
Que futuro se antevê para a imprensa? A pergunta exige uma resposta “para um milhão de euros” ou uma bola de cristal. Mas, na verdade, nenhuma capaz de um feedback fiável. “Este é um problema que tem muitas variáveis e, por isso, as soluções podem ter muitas formas”, acredita Nuno Artur Silva. Mas, para o fundador das Produções Fictícias e ex-secretário de Estado, independentemente do modelo de negócio dos meios de comunicação, o mais importante é ter uma população com um nível elevado de literacia mediática. “É mais decisivo para a democracia que os alunos, desde o início do seu percurso escolar, saibam a importância das notícias e distinguir as armadilhas das fake news e das deep fake do que aprendam físico-química”, exemplifica.
Na opinião do também ex-administrador da RTP, e um dos participantes da talk “O futuro da imprensa: acesso, responsabilidade e proteção”, que decorreu na última quinta-feira, é essencial que seja criada uma disciplina sobre os media e sobre a forma como os cidadãos se relacionam com a informação, desde a escola primária. “É tão básico como história, língua portuguesa ou matemática, mas as pessoas ainda não acordaram para a sua importância decisiva”, sublinha.
É verdade, como aponta Francisco Rui Cádima, que existe um programa nacional para a literacia mediática e que há uma noção crescente de que o tema é muito importante. Contudo, e apesar de se realizarem cursos de formação, workshops e outras iniciativas dispersas, “ainda não foi incluído nos programas escolares”, diz o ex-professor e investigador do ICNOVA - Instituto de Comunicação da NOVA, que participou igualmente nesta talk. “É preciso criar esse bichinho da literacia mediática, mas também da literacia digital, sobretudo nos jovens”, reforça.
Com uma população devidamente capacitada para a importância da imprensa e do jornalismo, o ex-professor acredita que a procura por jornais e revistas terá tendência a crescer e a normalizar a assinatura digital. No entanto, defende que “deve haver um contributo líquido do Estado” que pode materializar-se, por exemplo, com a atribuição de um “cheque-media” que, à semelhança do atual cheque-dentista permita que todos os jovens possam escolher qual ou quais os jornais ou revistas que querem assinar.
Há um modelo de negócio sustentável?
A massificação das plataformas digitais obrigou os meios de comunicação social a alterar os seus modelos de negócio e de financiamento. No entanto, a subscrição paga de informação não teve a aceitação esperada e, hoje, muitos jornais e revistas ainda não encontraram um modelo de financiamento sustentável, que não coloque em causa a independência jornalística, e lutam pela sobrevivência.
O financiamento do Estado esteve, e está, em cima da mesa, mas “a questão é como pensar essa intervenção sem que ela venha a condicionar a edição e os conteúdos dos projetos em causa e a sua imparcialidade”, defende Nuno Artur Silva. O ex-administrador da RTP recorda o papel do Estado na promoção e democratização da cultura, e na garantia de diversidade, e exemplifica: “Se o Estado não financiasse o cinema em Portugal este não existiria”. Na sua perspetiva, na área do jornalismo, promover a diversidade é também assegurar a existência de um jornalismo livre, nomeadamente através de entidades independentes que garantam a separação entre quem financia e quem produz.
Mas, mais grave do que contar com apoio estatal com receio de descredibilizar o jornalismo é o caminho que alguns órgãos de comunicação social estão a seguir. Por instinto de sobrevivência, como refere Carlos Eugénio, “em vez de trabalhar no sentido de marcar a sua diferença e a sua credibilidade, alguns meios fazem exatamente o contrário e vão atrás do facilitismo das redes sociais, do imediatismo, do sensacionalismo, e do populismo”. Este é, na opinião administrador da Visapress, um caminho para a descredibilização. “Vivemos uma época muito perigosa, mas também muito excitante em relação a tudo o que está a mudar”, salienta, reforçando a importância crescente dos mediadores que ajudem a separar o trigo do joio. “Temos acesso a tanta coisa, mas há um momento em que precisamos dos mediadores que nos digam se uma coisa é verdade ou mentira”.
E se a compra de jornais puder ser dedutível nos impostos? A questão, colocada por Nuno Artur Silva um pouco em jeito de sugestão, poderia, na sua opinião, ajudar a viabilizar a atividade jornalística e alguns meios de comunicação social. Uma solução possível que, como refere Francisco Rui Cádima, faz lembrar a compra antecipada de publicidade, feita pelo Estado, na altura da pandemia. “Foi uma medida que salvou muitos jornais de desaparecerem e que correu bem”, afirma. O antigo professor sublinha que “o Estado devia voltar a olhar para isso”, uma vez que é uma medida indireta e não um financiamento. “São coisas diferentes, e eu acho que devia ser uma política que devia ser vista como uma boa prática para ser continuada e seguida no futuro”, reforça.
Este debate sobre o futuro da imprensa, que contou com a presença dos três especialistas do setor da comunicação, foi moderado por Bruno Contreiras Mateus, diretor do Dinheiro Vivo. Para assistir basta aceder ao site do Dinheiro Vivo.