BCE vai proteger alguns países da subida de juros, mas exige contas certas na mesma

Lagarde avisa que o futuro escudo para os países mais vulneráveis não pode servir para os governos endividados fazerem pausas no caminho das "políticas públicas sãs".
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Está a ser desenhado pelo Banco Central Europeu (BCE) um género de escudo protetor para os países mais vulneráveis nesta nova era de subida dos juros, mas Christine Lagarde, a presidente do BCE, avisou já que essa ajuda especial não pode servir para fazer uma pausa no caminho das contas certas e das "políticas públicas sãs".

Em Sintra, na abertura do Fórum BCE, que começou na segunda-feira e acaba quarta (em modo presencial novamente, depois de dois anos em modelo virtual por causa da pandemia), Lagarde foi clara nos avisos à navegação dos ministros das Finanças da zona euro, sobretudo aos que mais podem precisar do futuro escudo protetor de Frankfurt: os dos países mais expostos às chamadas "vulnerabilidades" da zona euro quando os juros sobem.

São os mais endividados (setor público e privado), as economias com setores bancários mais frágeis, com maiores cargas de malparado, por exemplo.

É o caso de Portugal e dos países do costume, como Espanha, Itália, Grécia.

Lagarde explicou à audiência em Sintra que "decidimos mandatar os comités relevantes do Eurossistema mais os serviços do BCE para conceber um novo instrumento".

Essa nova ferramenta, o tal escudo protetor, "terá de ser eficaz, proporcionada", mas também "conter salvaguardas suficientes que preservem o ímpeto dos Estados-Membros no sentido de uma política orçamental sã".

Proteger países porque nem todos são iguais

A ajuda do BCE, cujo desenho será dado a conhecer a 21 de julho próximo, virá pois com condições.

Mas é um escudo protetor necessário sob pena de a zona euro se fragmentar novamente, com países mais endividados a serem altamente fustigados pelos mercados, pelas agências de ratings e pelos ataques à dívida pública, tornando o seu custo inaceitável ou insustentável.

Lagarde recordou que "o BCE está a conduzir a política monetária numa união monetária incompleta, na qual as medidas têm de ser transmitidas através de 19 mercados financeiros e de obrigações soberanas diferentes".

"As remunerações dessas obrigações soberanas [taxas de juro da dívida] são a referência para a fixação do preços de todos os outros ativos do setor privado nos 19 Estados-Membros - e, em última análise, também para assegurar que o impulso da nossa política monetária chega às empresas e famílias."

Problema: "se os spreads em alguns países responderem de forma rápida e desordenada a uma mudança subjacente nas taxas de juro para além do que pode ser justificado pelos fundamentos económicos, a nossa capacidade em entregar uma política monetária única fica impedida", observou a presidente do BCE.

Assim, "nesta situação, uma mudança na postura política pode ser seguida por uma resposta assimétrica das condições de financiamento, independentemente do risco de crédito".

"A normalização da nossa política monetária conduzirá naturalmente ao aumento das taxas de juro da dívida soberana. Mas como os países da zona euro partem de diferentes posições orçamentais, isso também pode levar a um aumento dos spreads", acrescentou.

Portanto, Lagarde diz que é necessário o tal instrumento/escudo protetor para assegurar que a subida das taxas de juro da dívida pública "não seja exacerbado e distorcido pela dinâmica desestabilizadora do mercado, conduzindo a uma fragmentação daquilo que é o nosso impulso político original".

No entanto, a líder do BCE enfatiza que os governos e os ministros das Finanças têm de fazer a sua parte.

"Os decisores da política orçamental têm de desempenhar o seu papel na redução destes riscos, prestando apoio específico e temporário enquanto, a médio prazo, seguem um quadro baseado em regras que sustenta tanto a sustentabilidade da dívida como a estabilização macroeconómica", rematou Lagarde.

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