O Banco de Portugal (BdP) vai fazer 175 anos no próximo dia 19 e o atual governador, Mário Centeno, aproveitou a sessão solene que marca a data, esta quarta-feira, em Lisboa, para anunciar que o banco central deverá ser conselheiro da economia portuguesa até 2025, ajudando a desenhar políticas públicas para a recuperação e resiliência, que nos próximos anos, estarão reunidas no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
Na nave central do Museu do Dinheiro, onde era uma antiga igreja na Baixa de Lisboa, a sua convidada principal para a festa de aniversário, a presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, também afirmou que vai dar o máximo apoio que puder, dentro dos limites do seu mandato, claro, enquanto a inflação se mantiver sob controlo. O plano de recuperação português vai continuar a beneficiar, quase se certeza, do ambiente de juros ultra baixos e quase zero, pelo menos durante 2022, deixou antever a antiga chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Centeno destacou que, tal como o BCE, também o BdP tem uma nova estratégia, um papel renovado na economia portuguesa. Ela passa por fazer boa análise, com boa informação, e depois por ajudar os governos e os restantes agentes decisores a planear a recuperação económica.
"A nova estratégia assenta num binómio essencial para a tomada de decisão: bons dados; boa análise. Esta é também a tradição do Banco de Portugal, que queremos reforçar nos próximos anos", referiu o antigo ministro das Finanças.
Assim, "até 2025, é objetivo do Banco de Portugal contribuir para uma economia portuguesa recuperada, resiliente e convergente na Europa, no médio e longo prazo".
E, explicou Centeno, "vamos fazê-lo através de uma análise económica oportuna e de qualidade e através de um aconselhamento fundamentado sobre o desenho de políticas públicas" e também "ouvindo as pessoas e os nossos parceiros, nacionais e internacionais, adotando formas de comunicação que favoreçam a compreensão pública sobre o que fazemos e porquê".
Lagarde recorda grande terramoto, 25 de abril e pandemia
Lagarde subiu ao palanque para recordar, de forma telegráfica, momentos importantes da História. O grande terramoto de 1755, a revolução do 25 de abril de 1974 e, mais recentemente, um outro momento de "agora ou nunca" para os decisores políticos: a pandemia de covid-19.
A presidente do BCE congratulou-se com o PRR português e com a janela de oportunidades que este oferece.
"Portugal - um dos primeiros países a apresentar propostas para os fundos do NGEU - deverá agora receber 16,6 mil milhões de euros em subvenções e empréstimos, a significativa maioria dos quais apoiará iniciativas ecológicas e digitais" e tal deverá "reforçar as tendências positivas já em curso: por exemplo, as emissões de carbono no setor da energia desceram para metade desde 2005", disse Lagarde.
Assim, "para tirar o máximo partido desta oportunidade, todas as economias precisam de conseguir adaptar‑se mais rapidamente às mudanças".
"Muito improvável" que as taxas de juro subam no ano que vem
Quanto à atuação do BCE, Lagarde promete que Frankfurt vai sempre ajudar a aplicar o dinheiro das subvenções e dos empréstimos para a recuperação.
A banqueira central lembrou que "as taxas de juro do mercado aumentaram durante as últimas semanas, principalmente devido a uma maior incerteza acerca das perspetivas de inflação, a repercussões externas nas expectativas quanto às taxas de juro diretoras na área do euro e a algumas questões relacionadas com a calibração das compras de ativos num mundo pós‑pandemia".
Mas em termos de "trajetória futura das taxas de juro, articulámos claramente três condições que têm de ser observadas antes de as taxas começarem a aumentar".
Lagarde conclui que "não obstante a atual subida acentuada da inflação, as perspetivas quanto à inflação a médio prazo permanecem fracas e, por conseguinte, é muito improvável que as três condições sejam preenchidas no próximo ano".
Ou seja, é "muito improvável" que as taxas de juro saiam (subam) dos mínimos históricos atuais, zero ou abaixo de zero.
Lagarde preocupada com custo dos combustíveis
"Relativamente às compras de ativos, por enquanto, continuamos a utilizar o PEPP [compras pandémicas de dívida pública, sobretudo] para salvaguardar condições de financiamento favoráveis e assegurar que os custos do crédito para todos os setores da economia não se tornam indevidamente restritivos."
"Um aumento indevido da restritividade das condições de financiamento não é desejável numa altura em que o poder de compra já está a diminuir, devido a faturas de produtos energéticos e de combustível mais elevadas, e representaria um fator adverso injustificado para a recuperação", acrescentou.
"Quanto à calibração das compras de obrigações num mundo pós-pandemia, anunciaremos as nossas intenções em dezembro", mas "mesmo após o esperado termo da situação de emergência pandémica, continuará a ser importante que a política monetária - incluindo a calibração adequada das compras de ativos - apoie a recuperação e o regresso sustentável da inflação ao nosso objetivo de 2%", referiu a chefe máxima da instituição sediada em Frankfurt.
O momento Draghi de António Costa
O primeiro-ministro (PM), António Costa, também foi convidado para o aniversário, claro.
Aproveitou para pedir a Lagarde e ao BCE que mantenham o custo do dinheiro e da dívida em níveis muito baixos e prometeu, em inglês, que "faremos o que for preciso" para assegurar umas finanças públicas saudáveis, remetendo assim para o discurso do antigo presidente do BCE, Mario Draghi, quando este prometeu fazer tudo para salvar a zona euro, em 2012.
Costa, nesta que poderá ter sido uma das suas últimas aparições públicas na pele de primeiro-ministro (deste governo), repetiu perante Lagarde e Centeno que "são as contas certas que garantem a credibilidade internacional de Portugal, permitindo-nos ter poupado três mil milhões de euros de juros da dívida anualmente face a 2015 e alcançar valores recorde no investimento contratado pela AICEP em 2018, 2019 e, novamente, em 2021".
"That"s why it is now our time to say that we will do whatever it takes to ensure sound public finances", atirou o primeiro-ministro.
Mas Costa refere que um País que está disposto a tudo para manter as contas certas (défice e dívida a cair), vai querer sempre apoios externos concretos e decisivos.
As respostas económicas nacionais "nunca serão suficientes e deverão ser conjugadas, nomeadamente, com uma política monetária que assegure condições de financiamento favoráveis à consolidação da recuperação, adaptando-se, de forma gradual, ao fim do período de emergência".
Assim, "é fundamental que a política monetária acompanhe a evolução das nossas economias, assegurando uma recuperação robusta e sustentada de todos os países da área do euro", disse o PM.
"Uma retirada precoce dos estímulos, sem a necessária flexibilidade ou gerando incerteza, colocará em causa a força da recuperação", avisou António Costa.
(atualizado 12h45)