
Apesar do “decréscimo significativo” do comércio mundial de calçado em 2023, fruto da quebra nas importações nos principais mercados internacionais, as perspetivas globais da fileira para o ano de 2024 são “otimistas”, com o setor a antecipar um crescimento tanto em volume como em valor. O preço médio do calçado deverá subir entre 1,5 a 5%, embora haja quem aponte para um aumento acima dos 20%.
Estes são dados do inquérito semestral do World Footwear, o World Footwear Business Conditions Survey, realizado pela APICCAPS, a associação portuguesa do calçado, realizado em abril e que mostra que o custo das matérias-primas é o que mais preocupa os empresários do setor, a nível global, seguido de perto pela “procura insuficiente” nos mercados internacionais e pela concorrência no mercado doméstico.
"Apesar do cenário macroeconómico, as perspetivas globais do inquérito permanecem otimistas. A maioria dos membros do painel espera um crescimento tanto no volume de vendas como nos preços de calçado, prevendo-se um aumento significativo nos preços. Este sentimento positivo relativamente aos aumentos de preços pode ser influenciado pelo impacto remanescente das pressões inflacionistas globais, mesmo que as taxas de inflação tenham moderado gradualmente no atual semestre. Além disso, a maioria dos entrevistados espera que a saúde das suas empresas permaneça forte nos próximos meses, com a estabilização do emprego", pode ler-se no comunicado. O estudo antecipa, ainda, que, nos próximos três anos, é esperado que o peso dos canais de retalho online na venda de calçado se reforce.
Criado em 2019, o World Footwear Business Conditions Survey vai já na sua 10ª edição e uma análise mais fina aos dados mostra que o panorama de queda de importações de calçado foi transversal aos vários mercado. Dos dez maiores importadores do mundo, só Espanha, China e Países Baixos importaram mais sapatos em 2023 do que no ano anterior, com crescimentos respetivos de 4,7%, de 1,8% e de 0,2%.
Já os Estados Unidos, o maior importador de calçado do mundo, teve uma quebra de 41,8%, enquanto o Reino Unido recuou 19,1%, a Bélgica 14,7% e a Alemanha 14,4%. Japão, França e Itália tiveram quebras mais moderadas: 2,8%, 1,8% e 1,7%, respetivamente.
Lembra o estudo que as projeções dos Fundo Monetário Internacional apontam para um crescimento do produto interno bruto mundial de 3,2% em 2024, mas que o crescimento esperado varia de região para região. As expectativas apontam para um crescimento de 6,8% da eocnomia indiana, de 4,6% da chinesa e de 3,3% e 5%, respetivamente, da Nigéria e do Quénia. Os Estados Unidos deverão crescer 2,7% e a zona euro apenas 0,8%.
Questionados sobre a saúde do seu negócio nos próximos seis meses, 59% mostram-se confiantes, com 23% destes a antecipar mesmo que o negócio evoluirá de forma muito forte. Há ainda 33% de industriais e retalhistas que admitem que o negócio se manterá estável e 8% que antecipam dificuldades. Os inquiridos no continente africano mostram maiores níveis de confiança dos que os restantes.
Em termos de emprego, 40% dos inquiridos acreditam que irá crescer, enquanto 8% apontam para um decréscimo. Os restante 52% apostam numa estabilização dos níveis de trabalho.
Quanto aos preços do calçado, três quartos dos inquiridos (76%) apontam para um crescimento dos preços nos próximos meses, sendo que 37% estimam um aumento de 1,5% a 5% e 23% acreditam que possa ir dos 5% a 20%. Há ainda 16% que antecipa que o calçado poderá ficar mais de 20% mais caro na próxima época. Do terço restante, 19% acredita que os preços irão estabilizar, podendo evolui 1,5% para cima ou para baixo; 3% apontam para uma redução do preço até 5% e os restantes para descidas acima disso.
Os operadores em África e na Ásia são os mais otimistas quanto à subida dos preços, com mais 89,2% e 82,9%, respetivamente, dos inquiridos a apontar para esse cenário. Já na Europa, 45,8% dos participantes aposta numa estabilização dos preços.
Em termos de quantidade, 62,6% dos inquiridos esperam que as vendas cresçam - há mesmo 38,2% que acreditam que será um crecsimento forte ou muito forte -, enquanto 22,6% perspetivam uma estabilização e 14,8% antecipam quedas. Mais uma vez, os operadores em África e na Ásia parecem mais otimistas do que os restantes, indica o estudo.
Questionados sobre as dificuldades esperadas, 37% apontam os custos das matérias-primas e outros materiais, 36% estão preocupados com a fraca procura nos mercados internacionais e 35% com a competição no mercado doméstico. A procura insuficiente no mercado interno é apontada por 30% dos inquiridos, as dificuldades financeiros por 26% e igual número mostra-se preocupado com a competição nos mercados internacionais. Os impostos são indicados por 13% dos inquiridos e as dificuldades em arranjar mão-de-obra são referidas por 12%.
A falta de equipamentos adequados, as barreiras legais ou administrativas ao comércio internacional, as questões climáticas e os requisitos regulatórios ou administrativos são outras das questões apontadas.
"Depois de vários meses muito condicionados pelo modesto comportamento da economia mundial, o setor do calçado começa a dar alguns sinais de recuperação. A título de exemplo, entre os principais importadores mundiais de calçado, apenas três revelaram registo positivo no último ano. As perspetivas quanto à evolução do estado dos negócios nos próximos meses e mesmo a evolução dos preços são claramente um bom sinal", refere o porta-voz da APICCAPS, em comentário aos dados.
Paulo Gonçalves lembra que, ainda assim, 36% dos especialistas internacionais "continuam a lamentar a insuficiência de encomendas do mercado internacional", pelo que, e dado que a indústria portuguesa exporta mais de 90% da sua produção, "é essencial" que estes bons indicadores se confirmem nos próximos meses.
Para este responsável, o fim dos dois focos de guerra, a estabilidade da inflação e o recuo das taxas de juro "seriam excelentes notícias" para as empresas exportadoras. De qualquer forma, a associação está a "incentivar as empresas a reforçaram a atividade promocional, para que quando os bons sinais se efetivarem possamos estar bem colocados na cena competitiva internacional", assegura.
Nesta 10 edição do inquérito semestral do World Footwear Business Conditions Survey foram obtidas 115 respostas válidas, das quais 45% de industriais, distribuidores ou retalhistas.