O projeto intermunicipal para compra de uma nova frota de autocarros e prestação de um novo serviço público de transporte rodoviário de passageiros na Área Metropolitana de Lisboa (AML) é o maior contrato público de sempre (feito em 4 lotes) registado na base de dados oficial do governo (Portal Base), que remonta a 2008.
De acordo com um levantamento feito pelo Dinheiro Vivo no portal do Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, o projeto, que envolve os 18 municípios da AML (Alcochete, Almada, Amadora, Barreiro, Cascais, Lisboa, Loures, Mafra, Moita, Montijo, Odivelas, Oeiras, Palmela, Seixal, Sesimbra, Setúbal, Sintra e Vila Franca de Xira), foi assinado no final de março deste ano e ascende a mais de 1,2 mil milhões de euros repartidos por quatro grandes áreas de intervenção.
Além desta grande contratualização relativa aos novos autocarros para a AML, o Portal Base mostra ainda que outros dos maiores contratos de que há registo (a base de dados remonta a 2008) também são deste ano e dizem respeito à construção de linhas de comboio (a ferrovia tutelada pelo ministro das infraestruturas, Pedro Nuno Santos), os túneis de drenagem da cidade de Lisboa (uma obra da câmara municipal de Fernando Medina), vacinas contra a covid adquiridas à Pfizer pelo Ministério da Saúde, de Marta Temido, etc.
A nova Carris Metropolitana
Parte deste projeto tem o dedo da câmara de Lisboa (CML) e até vai ter a marca Carris Metropolitana, como referem as minutas dos contratos e já anunciou recentemente o presidente da CML, Fernando Medina, que vai a eleições a 26 de setembro próximo, tal como os outros edis envolvidos neste mega investimento.
O maior lote neste contrato dos autocarros suburbanos e intermunicipais foi ganho por uma empresa nova que foi criada para o efeito, a Viação Alvorada, mas que resulta da fusão de duas empresas antigas e bem conhecidas na região de Lisboa, a Vimeca e a Scotturb, que prestam serviços de transporte aos subúrbios norte de Lisboa. O contrato em causa vale 397,2 milhões de euros e tem a duração de sete anos.
Esta Viação Alvorada é detida pelo grupo brasileiro Guanabara. Ao assinar o lote 1, vai ficar com a exploração da zona noroeste de Lisboa (concelhos de Amadora, Oeiras, Sintra, com as respetivas ligações a Lisboa e Cascais).
Segundo a empresa, atualmente o universo Vimeca e Scotturb opera 98 carreiras, mas com este investimento serão criados mais 35 itinerários, elevando o total para 133 careiras.
Além da zona noroeste de Lisboa, há ainda mais três lotes. Um assinado também em março com a Rodoviária de Lisboa, que serve a zona do Oeste, no valor de 365 milhões de euros. Outro para a margem sul assinado com os Transportes Sul do Tejo (TST) e avaliado em 260 milhões de euros. E um quarto lote para reforçar o serviço público na península da Setúbal e arredores, assinado com a Nex Continental, Empresa de Transportes Luísa Todi e Transvia, cujo valor ronda os 185 milhões de euros segundo o portal do governo.
Todas estas novas linhas de autocarros devem começar a operar no final deste ano, início de 2022, e a maioria andará na estrada com a nova marca Carris Metropolitana em 15 dos 18 concelhos da AML. Ao todo, este projeto deve implicar a compra de 600 autocarros, diz fonte de uma das empresas.
O valor adjudicado aos autocarros Supera de longe outras grandes obras e contratos como a construção de linhas de comboio, a compra de vacinas e medicamentos oncológicos, a concessão de serviço aéreo nos Açores (também plurianual) ou o túnel do Marão.
Os quatro lotes assinados dizem respeito a uma concessão do serviço público a uma maioria de empresas de transporte privadas e todos têm uma duração de sete anos, revelam os contratos.
