Em quase 27 anos de história, pela primeira vez o BCP vai contar com uma mulher no Conselho de Administração Executivo do banco. Chama-se Conceição Lucas, vem do Banco Privado Atlântico (BPA) e irá ser uma das administradoras da nova estrutura do banco que está a ser preparada, na sequência da entrada de Nuno Amado para presidente executivo. . Maria da Conceição Lucas, de 56 anos, integra atualmente o Conselho de Administração do BPA mas conta com uma vasta experiência na banca. Além da Société Génerale, Conceição Lucas esteve também no Banco Espírito Santo (BES). . No setor financeiro são poucas as mulheres que integram os conselhos executivos dos bancos e olhando para todo o PSI 20, com a saída de Ana Maria Fernandes da liderança da EDP Renováveis deixou mesmo de existir qualquer mulher CEO entre as cotadas na bolsa portuguesa. . As grandes empresas portuguesas ainda estão longe das do Norte da Europa no que respeita a mulheres em cargos de topo. Encontrar uma mulher na administração de uma grande empresa aqui é como procurar uma agulha num palheiro. Contam-se pelos dedos das mãos as gestoras com funções executivas nas empresas do PSI-20, o principal índice da Bolsa de Lisboa. Em 2011, eram apenas oito e o número vai diminuir com a saída de Ana Maria Fernandes da administração da EDP e da vice-presidência executiva (CEO) da EDP Renováveis. A gestora de 49 anos foi a única CEO de uma empresa do PSI-20 durante quatro anos. . Ana Maria Fernandes chegou à gestão de uma grande empresa (a Galp), em 2004, pela mão de António Mexia. Quando assumiu os cargos na EDP, em 2006, foi apontada na comunicação social como exemplo das mulheres no topo e ganhou várias distinções, como a sexta melhor CEO em 2010 do ranking do Diário Económico e da Heidrick and Struggles. Mas dias depois da chegada dos novos acionistas chineses, Ana Maria Fernandes está de malas feitas para o Brasil, onde vai liderar as operações da EDP. Deixa o cargo na Renováveis - mandato que só terminava em 2014 - a Manso Neto. Alguns defendem que a mudança é uma promoção. Outros nem tanto, já que a gestora sai da administração do maior grupo português. . A história da EDP ilustra uma realidade visível nas estatísticas. O último relatório da CMVM sobre o governo das sociedades mostra que, em 2009, existiam 25 mulheres nos órgãos sociais das empresas cotadas, o que correspondia a 5,6% do total. Nas 20 empresas do PSI, as mulheres em cargos executivos representavam 6,3% do total em 2011. . Os dados não são muito diferentes dos de Espanha, embora do lado de lá da fronteira existam quatro presidentes e três administradoras--delegadas. Já por cá, e segundo a CMVM, não havia qualquer mulher presidente nas 45 empresas cotadas. . A presença de gestoras em cargos de topo é rara no sector privado. Esmeralda Dourado, presidente da comissão executiva da SAG até 2010, Isabel Vaz, presidente do Grupo Espírito Santo Saúde, e Isabel Ferreira, presidente do Banco Best, são algumas exceções. E, por vezes, nas empresas onde as mulheres têm força, a ligação familiar é um fator de peso. Sonae (Cláudia Azevedo na Sonaecom), Semapa (Maude Queiroz Pereira), Edifer (Vera Pires Coelho). . O cenário é, contudo, diferente no Estado, onde os critérios políticos, ou do politicamente correcto, pesam mais nas nomeações. Segundo os dados da Direção-Geral do Tesouro para 45 empresas públicas, havia 33 administradoras executivas num universo de 183 gestores, o que corresponde a 18%. Os dados mostram um esforço para abrir os órgãos de gestão às mulheres: em mais de 50% das empresas existem gestoras executivas. No entanto, os números encolhem quando chegamos ao topo. Em 45 empresas públicas há sete mulheres presidentes, o que corresponde a 15,5% do total. . Se há sector onde as mulheres mais ordenam é o da Saúde. A vaga de criação de hospitais-empresa promoveu dezenas de mulheres