E na imprensa, que vai acontecer ao papel?

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Nas últimas semanas todos ouvimos falar dos problemas surgidos na produção de alguns materiais e no funcionamento das cadeias logísticas, situação que tem levado a aumentos de preços de uma grande gama de produtos.

Qual o reflexo nos media? Como é que a situação afeta nomeadamente jornais e revistas? Há um efeito colateral da pandemia que se repercute no fornecimento de papel para jornais e revistas e que pode acelerar o processo de eliminação das edições impressas e sua passagem integral a edições digitais.

Há razão para isto: como se sabe a pandemia acelerou o comércio eletrónico e de repente a procura por papel para fabrico de embalagem cresceu; em simultâneo, nomeadamente nos períodos de confinamento e em vários países, muitas publicações optaram por diminuir o tamanho das edições e as próprias tiragens em papel e desenvolver as edições digitais. Ou seja, enquanto aumentava a procura por papel de embalagem, diminuía a procura por papel de impressão. O resultado disto foi que muitas grandes fábricas de elaboração e transformação de pasta de papel em todo o mundo - desde a Nova Zelândia à Rússia, passando pela Noruega - optaram por se reestruturar.

Um recente artigo da revista britânica The Economist indica que fábricas que produziam essencialmente papel de jornal se reconverteram para produzir papel de embalagem. Quando o confinamento terminou e as empresas de media quiseram voltar a fazer edições em papel, defrontaram-se com uma oferta menor e preços mais altos - de tal maneira que em alguns países começaram a surgir problemas de fornecimento e os preços começaram a subir. Segundo a mesma revista os preços de papel de impressão de jornais, revistas e livros previstos para 2022, na Europa, são 50% a 70% mais elevados do que os registados no início do corrente ano - tipicamente, há contratos anuais de compra nesta indústria e os fabricantes de papel estão a forçar uma revisão de preços para o próximo ano. Continuando a citar a mesma revista, a associação alemã que representa os editores de jornais e revistas alertou que a situação criada pelas fábricas de papel pode levar ao encerramento das edições impressas e ao acelerar da transição integral para o digital de muitos títulos.

Assim, de repente, os editores de jornais e revistas tornaram-se o elo mais fraco de uma cadeia onde eram os principais clientes. Agora, são os fabricantes de embalagens os maiores clientes das fábricas de papel e são eles que têm poder negocial, enquanto os editores perderam a influência que tinham na indústria papeleira.

Este é um ciclo que dificilmente se reverterá e o papel impresso passará a ser, dentro de poucos anos, uma exceção destinada aos livros e a algumas revistas. Muito provavelmente, o ciclo de transição total dos jornais diários para o digital acontecerá antes daquilo que se previa, em meados da próxima década - e isto por um efeito conjugado do custo do papel e das novas possibilidades que se abrem com as capacidades das redes 5G. Esta conjugação de fatores vai levar à necessidade de acelerar a implementação de novos modelos de negócio que garantam receitas, desde o desenvolvimento da publicidade online até ao aumento das assinaturas digitais ou compra pontual de artigos ou edições. E, claro, isto levará a novas alterações no modelo de consumo da informação.

Teremos no setor dos media anos agitados pela frente.

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