E se Portugal passasse a ter duas moedas? A hipótese pode parecer estranha, para foi avançada por Harold James, professor na universidade americana de Princeton. Para o investigador, é necessário sair da formulação "euro vs moeda nacional", propondo que se pense numa lógica de "euro + moeda nacional".
Para o professor em Princeton, a ideia é simples: os países em dificuldade teriam duas moedas, uma forte e uma fraca. O euro, a moeda forte, seria usada nas grandes transacções e no comércio internacional; a moeda nacional, no caso português o escudo, seria usada para as transacções internas. James usa como exemplo a Europa do século XIX, em que também havia duas circulações: o ouro e a prata.
Segundo o professor, os funcionários seriam pagos em "prata", diminuindo os custos das empresas e aumentando a competitividade. Contudo, este modelo não é pacífico. Os economistas contactados pelo Dinheiro Vivo são unânimes em discordar de tal "projecto".
Efectivamente, para os especialistas ouvidos, esta medida apenas teria efeito ao nível das exportações. João Duque, professor no ISEG (Instituto Superior de Economia e Gestão), admite que este cenário iria "tornar as empresas exportadoras mais competitivas".
Ainda assim, o economista não tem dúvidas em considerar "um disparate" um modelo deste género. Para o economista, "os portugueses continuariam a usar o euro", já que "ninguém quereria usar o escudo", a moeda mais fraca.
Miguel Beleza, antigo ministro das finanças de Cavaco Silva, alinha pela mesma batuta. "Das experiências que conheço, ninguém quereria" um modelo destes, diz o economista. "Nunca funcionaria", assegura.
Os dois economistas são unânimes em comparar esta hipótese com o que acontece nalguns países, como Angola. A conclusão a tirar é simples: tal como em Angola todos usam o dólar em vez do quanza, também em Portugal o euro seria a escolha ao invés do escudo.
Outra consequência da coexistência das duas moedas seria um aumento significativo da inflação. Assim, os portugueses acabariam inevitavelmente por perder poder de compra. "No dia em que receberia o salário em escudos comprava um carro, mas no dia seguinte apenas compraria meio carro", explica João Duque.
A existência de duas moedas levanta ainda um problema com as taxas de câmbio. Por um lado, usar duas moedas só faria sentido utilizando uma taxa de câmbio variável, que permitisse ter uma moeda mais fraca que a outra. Contudo, o projecto da moeda única tem como pressuposto o contrário: a existência de uma taxa fixa na Europa.
Para João Duque, a saída de Portugal do euro é "impensável". Segundo o economista, "a única hipótese é todos saírem do euro". Ainda assim, o professor do ISEG tem dúvidas sobre o comportamento dos mercados quanto à dívida portuguesa. "Ninguém ia comprar dívida", avisa. Como consequência, Portugal correria o risco de não conseguir financiamento nos mercados internacionais vendendo a dívida em escudos, ficando refém de uma moeda internacional, mais forte.
Os economistas ouvidos pelo Dinheiro Vivo não têm dúvidas: a hipótese de Portugal fazer conviver o euro e o escudo nas carteiras não faz sentido.
Veja aqui a proposta de Harold James na íntegra.