a cargos de administração. Num universo de 31 hospitais, há gestoras em mais de 90% das unidades. As mais de 60 administradoras na Saúde representam 39% do total de gestores. Uma das razões para a elevada paridade é a inclusão nas administrações de enfermeiras-chefes dos hospitais e de diretoras clínicas. . Mas apesar do maior peso na gestão pública, as presidências no feminino ainda passam ao lado das maiores empresas públicas. A Caixa Geral de Depósitos, instituição onde quase 50% dos quadros superiores ou de direção são mulheres (47,8% em 2010), não tem nenhuma administradora. . Pedro Rebelo de Sousa, presidente do Instituto Português de Corporate Governance, e ele próprio administrador não executivo da CGD, avança uma explicação. Os principais cargos na gestão das empresas públicas são entregues por critérios políticos e recaem sobre personalidades com maior peso político e público - que ainda são homens. Há uma décalage de 20 anos para as mulheres chegarem a estes cargos. Até agora, apenas algumas conseguiram e a carreira política teve peso: Leonor Beleza (Fundação Champalimaud), Celeste Cardona (ex-administradora da Caixa e agora no conselho geral da EDP), Maria de Lurdes Rodrigues (Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento), são alguns exemplos. . Luísa Antas, administradora do Banco Finantia e que também passou por um governo no início da carreira, tem uma tese. As mulheres da sua geração, hoje na casa dos 50, viveram muito novas a revolução do 25 de Abril e isso mobilizou-as para a vida pública, para a política e daí para as empresas. "É uma geração que foi atirada para a frente". Mas, ainda assim, são uma excepção. . Para a maioria das mulheres que hoje está na casa dos 50 anos, idade em que se chega ao topo de carreira, as obrigações familiares ainda foram um travão à ascensão profissional. "As mulheres da minha geração estavam mais limitadas por causa dos filhos", reconhece Luísa Antas. No seu caso, o facto de não ter tido crianças nos primeiros anos do casamento pode ter ajudado na carreira, admite a gestora do Finantia. A opção de ir estudar para a Universidade de Harvard e a passagem pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento deram-lhe uma experiência internacional que lhe abriu as portas em Portugal. . Para Luísa Antas, a sobrecarga dos filhos e da família sobre as mulheres está diluída na nova geração. Nos casais entre os 30 e os 40 anos, há um maior equilíbrio entre os deveres do homem e da mulher, sobretudo para com os filhos, e essa entreajuda vai facilitar a ascensão profissional das mulheres. A gestora acredita que o movimento pode demorar duas gerações. Como muitas mulheres em lugares de chefia, Luísa Antas é contra a definição de quotas. Por outro lado, alerta, a legislação de proteção à maternidade pode ser um travão na carreira das mulheres se for aplicada à letra: ficar cinco ou seis meses em casa é complicado para quem quer progredir na empresa. . No entanto, Pedro Rebelo de Sousa, presidente do Instituto Português de Corporate Governance, acredita que a mudança de paradigma vai ser acelerada. "Penso que vai ser como a Via Verde." A viragem deu-se a partir dos anos 90, sobretudo devido à entrada das mulheres em cursos que alimentam as administrações: Economia, Gestão, Direito e Engenharia. Mas a globalização vai obrigar a escolher os melhores. E entre os dez melhores alunos na universidade, em regra, oito são mulheres, realça Rebelo de Sousa. . Há países nórdicos onde a definição de quotas para mulheres, ainda que a título de recomendação, já está em marcha. Portugal está mais atrasado na discussão até porque, lembra Pedro Rebelo de Sousa, a iniciativa privada tem pouco mais de 20 anos no nosso país. O tema é importante, mas, para este responsável, há discriminações mais graves nas empresas portuguesas, como a raça e a deficiência física.