Combater o “direito à preguiça”

Numa altura em que, no calendário universitário, as festas académicas entram em competição direta com a preparação para os exames, o Educar tem Ciência desta semana é dedicado à procrastinação e às melhores formas de a combater.
Joana Rato. Foto: Global Imagens
Joana Rato. Foto: Global Imagens
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Que levante o braço quem nunca procrastinou. Adiar uma tarefa que tem de ser cumprida é um comportamento comum e, em alguns casos, até prazeroso. Contudo, se se tornar sistemática, a procrastinação pode acarretar problemas com consequências diretas tanto no desempenho dos estudantes como a nível psicológico, alerta Joana Rodrigues Rato, professora de Neuropsicologia da Universidade Católica Portuguesa e a convidada desta semana do Educar tem Ciência, um projeto da Iniciativa Educação em parceria com a TSF e o Dinheiro Vivo.

“Há várias investigações que estabelecem a relação entre a procrastinação e a saúde mental. Quem procrastina muito tem maiores níveis de stress”, explica Joana Rodrigues Rato. A frustração de não conseguir atingir um objetivo acaba por levar ao questionamento das próprias capacidades e a uma grande instabilidade emocional, alerta a especialista. Um facto tanto mais preocupante se for tida em conta a evolução das taxas de prevalência da procrastinação entre os jovens universitários. “Há uns 20 anos já se apontava uma percentagem a variar entre 10% a 70%. Mais recentemente, já se fala entre 80 e 95% e, no que diz respeito à procrastinação crónica, pode estar nos 50%”, refere Joana Rodrigues Rato.

Numa época em que as solicitações são constantes - das séries para ver aos jogos para experimentar, passando pelos alertas constantes que caem nos telemóveis e até nos relógios de pulso - torna-se cada vez mais difícil resistir às distrações. Mas, convertida num hábito, a procrastinação vai ter consequências na aprendizagem. “Por vezes o esforço de última hora faz quase milagres, mas a questão é qual a qualidade desse trabalho e o que é que depois fica em termos de aprendizagem. Não fica nada”, alerta a neuropsicóloga.

De pequenino…
Uma forma de prevenir que a procrastinação se torne um hábito passa, por exemplo, por atuar ao nível da gestão do estudo numa fase mais precoce. “A criança começa a ter estes desafios de trabalho e estudo por volta do primeiro ciclo, com os trabalhos de casa. Há uma necessidade de contrariar o impulso de optar pelas tarefas mais agradáveis e perceber que a concretização da tarefa pode ser um motivo de prazer”, defende Joana Rodrigues Rato. “Se conseguirmos aprender isto desde cedo diminui a probabilidade daquilo que é uma tendência e um risco natural nos jovens adultos - porque também sabemos que isto está relacionado com a própria trajetória de maturação cerebral”, continua a especialista.

Optar pela chamada procrastinação ativa - adiar tarefas mais importantes em favor de outras que pareçam menos fastidiosas - não é a melhor opção. Joana Rodrigues Rato sugere a divisão de uma tarefa complexa em várias pequenas tarefas mais fáceis de cumprir como a melhor forma de evitar a procrastinação. Uma estratégia que deve ser adotada pelos professores. “O melhor é os professores irem fazendo os chamados pontos de verificação: quatro dias depois de dar o trabalho perceber se já arranjaram um título, um objetivo.… Esta forma de fasear diminui drasticamente os níveis de ansiedade na entrega do trabalho”, garante Joana Rodrigues Rato, para quem a grande chave para combater a procrastinação é a monitorização. “Ir questionando sobre o progresso do trabalho vai ajudar o estudante a aumentar a sua responsabilidade sobre o que tem de fazer. E é sobre esse aumento de responsabilidade que temos de trabalhar”, defende.

“Não conheço ninguém que nunca tenha adiado intencionalmente uma tarefa. E é com esta naturalidade que devemos perceber que, no caso dos estudantes, é preciso monitorizar e ajudá-los a fazer essa gestão, para evitar um círculo vicioso no qual podemos entrar em problemas mais crónicos e dos quais é difícil sair sem ajuda”, conclui Joana Rodrigues Rato.

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