Além de perfazerem o maior contrato público alguma vez celebrado em Portugal (dos que constam na base de dados oficial do governo, que remonta a 2008), o projeto de renovação de linhas de autocarros e de frotas para servir as populações da AML ajudou o valor total assinado em contratos públicos a atingir um novo máximo histórico no primeiro semestre deste ano.
Ao todo, as entidades do setor público (Estado, ministérios, institutos, municípios, áreas metropolitanas, como neste caso dos autocarros) celebraram contratos com o setor privado no valor de 6,8 mil milhões de euros. Por contratos entende-se tudo: concursos públicos, ajustes diretos e todas as outras modalidades previstas, como os acordos-quadro ou os concursos limitados por qualificação prévia.
Autocarros para Lisboa: quase 20% do total contratado no primeiro semestre
Portanto, os autocarros deram o empurrão (quase 20% do total contratado no primeiro semestre) que faltava para que este ano o investimento público dê um salto muito significativo.
Aquele valor de 6,8 mil milhões de euros em adjudicações e compras de serviços e bens é, como referido, um recorde na série feita pelo DV e resulta de um dos maiores aumentos de que há registo no valor da contratação pública em Portugal. A subida no primeiro semestre foi de quase 40% face a igual período do ano passado.
O ambiente atual é bastante propício ao investimento público pois vai arrancar o Plano de Recuperação e Resiliência, no qual estão inscritos 13,9 mil milhões de euros em verbas a fundo perdido, mais 2,7 mil milhões de euros em dívida ultra barata. Estes fundos têm por objetivo apoiar investimentos amigos do ambiente. No caso dos 600 autocarros, os contratos referem que se trata de veículos modernos e pouco poluentes.
Mas nem só de autocarros vivem os contratos públicos. Na lista dos maiores surgem, outros projetos. O concurso público para a empreitada de execução da linha circular do Metro do Porto (troço Praça da Liberdade - Casa da Música) foi ganho pela Ferrovial e pela construtora Alberto Couto Alves e vale quase 190 milhões de euros.
E há outro grande que foi atribuído às mesmas empresas: diz respeito à construção da linha amarela, de Santo Ovídio a Vila D'Este. Mais 100 milhões de euros adjudicados.
Fernando Medina volta a aparecer neste ranking dos maiores contratos com a "execução dos túneis de drenagem de Lisboa e intervenções associadas", uma obra que arrancou com empréstimos do Plano Invest EU (antigo plano Juncker). Esta obra de grandes dimensões foi ganha pela Mota-Engil e está avaliada em quase 133 milhões de euros.
A ferrovia de Pedro Nuno Santos e as vacinas de Marta Temido
Pedro Nuno Santos, o ministro das Infraestruturas, também dá aqui, em 2021, o ar da sua graça no Portal Base.
Adjudicou três projetos grandes em ferrovia só este ano. Um é a empreitada de via e catenária entre Évora e Elvas/fronteira, e construção civil do subtroço Évora - Évora Norte. Vale 87 milhões de euros e foi ganho pelo grupo Mota-Engil, Somafel e Teixeira Duarte.
Outro é a empreitada de modernização da linha da Beira Alta, troço Mangualde - Celorico da Beira. Ganhou outra vez a Mota-Engil e o contrato vale 69 milhões de euros.
E outro também é na linha da Beira Alta, mas diz no troço Santa Comba Dão - Mangualde. Aqui as empresas ganhadoras são do grupo espanhol Sacyr (Sacyr Neopul e Sacyr Somague). O valor da empreitada ascende a 58 milhoes de euros.
Portanto, desde o início do ano a construção e modernização de linhas de comboio já absorveu mais de 213 milhões de euros em investimento e despesa pública.
Destaque ainda para as vacinas contra a covid-19. Foram assinados já dois contratos num valor conjunto de quase 90 milhões de euros com a Pfizer para o fornecimento de milhões de doses daquele medicamento. O primeiro contrato deste ano, publicado em fevereiro, vale cerca de 55 milhões de euros. O segundo, divulgado em março, ascende a 34 milhões de euros, aponta o portal Base. Quem compra é o Ministério da Saúde, de Marta Temido.