Os motoristas de matérias perigosas ameaçaram secar as bombas de gasolina e parar o País com uma greve por tempo indeterminado para exigir aos patrões o cumprimento de um acordo de aumentos salariais para 2021 e 2022 e um novo contrato coletivo que assegurasse o cumprimento dos tempos de trabalho. Sete dias depois do início da paralisação, esquecida a corrida aos postos de gasolina que deixaram muitos com o ponteiro a zeros e com o regresso à “normalidade” assegurada por forças policiais e Forças Armadas, o Sindicato Nacional de Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP) aceitou abrir mão de quase todas as suas exigências para tentar chegar a um acordo. Desconvocada a greve ao 7.º dia, falta esperar pela esperar pela reunião que na terça-feira irá sentar à mesa das negociações patrões e sindicatos para saber se a intransigência chegou ao fim e se aplaude novo “acordo histórico”.
Depois de quase “duas décadas de não valorização salarial”, os motoristas exigiam um acordo para aumentos graduais no salário-base até 2022: dos atuais 630 euros para 700 euros em janeiro de 2020; 800 euros em janeiro de 2021 e para 900 euros em janeiro de 2022. Uma subida que, acrescida aos prémios suplementares que estão indexados ao salário-base, daria 1400 euros em janeiro de 2020, 1550 euros em janeiro de 2021 e 1715 euros em janeiro de 2022. O aumento do próximo ano seria, assim, de 70 euros no salário-base, mais 55 euros nos prémios. A que somaria um novo subsídio de operações para os motoristas de matérias perigosas.
Para além dos salários, o SNMP reivindicava ainda um novo contrato coletivo de trabalho com um prazo mais estendido. Objetivo: assegurar que o contrato, em vez de dois anos, passasse a ter uma duração de seis, garantindo a priori aumentos de 50 euros de ano para ano a partir de 2021.
A proposta - adiantou Pardal Henriques, o advogado que é a cara do sindicato - visa aumentar o salário base dos motoristas para mil euros até 2025, com indexação ao crescimento do salário mínimo nacional, que permitiria "um prazo mais dilatado para que as empresas possam cumprir com aquilo que ficar estabelecido no CCT e para que haja a paz social que o país necessita".
Na lista de reivindicações estava ainda o cumprimento da legislação europeia em matéria de tempos de trabalho e descanso semanal, com uma limitação de horas e o seu pagamento integral. De acordo com o Sindicato de Motoristas de Matérias Perigosas, estes profissionais trabalham entre 15 e 18 horas por dia e, a esta altura, já esgotaram as 200 horas suplementares do ano.
O aumento do valor dos seguros, exames médicos suportados pelo patronato e a atualização do valor das ajudas de custo eram outras das exigências.
Ainda na quarta-feira, a Federação dos Sindicatos de Transportes e Comunicações (Fectrans), o maior sindicato do setor que não tinha aderido à greve, assinou um “memorando de entendimento” com a ANTRAM, que representa os patrões, para começar a negociar um novo contrato coletivo. A primeira reunião está agendada para 12 de setembro. Para já, está garantido um aumento mínimo de 266 euros por mês para "um motorista de pesados que, por exemplo, transporte combustíveis e trabalhe com camiões cisterna”. A acrescer está um prémio de 125 euros de subsidio de operações. O trabalho noturno passa também a ser pago à parte.
Este "memorando de entendimento" melhora os salários, valoriza questões como as diuturnidades e muda conceitos de atribuição de regras de ajudas de custo diárias no transporte ibérico e internacional, garantiu José Manuel Oliveira, coordenador da Fectrans.
Depois de quatro dias de greve, o Sindicato Independente dos Motoristas de Mercadorias (SIMM), um pequeno sindicato com apenas 1200 filiados que se tinha juntado ao protesto dos motoristas de matérias perigosas, acabou por desconvocar a paralisação e aceitar as mesmas condições.
Mas afinal o que divide ainda patrões e motoristas de matérias perigosas, depois de estes já se terem mostrado dispostos a abrir mão da exigência de desdobramento dos aumentos salariais para 2021 e 2022? Uma diferença de 50 euros – os motoristas de matérias perigosas exigem que, dada a especificidade das suas funções, o subsídio de operações seja não de 125 euros como para os restantes profissionais mas de 175 euros, mais 40% que a associação patronal considera “injusta” e “incomportável” para as empresas.
Falta saber até onde vão ceder sindicatos e patrões para pôr fim a esta greve que ninguém queria, mas que acabou por ser suspensa apenas ao 7.º dia. O País fica à espera da reunião de terça-feira, que terá como mediador o Governo, no meio de muitos considerandos e novas ameaças de greve às horas extraordinárias, fins de semana e feriados.