Num país onde a fibra ótica cobre 94,1% dos alojamentos e estabelecimentos, segundo a Anacom, uma startup portuguesa criou uma tecnologia que permite detetar fugas de água e incêndios usando essa infraestrutura. A FiberSight, sediada em Coimbra, desenvolveu um sistema de hardware e software com alcance até 25 quilómetros que aproveita as fibras existentes para fazer a monitorização de coisas como temperatura e humidade.“Temos uma tecnologia que é capaz de ligar a qualquer fibra e conseguimos tirar esses parâmetros que nos ajudam a detetar se existe uma fuga de água na rede pública, porque as fibras já estão a ser enterradas junto das canalizações, mas também na deteção de incêndios, porque em muitas zonas rurais temos fibras próximas de zonas de mato onde não há monitorização”, explicou ao Dinheiro Vivo o CEO da FiberSight, Tiago Neves. “Atualmente desperdiçamos mais de 30% de água em fugas que ninguém sabe onde é que estão, porque os canos de água estão todos enterrados”, explicou o executivo. “Conseguimos usar esta hiperconectividade, porque as fibras começam a estar em todo lado, para melhorar o ambiente”, realçou. “Se houver uma fuga de água vai chegar à fibra, porque o solo vai ficar mais húmido. E nós conseguimos saber em tempo real que o solo ficou húmido numa certa zona.”É quase como ter um sensor em cada metro, comparou o responsável. “Nós conseguimos avisar um município, uma empresa de águas, que tem uma fuga naquela localização precisa. E isto é a grande indústria que poderá ter mais impacto para o ambiente e para a sociedade.” Outros exemplos são o da agricultura, para perceber onde é preciso regar e onde se pode poupar água, e o de infraestruturas críticas, como um centro de dados, um aeroporto, uma universidade ou uma fábrica onde é preciso fazer um controlo muito preciso de temperatura e de humidade em muitos pontos. “Gostamos de dizer que inovamos para a sustentabilidade, porque somos uma empresa tecnológica, obviamente com fins lucrativos, mas todas as nossas aplicações têm um interesse sustentável, quer seja poupança do ambiente, poupança de água, mas também poupança da infraestrutura em si. Se não houver fibra ótica no local, a FiberSight pode instalá-la e a empresa cliente pode escolher como fazer a monitorização.“É um serviço de duas coisas. Hardware, caso o cliente queira ser responsável pelos próprios dados, ou então apenas um serviço de monitorização em que damos os dados que o cliente precisa, diretamente nos seus servidores e nas suas bases de dados.”O hardware é montado em Portugal com partes que vêm da Alemanha, Suécia e China, e tem a aparência de uma caixa que fica no edifício ou infraestrutura do cliente. Com uma ideia gerada quando Tiago Neves estava a fazer o doutoramento no CERN, na Suíça, a FiberSight está já a trabalhar com três clientes europeus: a empresa italiana Inmatica, a Universidade de Saint-Étienne, em França, e o próprio CERN. “Passando uma fibra óptica, que é algo comercial e pequeno, nós conseguimos fazer o mesmo que milhares e milhares de sensores fazem, com um único cabo e um único sistema de aquisição”, resumiu o CEO. Tiago Neves referiu que a sustentabilidade foi um grande motor do desenvolvimento da empresa, considerando que isto só é possível porque vivemos hoje num mundo sempre ligado. “Aproveitamos a onda desta hiperconectividade e da hiperligação entre toda a gente para implementar a nossa tecnologia”, disse, salientando que o trabalho do último ano foi adaptar o sistema para funcionar com as fibras que já existem em todo o lado. Isso foi feito em parceria com a Vodafone, depois de ter passado pelo programa Open Innovation 2.0, sendo que a startup está a monitorizar atualmente seis quilómetros de fibra da operadora em Coimbra. Depois de ter recebido 100 mil euros da Portugal Ventures, a startup pretende fazer uma ronda de investimento em 2026 na ordem dos 600 a 700 mil euros. Tem agora nove pessoas e prepara-se para contratar mais, de olhos postos na expansão internacional do negócio. Europa e Estados Unidos são os mercados imediatos, mas a startup pretende também chegar a outras geografias. “Não nos podemos esquecer de mercados onde a sustentabilidade é um problema e onde o acesso à água e ao saneamento também é um problema”, salientou Tiago Neves, dando o exemplo de África. “Fibras ópticas existem em todo lado e a nossa tecnologia pode ter impacto em todo lado”, continuou. “A nossa ambição em termos internacionais é sermos reconhecidos como uma empresa que utiliza a infraestrutura que já existe para melhorar um bocadinho o ambiente e a nossa sociedade.”