Jornal de Letras à beira do fim em grupo preso por decisão judicial

A última edição do JL pode ser esta quarta-feira, após suspensão dos contratos de trabalho. Tribunal homologa o plano de insolvência, amanhã, mas já ninguém acredita em injeção de capital.
Jornal de Letras à beira do fim em grupo preso por decisão judicial
Leonardo Negrão
Publicado a

O Jornal de Letras (JL) regressará esta quarta-feira, 16 de julho, às bancas, após uma semana de ausência devido à greve dos trabalhadores, mas pode ser a sua derradeira edição em quatro décadas. O cenário foi admitido esta segunda-feira por José Carlos Vasconcelos, o diretor histórico do jornal, após a redação ter decidido suspender, em bloco, os contratos de trabalho, na sequência de uma longa agonia no Grupo Trust in News, marcada por salários em atraso, anúncio de despedimento coletivo e pedido de insolvência, que se arrasta há mais de um ano. Os primeiros atrasos no pagamento de salários no Grupo Trust in News remontam a Novembro de 2023.

Os trabalhadores aguardam com expetativa a decisão judicial, prevista para amanhã, que deverá homologar o plano de insolvência, aprovado em maio, e cuja ausência, tem sido justificada pelo proprietário da Trust in News, Luís Delgado, para não avançar com a injeção de capital de 1,5 milhões de euros prevista no plano, disseram ao DN fontes próximas do processo.

São 44 anos de história das letras em Portugal enredados agora nas malhas da Justiça, pendentes de decisões judiciais e de injeções de capital que tardam em ver a luz do dia.

Segundo o DN apurou, a suspensão dos contratos de trabalho tem sido uma opção tomada por vários trabalhadores do grupo, nomeadamente na revista Visão, mas o JL foi a única redação que a tomou em bloco. “Foi a forma que encontrámos para fazer face à falta de respostas e ao incumprimento do plano de insolvência” num processo pouco claro de insolvência aprovado pelos credores em maio (depois de chumbado o Processo Especial de Revitalização), mas ainda sem homologação judicial, explicou Manuel Alpher, jornalista e delegado sindical do JL. A empresa falhou também com o pagamento de impostos e à Segurança Social.

“Numa redação pequena, como é o caso do JL, é mais fácil tomar decisões por unanimidade, por isso decidimos suspender os contratos, mas para cumprir o pré-aviso previsto na lei voltámos a fazer uma edição, que sai esta quarta-feira. Não a fizemos deliberadamente para ser a última, mas temos noção de que pode ser a última”, disse o jornalista. “A melhor expetativa seria se houvesse uma injeção de capital, mas pessoalmente desconfio dessa solução. Acreditaria mais numa venda, com o título a sair da esfera da Trust in News”, desabafa. Não são conhecidos interessados em adquirir os títulos da Trust in News e, quando houve manifestações, não tiveram prosseguimento nem foram alimentadas.

Mas nem esse processo é líquido, pois há problemas com a posse dos títulos, que foram penhorados pelo Novo Banco, face a dívidas totais da ordem dos 30 milhões de euros acumuladas pela Trust in News, e que já terão sido entretanto vendidos a uma terceira entidade, lembra a delegada sindical da Visão, Clara Teixeira, em declarações ao DN.

A 20 de junho, já os trabalhadores do grupo tinham decidido por uma greve por tempo indeterminado, coincidindo com a data final do prazo dado pelos funcionários para o pagamento dos 20% do ordenado de abril, da totalidade do de maio e dos respetivos subsídios de refeição.

Neste momento, segundo o DN apurou, permanecem por pagar 25% do salário de maio e respetivo subsídio de refeição, a totalidade de junho e subsídio de refeição, bem como os subsídios de férias.

Apesar do longo impasse, da falta de pagamento e das greves, os trabalhadores têm insistido em não deixar morrer títulos como a Visão, a Caras, a Exame ou o Jornal de Letras. “Mas as redações estão fragilizadas e o conteúdo não é, não pode ser igual”, admite Manuel Alpher.

A Trust In News tem como acionista único Luís Delgado, é detentora de 16 títulos de comunicação social, entre os quais, para além do JL, a Visão, Exame, Exame Informática e a Caras. De acordo com o plano de insolvência aprovado em maio, com 77% de votos a favor por parte dos credores, prevê a suspensão, venda ou licenciamento de publicações deficitárias, bem como a redução do quadro de funcionários, proporcional às publicações suspensas, e o pagamento faseado das dívidas acumuladas à Autoridade Tributária, à Segurança Social e a demais credores.

O administrador de insolvência já pediu nas últimas semanas autorização aos credores para encerrar empresa e fazer um despedimento coletivo, mas ainda não obteve essa luz verde.

O ainda dono da TiN referiu que o administrador judicial em exercício, nomeado pelo tribunal, “está limitado na sua atuação porque teve de pagar impostos à Autoridade Tributária e contribuições à Segurança Social, para não incorrer num crime, e que por isso não foi ainda possível liquidar os salários na sua totalidade”.

A TIN foi constituída em 2017 e em 2018 comprou à Impresa os títulos que agora arriscam desaparecer.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt