Da reputação

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"Sem dúvida que é simpático entrar nas instalações de uma empresa e ver, a par da sua missão, os seus valores emoldurados. E é curioso constatar que, de uma maneira geral, muitos deles são comuns a todas as empresas, o que, sabemos, leva à banalização desses mesmos valores que acabam por perder significado. Definir a cultura e os valores de uma organização é importante, mas não vale a pena exibir, por exemplo, a integridade e o respeito para logo a seguir vermos os seus líderes nas páginas dos jornais nem sempre pelos melhores motivos. Os valores têm de ser vividos no quotidiano. Quer isto dizer que, para cada valor definido, todos na empresa têm de estar conscientes de quais são os comportamentos que lhes estão associados. Se, por exemplo, a integridade tiver sido definida como um valor, o departamento de compras terá de ser à prova de bala, o comercial apenas venderá o que vai acrescentar valor ao seu cliente e os fornecedores receberão a tempo e horas. Os valores fazem parte do que não é negociável numa organização. São intocáveis. E o exemplo, nunca é de mais salientar, tem de vir de cima".

Lembrei-me deste excerto do meu livro "Era uma vez um talento", publicado em 2017, a propósito de duas notícias, por sinal próximas uma da outra, acerca do banqueiro e da estrela do ténis que decidiram quebrar as regras de isolamento impostas pela pandemia. As suas decisões levaram à demissão do primeiro que, de imediato, veio a público informar que a sua "capacidade de representar o banco ficou comprometida" enquanto o tenista foi inibido de participar no Open da Austrália. Quais serão os danos para a reputação de cada um deles só o futuro o dirá. Existem com certeza situações, desde Galileu quando contrariou a ideia de que a Terra seria plana, em que a quebra das regras faz avançar o mundo. Mas os dois exemplos que menciono seguramente não terão esse efeito, sobretudo numa época em que o sofrimento com a pandemia atingiu as proporções que conhecemos e em que todos estamos ainda a ser penalizados.

Mais do que nunca as empresas estão sob o escrutínio das pessoas que nelas trabalham e aquelas que são apetecíveis no mercado de trabalho, as consideradas talentos, não hesitarão em sair para uma organização que lhes assegure valores que são cumpridos pelo topo. Aquelas que não o podem fazer, por não serem consideradas talentos ou por falta de qualificações, facilmente entrarão em modo passivo agressivo, resistindo a qualquer tipo de mudança. Por outro lado, aqueles que procuram uma nova situação profissional, cada vez mais se informam acerca da empresa à qual se candidatam. Sendo certo que muitas empresas oferecem uma imagem positiva para o exterior às vezes essa imagem não condiz com a que é vivida internamente, levando a que consigam atrair talento, mas não a mantê-lo. Um talento sabe isso e informa-se com quem lá trabalha antes de aceitar qualquer desafio. Assim, qualquer organização ganhará em refletir sobre se os valores que a definem são espelhados nos comportamentos de todos, a começar pelos seus líderes.

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