Dos fortes reza a história

Publicado a

Diz-nos a física que a resiliência é a propriedade de um corpo de recuperar a sua forma original depois de sofrer um choque ou deformação. Aplicando às pessoas, a resiliência refere-se à sua capacidade, quando confrontada com acontecimentos graves, de criar mecanismos de defesa que permitam aguentar e ultrapassar a situação.

Aplicando o termo resiliência aos sistemas, sejam eles um ecossistema, uma comunidade ou uma economia, podemos dizer que é a combinação da capacidade de resistência e adaptação, transformando choques e perturbações em infinitas possibilidades de renovação e inovação.

Num sistema tão global, complexo e multifatorial, as organizações não podem avaliar os riscos num único vetor de ameaça. As organizações resilientes antecipam riscos, estabelecem ligações entre riscos e estratégia, evitam lacunas de perceção na preparação e medem o que é importante, preparando-se para os impactos dos riscos sistémicos e emergentes em toda a sua cadeia de valor e capitalizando as oportunidades.

Num dos seus mais recentes estudos - "Risk Resilience Report" - a Marsh questionou mais de 1.000 empresas em 9 regiões e em mais de 30 setores de atividade, procurando analisar os impactos e a interconexão de 6 riscos emergentes (pandémicos; tecnologias emergentes; cibernéticos; ambiental, social e de governance - "ESG"; regulatórios; e geopolíticos) nas principais áreas de negócios.

Avaliando a agilidade das organizações, o nosso estudo revelou que 1 em cada 4 organizações não tem processos eficazes para identificar, responder e aprovar mudanças com base em questões de risco de tendência.

Eventos como o bloqueio do Canal de Suez em março; cortes de energia no Texas provocados por eventos naturais em fevereiro e a paralisação de fornecimento de petróleo por ataque cibernético em maio; recordes de temperatura no Canadá e Estados Unidos; cheias catastróficas na Alemanha, Bélgica e China no passado mês de julho, incêndios na Sibéria, Califórnia, Grécia e Turquia, são apenas alguns dos muitos exemplos de situações de alta velocidade e impacto que, por mais que digamos que não, estavam dentro dos cenários mais pessimistas e vêm exigir de todos um foco cada vez maior na interconexão de riscos e não apenas no foco mediático sobre números diários da pandemia.

Apesar dos riscos ambientais estarem no topo dos riscos globais desde há vários anos e de haver um foco crescente no clima/ESG, 88% dos entrevistados fizeram notar que apenas modelam parcialmente ou nem sequer modelam este risco. Por outro lado, e também a título de exemplo, no âmbito do risco geopolítico, quase 40% das empresas que responderam ao estudo demonstram ter um processo ineficaz ou nenhum processo para identificar e responder às tendências geopolíticas. Estranhamente, muitos entrevistados dizem mesmo que não é um risco importante para as suas organizações, apesar de indicarem que as forças geopolíticas têm um impacto comercial potencialmente significativo.

O facto é que as organizações evoluem num mundo híper conectado de riscos, onde eventos aparentemente isolados expõem a fragilidade dos sistemas globais a uma velocidade e com impactos cada vez maiores e mais recorrentes.

A pandemia revelou falhas e graus de risco sistémico que poucas organizações consideravam anteriormente. A falta de planeamento de continuidade de negócio, o colapso das cadeias de fornecimento e tensões gerais nas operações de negócio trouxeram à tona a necessidade de repensar abordagens.

Todos nos lembramos que esta pandemia levou semanas para que os seus impactos fossem sentidos globalmente. No entanto, uma queda generalizada de energia ou um ataque cibernético paralisante podem causar danos imediatos. Para evitarem situações de colapso, as organizações precisam ter em conta a velocidade de cada risco no seu planeamento de resiliência - e muitas estão presas a experiências anteriores, preconceitos de confiança ou simplesmente não veem os riscos, quando a velocidade dos mesmos é claramente crescente.

Antes de terminar, deixo-vos com algumas perguntas para que reflitam sobre as vossas organizações: existe um mecanismo robusto para antecipar riscos futuros? Podem modelar e prever o risco depois de identificá-lo? São ágeis o suficiente para identificar, responder e implementar medidas de gestão de risco?

As organizações resilientes serão aquelas que, dentro de uns anos, estiverem cá para nos dizer como deram uma permanente resposta a estas questões e contar como foram capazes de acompanhar a história e seguir para o futuro.

Fernando Chaves, Risk Specialist da Marsh Portugal

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt