Como o Facebook está a ajudar a democratizar as ressonâncias magnéticas

Nova descoberta em inteligência artificial que envolve Facebook permite transformar e facilitar as ressonâncias magnéticas
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Há muito que a tecnologia promete revolucionar a medicina. Mesmo que não seja uma revolução por si só, têm sido dados pequenos passos nesse sentido de utilizar o que o machine learning permite para ter melhores diagnósticos. O avanço mais recente é revelado oficialmente pela Facebook AI - a divisão de inteligência artificial da rede social mais utilizada no planeta - e pelo centro médico de investigação nos EUA, NUY Langone Health.

O sistema agora anunciado é apelidado de “um importante marco na área da investigação”, não só melhorando a experiência do paciente na hora de tirar uma ressonância magnética, mas também facilitando o acesso a esse método tradicionalmente caro e abrindo caminho para novas formas de utilização das ressonâncias magnéticas.

O estudo clínico “inédito” demonstrou, assim, que o novo sistema de inteligência artificial torna possível ter o mesmo nível de detalhe e precisão com um quarto dos dados necessários para uma ressonância magnética completa.

“E isso não só permite que seja quatro vezes mais rápida, o que é útil para evitar que se esteja tanto tempo quieto dentro da máquina (com crianças ainda é mais difícil) como vai permitir fazer mais ressonâncias a mais gente e reduzir os custos dando acesso a muito mais gente”. Quem o diz é o professor Daniel Sodikson, da NYU Langone, numa mesa redonda em que participámos.

Larry Zitnick, investigador do Facebook AI, explica que este software não vai ser posto à venda e será disponível gratuitamente para todos no mundo em open source. “Só queremos que mais clínicas testem e usem, não há objetivo de comercialização nem de lucro, só queremos ver melhorias na parte científica e de machine learning que ajudem o sistema a melhorar”, explica.

Michael Recht, considerado um pioneiro em radiologia a nível global e que trabalha no centro NYU Langone, admite entusiasmo “com a descoberta”: “pode trazer novos avanços em que ainda nem pensámos e democratizar o uso das ressonâncias magnéticas a nível global”.

No tal estudo de intercambiabilidade, a ser publicado no ‘American Journal of Roentgenology’, os radiologistas analisaram tanto as ressonâncias magnéticas tradicionais como as imagens geradas com um modelo de IA, com cerca de 75% menos dados brutos. Os radiologistas produziram os mesmos diagnósticos com ambos e não conseguiram distinguir quais foram criados com o novo método.

Tudo isto trata-se do culminar de quase dois anos de pesquisa do Facebook AI e da iniciativa fastMRI da NYU Langone, um esforço conjunto para melhorar a tecnologia de imagens médicas e avançar na pesquisa sobre o uso de IA para gerar imagens a partir de dados limitados. “O estudo demonstra pela primeira vez que as imagens geradas por IA são, no essencial, indistinguíveis dos exames de RM padrão e são intercambiáveis em relação à precisão do diagnóstico,” explica Michael Recht.

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(vídeo sobre o funcionamento)

As ressonâncias magnéticas padrão usam uma técnica matemática para gerar imagens. O novo fastMRI tem uma abordagem diferente, alimentando uma quantidade muito mais limitada de dados num modelo de IA que foi treinado para criar uma imagem que corresponda à realidade. Isso representa um difícil desafio, onde a rede neural deve ser capaz de preencher as lacunas na limpeza de dados de maneira eficaz e confiável, sem sacrificar a precisão.

De acordo com a equipa de investigação, embora as técnicas de visão computacional anteriores em outros domínios tenham conseguido gerar imagens confiáveis, o modelo rápido de ressonância magnética deve pegar em dados incompletos e gerar uma imagem que pareça plausível e corresponda com precisão à verdade fundamental. Alguns píxeis ausentes ou modelados incorretamente podem significar a diferença entre uma imagem totalmente clara e uma em que os radiologistas encontram um ligamento rompido ou um possível tumor.

Gerar uma imagem precisa não é o único desafio, no entanto. O modelo de IA também deve criar imagens que sejam visualmente indistinguíveis das imagens tradicionais de ressonância magnética. Os radiologistas passam muitas horas a analisar cuidadosamente essas imagens e uma aparência e sensação desconhecidas podem tornar os radiologistas menos propensos a adotar a ressonância magnética rápida nas suas práticas.

Para o estudo, seis radiologistas especialistas reviram dois conjuntos de ressonâncias magnéticas de joelho não identificados de 108 pacientes anónimos que foram avaliados na NYU Langone Health.

Michael Recht explica algumas das potencialidades do novo sistema e aborda ainda as teorias de autores como Yuval Noah Harari, um historiador e filósofo com talento para o futurismo relativamente à desigualdade do futuro poder passar por haver dois tipos de medicina no mundo, os que terão acesso à nova medicina potenciada por tecnologia e aqueles com medicina tradicional.

“A IA pode trazer melhor medicina para todos, com a vantagem de poder fazer a diferença em países com menos meios, tornando os sistemas mais baratos e acessíveis, levando a ressonância magnética de forma mais rápida a mais gente”. O investigador assume que é importante que os avanços sejam em open source e abertos a todos, “não só porque assim é possível melhorar as potencialidades destes sistemas, como levá-los a mais gente e democratizar mais do que nunca os cuidados de saúde tecnológicos”.

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