O que vai abordar na Vodafone Business Conference? Vou olhar para toda a noção de hiperconectividade e onde iremos usar esta tecnologia no futuro. Sou futurista e toda a minha vida estive envolvido na tecnologia. Nos últimos 40 anos trabalhei para empresas de telecomunicações, por isso vi todos os ‘G’, do 1G ao 5G. Quero inspirar as pessoas sobre o poder transformador da hiperconectividade. Vou olhar para a IoT, IA, 5G, 6G, até satélites. Nas últimas semanas a Amazon mudou o nome da sua empresa de satélites de Kuiper para Leo e está agora a competir com a Starlink. A noção de conectividade em qualquer lugar, a qualquer velocidade e a todo o momento é algo que penso que vai impulsionar os negócios, não apenas os consumidores. Vou falar desta oportunidade gerada por estarmos conectados, não apenas humanos mas a Internet das Coisas. Veremos milhares de milhões de coisas que terão de estar conectadas num futuro próximo. Considera que já estamos num mundo hiperconectado ou caminhamos para lá nos próximos cinco anos? É para os próximos cinco anos. Se formos a andar na rua e não conseguirmos sinal Wi-Fi e nos queixarmos, isso não é hiperconectividade. A hiperconectividade é quando o utilizador final não tem de se preocupar com o método que está a usar para se conectar ao mundo lá fora. E o utilizador pode ser um ser humano, um veículo autónomo que procura um lugar para estacionar ou sapatilhas que se cruzam com outras e querem falar com elas e perguntar onde foram compradas. Ainda não chegámos aí. A tecnologia está a ficar cada vez melhor, os satélites estão a satisfazer a última fronteira em que poderemos estar em qualquer lugar e estar conectados. Mas estou num hotel em Varsóvia e o Wi-Fi é um pouco instável, e isto não é hiperconectividade. É hiperfrustração. Acredita que o mundo hiperconectado será geograficamente homogéneo ou pode aprofundar diferenças?Penso que isto diminui a desigualdade. Com a Starlink e Amazon Leo vamos ter comunidades carenciadas a poder instalar uma antena parabólica muito pequena e ter um acesso à Internet que não tinham antes. Estamos a caminhar para podermos andar na rua com o telemóvel e se este não estiver ligado a uma rede Wi-Fi e não tiver sinal 5G, poder ligar-se por satélite. Apesar do custo, porque não é barato fornecer serviços de satélite, creio que vamos ver que comunidades vão ter acesso à internet em qualquer parte do mundo. O que devem as empresas fazer para garantir que têm sucesso nesta nova era? Precisam de olhar para a forma como estão a fornecer conectividade, seja aos trabalhadores remotos ou se têm uma fábrica como é que garantem que os dispositivos falam uns com outros. Essa conectividade ubíqua é o que precisam de fazer, quase uma auditoria de como estão neste momento. Como é que conectamos as coisas, pessoas ou servidores? O ‘boom’ da IA vai exigir conectividade porque quereremos ter acesso a uma ferramenta ou agente IA em qualquer parte do mundo. A procura por estes serviços vai exigir esta conectividade. Por isso as empresas devem fazer uma auditoria para perceber como se conectam hoje e se estão a preparar-se para o futuro. É disso que vai falar na conferência?Em parte falo disso no livro que escrevi, ‘Digitally Curious’, e vou falar nisso em Lisboa. A não ser que sejamos curiosos não vamos ter consciência destes novos serviços. Vou falar de coisas como ‘edge computing’, o facto de que se temos um veículo autónomo queremos que um computador tome a decisão o mais perto possível de onde o poder de processamento é necessário: no carro, na estação de base, na minha mochila? Será preciso auditar como estão e como as necessidades de conectividade terão de mudar no futuro. Isso significa que muitos líderes precisam de analisar a situação e talvez mudar as suas estratégias.Empresas não tecnológicas podem achar que isto não é com elas. Como se muda essa ideia?Nunca entrei numa sala em qualquer país do mundo em que toda a gente não tivesse um telemóvel. Quando as comunicações móveis estavam na sua infância era preciso literalmente mover-se ou ir lá para fora para conseguir sinal. Agora damos como garantido. O que os líderes devem fazer agora é perguntar o que mais podem conectar, se a sua força de trabalho está conectada. Fui a Istanbul recentemente e a empresa com que eu estava a trabalhar tinha uma política