Dois programas, dois pesos e duas medidas

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O triunfo do Partido Trabalhista “inglês”  passou despercebido na nossa comunicação social e o seu programa económico não mereceu mínimo relevo, submergido pela atenção que as redacções deram à vitória da France Insubmisse. Foi pena, porque o programa do novo primeiro-ministro, Keir Starmer, é sensato e realista, em ruptura com o do seu antecessor no Partido, Jeremy Corbyn. E interessaria aos portugueses saber quão afastado está das ideias programáticas do partido socialista português. Em Portugal, o programa económico trabalhista seria considerado pouco menos que neoliberal. 

O programa económico de Starmer aponta o crescimento como a via para trazer prosperidade e bom nível de vida para a população. E, ao contrário do pensamento de Pedro Nuno Santos de atribuir ao Estado um papel decisivo na condução da economia, o programa trabalhista preconiza “um governo que trabalha em parceria com as empresas...”. 

Deste modo, o programa afasta qualquer intenção de controlo sobre as empresas ou de qualquer “take over”, mesmo sobre as que já estiveram na esfera do Estado, ao mesmo tempo que se disponibiliza para analisar e aportar capital a projectos do sector privado, todavia, sem nunca o substituir, caso elimine impasses à sua concretização. E admite a constituição PPP, se tal se justificar.

Também contrariamente ao programa do PS, admite a baixa do IRC, forma de preservar a posição das empresas face aos seus concorrentes internacionais, afastando naturalmente qualquer aumento de impostos ou de contribuições para a Segurança Social. 

Na habitação, o programa de construção anual de 300.000 fogos é entregue exclusivamente à iniciativa privada, para o que prevê simplificar os licenciamentos, de forma a construir onde a procura o exige. 

Pois este programa de um partido de esquerda despreconceituosa de que ficam alguns apontamentos não mereceu qualquer notória divulgação. Os critérios editoriais de grande parte dos nossos media julgaram mais apelativo realçar um programa político de uma esquerda tão extrema como o da “France Insubmisse”, aliás, perfeitamente inexequível no quadro das democracias europeias e que só viria a piorar as condições de vida dos mais pobres, do que referir a abertura e equilíbrio do programa económico trabalhista. É que era bom cotejá-lo com o do PS português…

António Pinho Cardão, economista

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