Deputados que são a voz do dono!

Deputados que são a voz do dono!
Gerardo Santos/Global Imagens
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«Os deputados são os representantes do povo». Esta frase parece estar cada vez mais longe da realidade, os deputados nos dias que correm são, sobretudo, os representantes do líder que os escolheu.

Com o passar dos anos, o envolvimento político das forças vivas da sociedade foi diminuindo na política. Os eleitos são cada vez menos pessoas que os partidos vão buscar para se credibilizar perante os eleitores, e são cada vez mais uma continuação da voz do líder do partido que os escolheu.

Por outro lado, há também cada vez mais dificuldade em angariar pessoas na sociedade civil, sejam independentes, simpatizantes ou mesmo membros dos partidos quando o salário pelas funções de deputado é muito abaixo do que se paga por iguais competências nas empresas privadas.

Sabia que os deputados têm os seus salários congelados há 12 anos?

Sim, exactamente há 12 anos, diga-me lá outro emprego em que há 12 anos que se recebe exactamente o mesmo, em que se leva para casa a mesma coisa? Deve ser desesperante!

Quando a Sonae ou a EDP precisam de contratar um dos melhores, pagam para isso; mas nós, os portugueses, não considerámos necessário pagar para ter os melhores como nossos representantes. E, assim, ficamos cada vez mais com as segundas, terceiras ou milésimas escolhas; nos dias de hoje, os que aceitam concorrer a deputados ou são pessoas sem relevância, ou então, são «meia dúzia de líricos» que ainda se movem pelo bem comum.

E por isso os segundos empregos proliferam entre os deputados (o que nem seria mau, se isso acarretasse mais experiência em vez de ter o Parlamento cheio de advogados, advogados e mais advogados, vá-se lá saber porquê!).

Assim, com estas condições de partida, os partidos e os seus representantes no Parlamento vão sendo cada vez mais uma pequena escola de caciques; de pessoas que nunca tiveram carreira e que apenas deram tudo nas lutas internas e na guerrilha partidária até terem um lugar.

A fidelidade ao dono, ou será lealdade?, neste caso já nem sei muito bem, é o único imperativo a ter em conta.

E depois, a situação torna-se caricata quando muda o dono, leia-se: o líder do partido; em que grande parte dos deputados muda, perdendo-se nestas mudanças todo o conhecimento e competência entretanto adquirida.

Os deputados não valem por si mas por quem representam.

Segundo li num jornal de hoje, dois em cada três actuais deputados do PSD não irão regressar após as eleições legislativas de 10 de Março; ou melhor, 45 dos actuais 76 deputados sociais-democratas não aparecerão nas listas de candidatos apresentadas por Luís Montenegro e pela ‘nova’ AD.

Podemos dizer que Montenegro está no seu direito, não está para ficar com a tralha deixada pelo seu antecessor, e rival Rui Rio; sobretudo porque teve uma difícil relação com o grupo parlamentar desde que subiu a líder. Agora virão os homens e mulheres de sua confiança. Parece justo! Não acha? Claro que é justo para Montenegro (mas será justo para o seu partido?).

A cada nova liderança vão nascendo novas figuras, e outras são escorraçadas do mapa; o PSD deve ser o partido que mais quadros foi perdendo ao longo das últimas duas décadas; e isto já é tão grave que muitos disseram, e eu também, que “o CDS é óptimo numa coligação porque tem mais quadros relevantes que o actual PSD”… Como é possível termos chegado a isto? O PSD! Um dos pilares do nosso sistema político, um dos dois principais partidos do arco da governação?

Os socialistas (porque, se calhar, o poder também agrega), têm tido uma táctica diferente, colocam sempre no Parlamento uma representação das diferentes forças dentro do partido; e por isso veremos naquelas bancadas muitas figuras socialistas que não fazem parte dos fiéis ao Secretário-Geral Pedro Nuno Santos.

E existem até figuras que pertencem às listas por mérito próprio, que não pertencem a nenhuma corrente, estão apenas pelo seu peso específico e competência. (E assim, a cada nova liderança não será preciso começar tudo de novo.)

Se Montenegro mantiver a palavra e se for realmente embora no caso de perder as eleições; provavelmente, o próximo líder do PSD não estará sentado na Assembleia da República. Os Presidentes sociais-democratas a primeira coisa que fazem é afastar os rivais mais próximos do Parlamento… Isto já aconteceu com Rui Rio, com Passos Coelho, e até com Montenegro (e até haverá ainda mais casos mas estes são os mais próximos no tempo).
 
Desta forma será sempre muito difícil um partido ter rostos em que os portugueses acreditem e em quem tenham confiança. A constância e a segurança de uma linha orientadora comum e permanente é fundamental.

Com esta estratégia o Partido Social Democrata vai perdendo cada vez mais a sua força, só resta que depois não culpe os portugueses….


Nota: O autor escreve segundo o Antigo Acordo Ortográfico

("Até às eleições" é o mote para uma sequência diária de artigos de opinião de Duarte Mexia, que serão publicados, precisamente, até à realização das próximas eleições Legislativas, marcadas para 10 de março.)

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