que não permitia roaming na Turquia, então um funcionário perdeu-se no aeroporto e chegou atrasado porque não conseguia usar o telefone. É um trabalhador remoto noutro país que não consegue comunicar porque, apesar de ter a tecnologia, a política não permite hiperconectividade. Que sectores vão beneficiar mais nos próximos anos? Todos os que precisarem de conectividade, de curto ou longo alcance. Há uns anos trabalhei com um especialista numa rede privada de 5G. Era tecnologia 5G mas usada dentro de uma fábrica – porque é que não usaria simplesmente Wi-Fi? Bom, o Wi-Fi não é sempre fiável. É espetro não regulado e por isso estamos sempre a competir pelo serviço com toda a gente. Se tem robôs dentro da fábrica e depende de Wi-Fi normal, isso pode ser arriscado. Na indústria transformadora, onde se tem estes robôs em armazéns, pode ser necessário ter hiperconectividade dedicada, que pode ser 5G, rede 5G privada ou serviços 6G privados que ofereçam um nível de fiabilidade e segurança.Há queixas de que o 5G não cumpriu a promessa. O que vai o 6G trazer de diferente? Lembro-me de que há uns anos nos Estados Unidos 4G não significava 4G para toda a gente. Numa rede, 4G era 3G+ e noutra era LTE. A promessa do 5G ainda não se materializou porque não é só velocidade, é escala. O 5G Standalone tem sido implementado de forma progressiva. Não é barato, mas em vez de ter 5G a ir às costas da infraestrutura 4G existente, temos o que se chama de New Radio, NR. É infraestrutura dedicada, o que significa que se consegue fazer muito mais coisas, podemos ‘fatiar’ a rede. A outra coisa que o 5G faz bem é que escala. Se temos milhões de dispositivos – e um dispositivo pode ser um par de calças que tem uma etiqueta com um transmissor cosida dentro da ganga – como é que vai comunicar com a “nave-mãe”? Provavelmente vai usar 5G. Mas para permitir isso, será preciso ter uma rede escalável em massa e o 5G standalone oferece isso. Não trará apenas maior velocidade para os consumidores, vai permitir que mais coisas possam ser conectadas. Não precisamos de ir já para o 6G. Portugal é um país de PME, muitas das quais não têm recursos para implementar muitas tecnologias. Como podem aproveitar a era hiperconectada?O que precisam é de encontrar quem forneça essa conectividade always-on, com que não tenham de se preocupar.Quero ver esta hiperconectividade estar sempre ligada mas invisível. É o que as PME querem, que as coisas funcionem. Se estão no terreno a fazer reparações e o dispositivo não se conecta, são horas e possivelmente receitas perdidas. Vê pontos negativos na hiperconectividade, como ‘burnout’? Quando os telemóveis apareceram disseram-nos que íamos ter muito mais tempo livre, porque nos iam ajudar nisso. E eu acho que na verdade nos tiraram tempo, porque estamos sempre conectados. Há impactos psicológicos e sim, há ‘burnout’. E já sabemos os impactos das redes sociais na saúde mental. Mas isto tem de ser pesado com os benefícios. Se não estivéssemos conectados, muitas das inovações que vimos não existiriam. Entramos num mercado, queremos comprar algo e temos aquele terminal quadrado que tem de se conectar a uma ‘nave-mãe’ nalgum lado para completar a transação. Um pequeno negócio dá como garantido que vai funcionar, nem sabe como ou se há ali um cartão SIM. Uma das coisas que vou falar em Lisboa é que vamos ver a ascensão da tecnologia eSIM, que vai passar a estar embebido no dispositivo. Nunca vamos ter de voltar a introduzir um cartão SIM físico. Os novos dispositivos já virão com eles integrados, vão simplesmente funcionar. O meu conceito de hiperconectividade é que não teremos de nos preocupar sobre como se conecta. Simplesmente funciona. Alguma tecnologia será mais importante que as outras no futuro? A grande oportunidade está na IA com IoT. Porque quando temos as coisas conectadas, até as calças de ganga e os sapatos, teremos tantos dados que a única forma de os interpretar será usar IA. A IA é muito boa em velocidade e escala. Quando se casa a massa de dados relevantes que estão a sair de uma plataforma IoT, vamos precisar de IA para os perceber. A outra coisa é cloud computing na edge. Ter a capacidade de processamento disponível o mais perto possível de onde é necessária. As três juntas e a tecnologia de conectividade, seja 5G ou 6G, vão trabalhar em harmonia.