A tática do choque e pavor para obter concessões

As taxas aduaneiras são o instrumento preferido de Donald Trump para coagir os outros países no quadro do America First.
A tática do choque e pavor para obter concessões
EPA/FRANCIS CHUNG / POOL
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Em 2003, a invasão anglo-americana do Iraque foi iniciada com a Operação Choque e Pavor, que consistiu na destruição de pontes e de outras infraestruturas do país liderado por Saddam Hussein. Em 2025, Donald Trump regressou à Casa Branca com uma abordagem análoga, ao assustar tanto vizinhos e aliados, como rivais, seja com medidas económicas, seja com ameaças de anexação para impor a sua visão da America First - embora, para já, sem cortar pontes. Além de criar incerteza entre as chancelarias, uma consequência se extrai desde já: na Europa, os Estados Unidos já não são considerados um aliado.

Segundo uma sondagem realizada em 14 países europeus, Portugal incluído, para o grupo de reflexão Conselho Europeu para as Relações Externas (ECFR), os EUA de Trump são agora um “parceiro necessário” para a maioria (51%), quando em 2023 o sentimento generalizado era de que do outro lado do Atlântico estava um aliado e agora apenas 22% de europeus têm essa opinião. E este estudo de opinião foi levado a cabo antes da tomada de posse do homem de negócios. Que, entretanto, ameaçou a soberania dos aliados Dinamarca e Canadá: aos europeus querendo tomar a Gronelândia, aos vizinhos do norte ao sugerir a sua anexação como o 51.º Estado. Ao mesmo tempo que a sua Administração garante que não terá tropas na Ucrânia, diz ter a intenção de retomar o Canal do Panamá ou de tomar a Faixa de Gaza.

Abordagens coercivas para tentar extrair concessões? Sem dúvida. Veja-se, no caso do México e do Canadá: ao fazer tábua rasa do acordo de comércio por si assinado em 2018 com os países vizinhos, impôs taxas aduaneiras para receber, no espaço de dias, a promessa de ações de reforço da segurança das fronteiras, combate à imigração ilegal e ao tráfico de fentanilo.

No entanto, ao trocar a frágil ordem internacional baseada em regras, a cooperação económica e o soft power por táticas de negociação agressivas para fechar acordos transacionais favoráveis, o método de Trump é arriscado, uma vez que, ao não distinguir aliados de concorrentes, de rivais ou de potenciais inimigos, aumenta as probabilidades de conflitualidade e de, em consequência, se isolar na cena internacional.

Isto enquanto em termos geopolíticos dá mostras de querer reafirmar-se no seu continente. “Embora Washington já não procure a unipolaridade global, apesar das suas aspirações no Indo-Pacífico, provavelmente pretenderá reposicionar-se como a única potência hegemónica regional no Continente Americano”, escreveu o analista José Miguel Alonso-Trabanco.

Por fim, recorde-se que as premissas para a invasão do Iraque - a Administração de George W. Bush acusou o regime de ter armas de destruição maciça e, como tal, de pertencer ao chamado “eixo do mal”- se revelaram falsas e as consequências foram negativas para o país e para a região e mais além, bastando referir que o Estado Islâmico encontrou num país devastado as condições ideais para florescer.

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