Como estão os teus filhos?

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Como bem se sabe é no Verão que se fazem os balanços. Não é no final do ano que eles acontecem, mas sim durante o mês de Agosto. A rentrée das famílias, assim como a dos políticos, acontece agora. Setembro devia ser Janeiro, segundo o nosso calendário Gregoriano, uma vez que quem o define é o Ministério da Educação: o nosso ano começa em cada ano lectivo. Daí ser esta a altura em que discutimos a vida dos nossos filhos com os amigos que encontramos. Sim, porque nós, pais, teimamos em discutir os nossos filhos como quem discute política, religião ou futebol. Em que tudo pode ser uma ofensa.
-Então, e os teus filhos como é que estão? E fazem o quê?
E assim começa com o nervoso miudinho conversas que podem acabar em discussões como se o tema o fosse a invasão da Ucrânia e do outro lado estivessem russos pró-Putin. Há pais, sábios, que encolhem os ombros lacónicos: "Tudo bem". Outros, a maioria, vão à guerra:
- O meu mais velho vai para a faculdade. Para uma privada.
-Ah... Não teve notas boas? Coitado. Devia esperar um ano: o meu vai para fora. Acho que lhes devemos dar mundo.
- Mundo? Cá eu não os quero longe.
-Pois, mas é inevitável. Faz-lhes bem.
-Nem todos são iguais.
-Mas devem estar preparados a desenrascarem-se. Temos essa obrigação como pais.
(E caldo entorna).
- Pois eu acho que a nossa obrigação é dar-lhes tempo para eles escolherem o seu caminho.
- Oh... Eles só sabem escolher o caminho se conhecerem as várias possibilidades. Isto é muito pequenino para eles.
- Pois, não concordo. Eles é que sabem.
- O meu não queria mas nós insistimos e não me parece arrependido.
- Eu não insisto. São pontos de vista......
- De facto, os miúdos hoje fazem o que querem. Por isso é que só saem de casa aos 30 anos.
- Se os meus saírem de casa aos 30, não me importo.
(É o momento do primeiro sorriso sarcástico).
Outro dos temas é sobre a vida social dos filhos. A quantidade de pais convictos de que os filhos nunca fumaram, nunca beberam, nunca se "safaram" (como eles selvaticamente dizem), nunca mentiram, não sabem palavrões, nunca chegaram fora de horas, nunca lhes passou droga pela frente, é maior do que a areia na praia.
- Tenho a certeza absoluta.
Ou outros - onde eu tristemente me incluo - sentem-se no mínimo falhados. E têm a resposta pronta.
- Eles fazem mais ou menos aquilo que fazíamos na idade deles.
- Pois os meus não.
- Então, deviam. Há idades para tudo. E mais vale fazerem na idade certa do que mais tarde...
- Ou seja?
- Nada. Só isso.
- Pois eu nunca fiz e não faço.
- Hum.
E assim se estraga um jantar.
Depois temos os telemóveis. De um lado os pais contra o seu uso até aos 14 anos no mínimo, do outro os que cederam à pressão ainda a criança não sabia ler:
- Eles não podem ficar de fora dos grupos. É uma maldade. Todos os amigos têm.
- Mas aquilo destrói-lhes as cabeças. Está provado.
E saltam os estudos científicos publicados nas redes.
- Pois, mas é uma inevitabilidade dos tempos modernos - respondem os adversários, como quem diz "seus retrógrados".
- Não quero saber. Ensino os meus a não cederem às modas.
- Coitadinhos...
Mais um jantar pelo esgoto abaixo.
Os temas de Verão sobre os filhos somem e seguem. Não há consensos, não há regras, não há barreiras. Auditamos a nossa educação durante o Verão e saímos dele pelo nevoeiro, cheios de promessas que este ano é que vamos acertar as agulhas ou ainda mais convictos de que o caminho que escolhemos é o mais acertado.
O pior é que eles mudam. E não há forma de percebermos que cada ano deles é uma década nossa em que tudo pode acontecer; de percebermos que somos inevitavelmente ansiosos pais reativos, a correr atrás do prejuízo e a discutir a quadratura do circulo.
Para o ano há mais.

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