Há um novo Licor Beirão no mercado a partir de hoje. O líder nacional das bebidas espirituosas reinventa-se em versão premium, enriquecido com aguardente vínica envelhecida. Beirão d’Honra é uma homenagem da segunda e terceira gerações da família Redondo ao patriarca, José Carranca Redondo, em edição limitada de 25 mil garrafas com caixa comemorativa do centenário do fundador da marca.
O novo licor, fruto de “centena e meia de testes” ao longo de 16 meses, foi desenvolvido por José e Ricardo Redondo, a segunda e terceira geração na gestão da empresa, a J. Carranca Redondo. Concebido com as mesmas especiarias e plantas aromáticas que compõem a receita original, só conhecida de José e Ricardo Redondo, mas enriquecido com a aguardente vínica velha, o novo produto surge este sábado no mercado a encerrar um ano de celebrações. Estará disponível nos locais habituais, com um preço de venda ao público de 20 euros. “Não queremos que este seja um produto de elite. Embora seja um versão premium do Beirão, queremos que seja um produto de massas e que chegue a toda a gente”, diz Ricardo Redondo, o atual diretor financeiro e de produção. E embora o lançamento surja em edição limitada, o objetivo é manter esta nova receita no mercado, embora ainda não esteja definido que tipo de packaging virá a ter. Conhecido é que terá um preço de venda ao público de 20 euros.
O Beirão é produzido na Quinta do Meiral, na Lousã, distrito de Coimbra, uma fábrica moderna, que dá emprego a cerca de 50 pessoas, e com uma capacidade produtiva de até 30 mil garrafas ao dia. Na qual são investidos, em média, um milhão de euros anuais, refere o diretor financeiro, sobretudo na na substituição e modernização de equipamentos produtivos. A fábrica insere-se numa propriedade com mais de 12 hectares onde são produzidas parte das plantas usadas no processo de fabrico. Os restantes ingredientes vêm da Índia, Sri Lanka, Brasil e Turquia, entre outros.
A quinta foi esta semana palco do encerramento das celebrações do centenário. Além da visita a fábrica, os convidados foram desafiados a identificar os aromas das 13 plantas e especiarias usadas no fabrico do Beirão. Sem sucesso. Esse é o segredo mais bem guardado da marca. José Redondo não só não o revela, como deixa claro que só ele e um dos filhos, Ricardo, o conhecem. Daniel, que ocupa a direção-geral da empresa, desconfia, apenas. Do processo produtivo não é mantido qualquer segredo: as 13 plantas são sujeitas a uma dupla maceração, em álcool etílico, a primeira das quais por um período mínimo de duas semanas, antes do processo de destilação que dará origem ao licor mais famoso de Portugal.
A receita original remonta, na verdade, ao século XIX. Sabe-se que um caixeiro-viajante de vinhos do Porto, de passagem pela Lousã, se enamorou da filha de um farmacêutico que vendia ‘licores naturais’, além dos medicamentos habituais. E por lá ficou. A entrada em vigor de uma lei que proibia a atribuição de propriedades medicinais às bebidas alcoólicas levou o jovem a criar uma pequena fábrica para a produção dos licores. A marca nasce em 1929, ano em que decorreu, em Castelo Branco, um Congresso Beirão e o licor foi, assim, batizado em homenagem ao encontro.
Em 1940, José Carranca Redondo compra a empresa, onde trabalhara aos 12 anos, e dedica-se à produção do Licor Beirão com a mulher. "Homem determinado, de uma enorme persistência, criatividade e poder de observação, a par de uma intuição extraordinária", segundo as palavras do seu filho, José Carranca Redondo "teve a coragem de andar pela região, de balde e escadote, a afixar cartazes", longo no primeiro ano, apesar de ter vendido, apenas, três mil e poucas garrafas. "Podemos ter o melhor produto do mundo, mas se não o soubermos publicitar, não o vendemos", frisa.
