Despesa por pagar dos municípios engordou em 2020

A maioria da despesa realizada no ano passado, mais de 75% dos novos gastos, foi em bens de capital. Receita recuou e excedente do setor municipal caiu para metade.
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"A despesa por pagar dos municípios terá aumentado em 2020, quer ao nível dos passivos não financeiros, quer das contas por pagar", refere o Conselho das Finanças Públicas (CFP) num novo estudo divulgado esta quinta-feira.

No relatório "Evolução Orçamental da Administração Local em 2020", a entidade presidida por Nazaré Costa Cabral acrescenta que "por outro lado, a dívida já vencida e em atraso terá registado uma redução logo no início do ano de 2020, ainda que ao longo do ano se tenham notado situações de agravamento em alguns municípios".

O ano passado foi muito exigente para as contas públicas. E o universo dos municípios não foi exceção. A despesa aumentou, as dívidas que ficaram por pagar idem, a receita afundou e assim o excedente orçamental do setor municipal caiu para cerca de metade.

Este relatório do CFP "baseia-se nos valores de contabilidade orçamental pública referentes a 298 dos 308 municípios portugueses (que representavam 97,5% da despesa efetiva de 2019)".

"Nesse universo, a Administração Local terá apresentado em 2020 um excedente orçamental de 239 milhões de euros, menos de metade do observado em 2019. O aumento da despesa municipal em 2020 e a quebra da receita foram determinantes para esta variação."

Trata-se de "o mais baixo excedente registado na ótica da contabilidade orçamental pública para os municípios portugueses desde, pelo menos, 2011", observa a entidade.

O CFP recorda que os municípios foram ajudados pelo Estado na medida em que receberam apoios e transferências. "As transferências, em particular as provenientes da Administração Central para os municípios, contribuíram positivamente para a variação da receita, ao registarem um aumento de 311 milhões de euros, mas ainda assim foram insuficientes para compensar os desenvolvimentos desfavoráveis nos restantes agregados da receita não fiscal."

Segundo o Conselho, parte do recuo no saldo das contas municipais "é explicada pela conjuntura económica desfavorável em 2020 e pelas isenções de taxas e licenças concedidas em resposta à pandemia de covid-19".

De acordo com o documento, o setor local "gastou um total de 211,4 milhões de euros" com medidas ligadas à pandemia. Cerca de metade, 103 milhões de euros, foi para pagar despesas de saúde, como equipamentos de proteção individual (máscaras, vlseiras, luvas, toucas, batas descartáveis, etc.) e medicamentos, por exemplo.

Despesa por pagar: quase mil milhões de euros

"Em 2020, a informação que o CFP conseguiu recolher aponta para um agravamento da despesa por pagar dos municípios. Esta evolução ocorreu ao nível dos passivos não financeiros e das contas a pagar", começa por referir a análise.

"Estes agregados, excluindo dívidas de transferências e de outros fluxos para entidades das Administrações Públicas (AP), terão aumentado, 202 milhões de euros e 121 milhões de euros, respetivamente".

Isto significa que os passivos totais (a primeira parecia das contas por pagar em sentido lado) tenham engordado para um total de 995 milhões de euros entre final de 2019 e final de 2020. É um salto anual superior a 25%.

As contas a pagar, um subconjunto dos passivos, dispararam mais de 35%. No final de 2020, os municípios estavam a dever 462 milhões de euros, segundo este indicador.

"As contas a pagar constituem um subconjunto dos passivos não financeiros e correspondem à dívida vencida ou vincenda", refere.

Diz ainda que "já os pagamentos em atraso são a parte desta dívida vencida cujo prazo de morosidade é superior a 90 dias. Para esta evolução contribuíram o aumento da despesa corrente primária por pagar (excetuando as aquisições de bens e serviços correntes) bem como com a aquisição de bens de capital (investimento na ótica da contabilidade pública)".

75% do aumento da despesa foi em "bens de investimento"

O CFP nota igualmente que a esmagadora maioria da despesa realizada no ano passado, mais de 75% dos novos gastos, foi em investimentos e bens de capital.

"A despesa municipal cresceu 2,8%, impulsionada pela despesa de capital, que justifica mais de três quartos do aumento anual daquele agregado, em resultado do acréscimo da aquisição com bens de investimento", refere o documento.

Já a receita dos municípios "diminuiu (1,4%) devido às reduções nas vendas de bens de investimento, das taxas e das vendas de bens e serviços correntes".

"As transferências, em particular as provenientes da Administração Central, contribuíram positivamente para a variação da receita, ao registarem um aumento de 311 milhões de euros, mas foram insuficientes para compensar os desenvolvimentos desfavoráveis nos restantes agregados da receita não fiscal".

Tal como no caso do Estado e das administrações centrais, o ano de 2020 foi bastante atípico na medida em que foi amplamente afetado pela pandemia, que puxou pela despesa pública e deprimiu a receita.

Dívida em atraso (mais de 90 dias) alivia

Apesar da forte subida das contas por pagar, há, no entanto, uma nota positiva nesse universo. Os pagamentos em atraso (despesa por pagar há mais de 90 dias) deu sinais de algum alívio, diz o CFP.

"A despesa por pagar em atraso terá registado uma nova redução em 2020, prosseguindo a trajetória descendente observada desde 2012, ainda que com um ritmo muito menor ao verificado em anos anteriores."

A redução da despesa atrasada foi de 25 milhões de euros e para ela "contribuiu (em termos não consolidados) a redução do stock de pagamentos em atraso por parte de 39 municípios num total de 30,5 milhões de euros, em particular nos municípios de Aveiro (-6,8 milhões de euros), Vila Real de Santo António (-4,3 milhões de euros), Penafiel (-3,6 milhões de euros), Caminha (-2,9 milhões de euros) e Braga (-2,2 milhões de euros), tendo 12 daqueles 39 municípios deixado de apresentar quaisquer dívidas com pagamentos em atraso", diz o estudo do Conselho das Finanças.

Assim, "dos 308 municípios, quatro quintos não apresentavam quaisquer pagamentos em atraso no final de 2020, ou seja, um total de 247 municípios (menos 9 do que no final de 2019)".

Uma das explicações deste 'sucesso' está, em boa parte, na ajuda do Estado aos municípios. "Para a redução dos pagamentos em atraso em 2020 continuou a contribuir a utilização de verbas recebidas a título de assistência financeira do Fundo de Apoio Municipal (FAM), bem como objetivos de redução dos pagamentos em atraso constantes dos respetivos planos de ajustamento".

Segundo fontes oficiais, "o FAM é um mecanismo de recuperação financeira dos municípios portugueses, mediante a implementação de medidas de reequilíbrio orçamental, de reestruturação da dívida e, subsidiariamente de assistência financeira".

"É um fundo constituído em partes iguais pelo Estado e por todos os municípios portugueses, através de um capital social de 418 milhões de euros, visando a recuperação financeira dos municípios em situação de desequilíbrio financeiro, através da implementação de programas de ajustamento municipal."

(atualizado 12h45)

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