Com o fim do prazo à vista, há que acelerar a transposição do Código Europeu das Comunicações Eletrónicas (CECE). O governo decidiu por isso, transpor a diretiva tal como está, deixando cair os contributos do grupo de trabalho que desde janeiro se dedicava ao tema "que não refletissem a transposição mandatória do CECE, de forma a não atrasar ainda mais o cumprimento da meta para a transposição, sem prejuízo de registar e pretender ponderar as propostas adicionais", adianta fonte da secretaria de Estado das Comunicações.
A proposta do anteprojeto legislativo deverá ser conhecida em novembro. O governo tem até 21 de dezembro para transpor a diretiva. "As regras das fidelizações e cessação antecipada dos contratos", contidas na diretiva "serão integradas no ordenamento jurídico português, beneficiando os utilizadores de comunicações eletrónicas dos mesmos direitos que os restantes cidadãos europeus", garante o Executivo.
Ainda neste sábado, em entrevista ao Dinheiro Vivo, Pedro Mota Soares, que lidera a associação das operadoras, confessara-se "surpreendido e dececionado" com a postura do regulador. "A Apritel tentou, participou e continuou no grupo de trabalho sempre com esta disponibilidade de poder tentar que no final a solução seja a melhor solução possível", frisou o presidente da Apritel. "É olhando muitas vezes para posições, razões, discutindo argumentos que se chega muitas vezes a uma solução que é uma solução melhor para o próprio país. Eu confesso que fiquei muito surpreendido quando a Anacom se recusa a dialogar com todos os parceiros dos setores, consumidores, com o próprio governo... Fiquei surpreendido e fiquei dececionado porque acho que, objetivamente, uma postura como esta não ajuda a tentar permanentemente encontrar aqui soluções que, ainda por cima, são muito importantes para o futuro."
A transpor neste ano, a diretiva europeia era uma ambição do governo conhecida desde novembro do ano passado. "O governo decidiu não dar sequência a nova alteração da Lei das Comunicações Eletrónicas (LCE). O que nos propomos fazer é mesmo acabar com ela... Efetivamente, não faria sentido estar a promover tal alteração, que se concluiria por meados do próximo ano, para logo a seguir a revogar", disse Souto de Miranda, na época secretário de Estado das Comunicações, durante o congresso da APDC. Com este anúncio o governante lembrava que, em 2020, o país teria de transpor o novo Código Europeu das Comunicações Eletrónicas (CECE) e, ao mesmo tempo, fez cair por terra a proposta de mudança da Lei feita pela Anacom, enviada em fevereiro ao Parlamento, mas que nunca chegou a ir à discussão.
"O que faz sentido é avançar já para essa transposição. O novo Código revogará a LCE ou boa parte dela. A Secretaria de Estado irá, por isso, apresentar uma proposta de transposição da Diretiva 2018/1972, com o apoio da Anacom. O objetivo é cumprirmos o prazo previsto para a transposição."
A 9 de janeiro de 2020 o governo criou o grupo de trabalho CECE - com representantes do regulador (Anacom), dos operadores (Apritel) e dos consumidores (Deco e Secretaria de Estado de Comércio e Serviços e Defesa do Consumidor). Objetivo? "Obter uma alteração consensual ao regime jurídico das comunicações eletrónicas que irá vigorar durante os próximos anos, que mereça a aceitação e conforto dos principais intervenientes no setor (...) com vista a adotar e publicar, até 21 de dezembro de 2020, as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à referida diretiva, bem como aplicar essas referidas disposições a partir da mesma data", esclarece fonte da secretaria de Estado das Comunicações.
Em agosto, a Anacom enviou a sua proposta de transposição ao governo, tendo os representantes dos consumidores e dos operadores apresentado os seus comentários. "Chegado o momento da análise do Anteprojeto e dos comentários à mesma, o Grupo de Trabalho foi informado de que a Anacom apenas se pronunciaria em termos formais, através do seu conselho de administração, quanto a eventuais propostas de alteração ao constante do Anteprojeto de Transposição oportunamente apresentado ao Governo e à AR, quando o projeto de diploma lhe fosse submetido/apresentado para apreciação e análise pela(s) entidade(s) à(s) qual(is) remeteu o Anteprojeto", informa fonte da secretaria de Estado das Comunicações.
Prazos que o Executivo considera que não se coadunam com a rapidez que o dossier exige. E avançou para uma decisão: todos os contributos fora do previsto na CECE caem por terra. Por agora. "O secretário de Estado Adjunto e das Comunicações decidiu eliminar da proposta todas as sugestões, por parte de todos os representantes, que não refletissem a transposição mandatória do CECE, de forma a não atrasar ainda mais o cumprimento da meta para a transposição do CECE para o ordenamento jurídico português, sem prejuízo de registar e pretender ponderar as propostas adicionais", adianta fonte da secretaria de Estado das Comunicações.
Apesar deste balde de água fria - num dossier que vinha a ser trabalhado pelo GT CECE há mais de nove meses - o governo garante que os direitos dos consumidores estão salvaguardados com esta transposição direta da CECE para a legislação nacional.
"Relativamente às matérias relativas aos Direitos dos Utilizadores (como as regras das fidelizações e cessação antecipada dos contratos), todas as matérias que decorrem efetivamente da legislação comunitária (CECE) são de harmonização máxima e, portanto, serão integradas no ordenamento jurídico português, beneficiando os utilizadores de comunicações eletrónicas dos mesmos direitos que os restantes cidadãos europeus", garante fonte da Secretaria de Estado das Comunicação. De resto, "é intenção do governo que, imediatamente a seguir à transposição da Diretiva, as restante propostas que vão além das disposições daquele Código sejam objeto de debate público, nomeadamente, pelos seus beneficiários e destinatários das obrigações."
"O GT apresentará um relatório com a proposta do anteprojeto legislativo em novembro."