José Carranca Redondo é apontado como um pioneiro no marketing e nas relações públicas em Portugal, tendo criado alguns dos mais notáveis e irreverentes cartazes publicitários da marca. O mais audaz, ou pelo menos, o que gerou maior controvérsia à data – “teve que ser retirado de muitas paredes e lembro-me bem de chegarem, pelo menos, duas carrinhas à Lousã com chumbos de caçadeira”, recorda José Redondo – foi o cartaz da pin-up americana, vestida de majorette, e com o slogan ‘É de bom gosto servi-lo, é de bom gosto bebê-lo’. Mas há, também, a publicidade famosa que 'desafiou' o regime, sob o lema ‘O Beirão de que todos gostam’. Uma referência a Salazar. Reza a história que a campanha terá arrancado uma gargalhada ao chefe de governo.
Esta é uma história de sucesso empresarial assente, desde sempre, nos valores nacionais. Foi já José Redondo que, em 1960 cria o icónico slogan 'Licor Beirão, o licor de Portugal. Diziam-lhe que ia dar cabo da marca, que Portugal não vendia.... "Demoramos 40 anos a perceber a força da marca Portugal lá fora. Temos de defender o que é nosso", diz o empresário. Um património que a família sempre preservou, mesmo com a chegada da terceira geração à empresa. Daniel e Ricardo perceberam que era fundamental chegar a um público mais jovem e, acabados de sair da faculdade, começaram a marcar presença nas semanas académicas e nos festivais de música. Assim surgem os cocktails como o Caipirão ou o Morangão, ícones da marca. Daniel explica: "A associação à música surgiu como algo natural, quando procurávamos como atingir um público mais jovem. E por isso apostamos, tanto, no merchandising da marca. Queremos criar recordações, estar nos momentos agradáveis das pessoas".
Já para não falar da publicidade mais recente e da associação do Beirão à atualidade desportiva e política. Quem não se lembra dos cartazes a desejar Boas Festas a Sarkozy e a Merkel ou Futre em 'campanha eleitoral', apresentando 'Soluções à portuguesa' como a promessa de um diploma de engenheiro para cada português. Uma referência à polémica em torno da licenciatura de José Sócrates.
Não admita, por isso, que o orçamento publicitário do Beirão seja, "de longe, o maior custo" que a empresa tem. Mas que Ricardo Redondo não desvenda. Mas garante que é uma aposta “de muito longo prazo”, que dará resultados “na próxima geração”. Já o pai lembra que a empresa nunca desistiu de apostar na publicidade, mesmo quando o mercado se revela menos atraente. "Há muitas empresas que, quando as coisas correm mal, cortam na publicidade, mas isso é um erro enorme", sublinha José Redondo.
E porquê a irreverência? Porque "está no ADN da marca", diz Ricardo Redondo, mas, também, porque é a forma de se distinguir. “Somos pequenos anunciantes, para termos impacto temos que arriscar senão não somos ouvidos”. Ricardo reconhece que a chegada da terceira geração à empresa foi "determinante" para o reposicionamento da marca Beirão. E o pai? "Manteve o seu papel de senador, alguém que nos orienta, que nos forma, que transmite os valores da marca e que não nos deixa fazer asneiras. Mantém o poder de veto, embora raramente o use [risos]", sublinha o diretor financeiro.
Hoje, o Beirão fatura 14 milhões de euros e vende 3,5 milhões de garrafas ao ano. As exportações “estão em crescimento muito acelerado”, diz Ricardo Redondo e valem já 20% das vendas. Dos mais de 40 países onde o Licor Beirão é bebido, destaque para os Estados Unidos, a Suíça, a França e a Alemanha. Todos os anos mais de 40 milhões de doses de Licor Beirão são vendidas em todo o mundo. Para o final de 2018, a empresa tem preparado um novo investimento, na ordem dos dois milhões de euros, para substituir equipamentos e aumentar a capacidade produtiva.
Sendo a marca líder nas bebidas espirituosas, não admira que o Beirão venha sendo, ao longo dos anos, alvo de cópias e de contrafação. Embora seja este último fenómeno o que mais preocupa a empresa. "Das cópias conseguimos defender-nos. Houve dois processos em tribunal [contra o Licor Serrão e o Licor Beirinha], mas que avançamos de imediato com providências cautelares e que vencemos. O que nos preocupa é a contrafação e, por isso, tivemos de investir muito, designadamente alterando o modelo da garrafa e introduzindo uma rolha inviolável", explica Ricardo Redondo, que acrescenta: "A verdade é que, sendo líderes de mercado, nunca nos vamos libertar disso. São as dores do crescimento".