altura em que a importação de energia bateu recordes.

Oito anos após o arranque das obras e dos testes e ensaios realizados nos últimos meses, "as centrais de Gouvães e Daivões entrarão em pleno funcionamento durante o mês de julho", confirmou fonte oficial da empresa espanhola ao Dinheiro Vivo, sem detalhar a data concreta, acrescentando que a outra central do Alto Tâmega (com 160 MW) "estará operacional na primeira metade de 2024, conforme previsto". No total, o Sistema Eletroprodutor do Tâmega, um dos maiores projetos da Europa, formado por três barragens e três centrais elétricas, vai aumentar em 6% a potência instalada em Portugal, produzindo anualmente 1766 Gigawatts-hora (GWh), o equivalente ao abastecimento de energia de cerca de 440 mil casas.

O projeto do Tâmega, no norte de Portugal, tem sido apontado como estratégico para a segurança de abastecimento nacional, nomeadamente para compensar o fecho das duas centrais a carvão e a intermitência das renováveis. E com a recente crise energética ganha novos contornos. Além da escalada dos preços energéticos, o corte de fornecimento do gás russo, que pode alastrar a mais países em breve, voltou a trazer para a agenda o tema do risco de racionamento da energia.

Apesar de não ser dependente do gás da Rússia, Portugal também tem sofrido com a situação devido ao aumento das matérias-primas, que se tem refletido na fatura dos consumidores. Um problema agravado pela atual seca severa que o país está a viver, e que justifica, em parte, a subida das importações e o aumento para níveis recorde da produção de eletricidade a partir de gás natural, tornando a conta final da luz mais cara. Pelo contrário, quanto maior for o peso das renováveis no mix energético, a tendência será de redução das tarifas.

O índice de produção hidroelétrica em Portugal, a fonte de energia "verde" com maior peso na produção de energia em Portugal, atingiu em junho o valor mais baixo de sempre para este mês, desde que há registos, ou seja, desde 1971, como revelou nesta semana a gestora de redes (REN).

Questionada pelo DV sobre os eventuais efeitos negativos da seca no arranque das duas centrais, a Iberdrola garantiu que não terá impacto. "Uma vez que as albufeiras de Daivões e Gouvães estão operacionais e com água, é possível a operação da gigabateria do Tâmega".

O projeto, que implicou um investimento de 1,5 mil milhões de euros, tem tecnologia de bombagem de água entre barragens e armazenamento de energia renovável suficiente para dois milhões de lares portugueses durante um dia inteiro, segundo os números da elétrica espanhola. Ou seja, com a operação da gigabateria, a energia excedente em períodos de baixo consumo pode ser utilizada para bombear água de uma albufeira inferior para uma superior e ajudar a colmatar as necessidades do mercado nos horários de maior procura.

O arranque a 100% destas duas centrais hidroelétricas, que representam 86% da potência instalada do complexo do Tâmega, acontece depois de a empresa ter realizado um regime experimental desde janeiro deste ano. A linha elétrica para escoar a energia destas centrais, instalada pela REN, foi concluída no final de 2021.

No que toca aos conflitos judiciais em torno da construção da barragem do Alto Tâmega, que levou à paragem das obras durante pelo menos meio ano, a Iberdrola garante "que não existem processos judiciais que tenham impacto no avanço das obras". Em 2019, as obras estiveram paradas por "questões de segurança", como alertou, à data, o consórcio liderado pela Mota-Engil que se recusou a continuar enquanto não estivessem asseguradas condições necessárias para os trabalhadores. O diferendo acabou em tribunal.

Mais parques a caminho
Com a Europa a temer o corte do fornecimento do gás russo e países como a Alemanha a admitirem o racionamento de energia, o panorama energético no Velho Continente tem mudado de cor. O regresso ao carvão está a ganhar cada vez mais adeptos, como a Alemanha, Áustria e Países Baixos, e o nuclear e o gás natural preparam-se para serem classificados como "verdes" na taxonomia europeia que lista os investimentos considerados sustentáveis e alinhados com os objetivos da transição energética.

Por cá, o governo tem afastado categoricamente regressar à produção de energia com carvão, preferindo dar continuidade ao reforço de energia renovável. Uma estratégia que, mesmo com a atual crise energética, o primeiro-ministro acredita que irá permitir assegurar o abastecimento energético. Como António Costa referiu recentemente, "até ao inverno, haverá um reforço da capacidade de produção energética". Além das barragens do Tâmega também vão entrar em funcionamento "novos parques solares que vão continuar a reforçar a forte componente de energias renováveis no mix energético do país", revelou. O DV contactou o Ministério do Ambiente para ter mais detalhes sobre estes projetos, mas até ao fecho da edição não obteve resposta.

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