Portugal ocupa atualmente o 6º lugar europeu na quota da mobilidade elétrica, figurando também entre os países com maior percentagem de energias renováveis no seu mix energético a nível mundial. O país definiu ainda uma nova estratégia ambiciosa para a produção de biometano e hidrogénio, para diversificar as fontes de energia. E sonha agora com a exportação de combustíveis mais sustentáveis para a aviação, disse recentemente a ministra do Ambiente e da Energia, Maria da Graça Carvalho.Este percurso visto como “notável e improvável” pelo presidente da Agência Internacional de Energia, Fatih Birol, que passou recentemente por Lisboa, tem de continuar a ser reforçado se queremos reduzir as emissões de gases com efeito de estufa a tempo de evitar o aquecimento global acima dos 1,5 graus até ao final do século, a razão de ser de todos os milhões investidos na transição energética. Mas o investimento tem também de ser replicado noutras geografias, com ajudas massivas ao desenvolvimento dos países mais pobres, sem o que os esforços feitos na UE arriscam não ter impacto relevante, como lembrou recentemente Jorge Moreira da Silva, subsecretário-geral da ONU.A mobilidade é justamente um dos campos onde essa guerra mais se pode ganhar ou perder, tendo em conta que os transportes contribuem em 25% para as emissões de gases com efeitos de estufa. E dentro destes, o total dos rodoviários pesam à volta de 70%.Para já, e apesar dos transportes elétricos ainda estarem longe de serem uma regra, continuam a avançar nas estradas nacionais. “Portugal está acima da média europeia em matéria de mobilidade elétrica, ocupando o 6º lugar na União Europeia no ranking de vendas”, disse Hélder Pedro, o secretário-geral da ACAP (Associação do Comércio Automóvel de Portugal) há dias numa Mobi Conversa, no âmbito do Portugal Mobi Summit.Com efeito, em setembro, os veículos exclusivamente elétricos representaram 29% das vendas de ligeiros passageiros. “No acumulado do ano estamos com 21,5%, acima da média europeia, que é 15%, e muito acima de Espanha, que está a meio da tabela”, disse aquele dirigente. Hélder Pedro sublinhou que Portugal se situa num ranking mais ou menos alinhado “com países como a Dinamarca, a Alemanha e a Holanda, que têm um PIB per capita muito superior ao português”.Para que os veículos elétricos se tornem mais populares, os agentes deste setor reclamam, contudo, maiores incentivos à aquisição, bem como maior rapidez no licenciamento de pontos de carregamento que chega a demorar um ano e meio.Porque, como lembrou Duarte Mendes de Almeida, o administrador da Via Verde Transição Energética, o problema não está tanto do lado da tecnologia. “Acho que do lado da tecnologia, a evolução dos últimos cinco anos no elétrico foi superior à das últimas décadas no combustível. Temos agora novos carregadores com potências superiores a um megawatt, de várias marcas. E mesmo nos carros, os números também apontam nesse sentido”. E dá um exemplo: “Saiu recentemente o CLA, o Mercedes, que promete autonomias na ordem dos 800 km, com velocidades de carregamento de 250-300 kW, ou seja, com capacidade de carregar 400 km em 15-20 minutos.E isto não é o topo de gama, é o base. Acho que a tecnologia não será uma barreira, mas sim um impulsionador da mobilidade elétrica”, considera o administrador da Via Verde. E acrescenta: “O desafio agora está em tornar a experiência do carro elétrico tão conveniente ou até mais conveniente do que abastecer gasóleo. Esta deveria ser a nossa ambição.” O novo regime jurídico da mobilidade elétrica já prevê tornar a experiência de carregamento e respetivo pagamento mais simples e transparente. Revolução no transporte público Nem só de carros elétricos vive a mobilidade sustentável. A mudança de paradigma tem de passar cada vez mais pelo transporte público e, neste campo, há uma revolução silenciosa a acontecer. De norte a sul do país estão a surgir vários projetos de BRT (bus rapid transit), também conhecido como metrobus, que prometem mudar a face do transporte coletivo. Cidades como Braga, Porto e Coimbra têm projetos em curso nesse sentido, enquanto na àrea metropolitana de Lisboa, Oeiras está apostada nesse modelo, o mesmo acontecendo em municípios do Algarve.O modelo do BRT movido a energia elétrica, por bateria ou hidrogénio, promete uma frequência muito mais rápida, tipo metropolitano, graças a uma via própria, às paragens niveladas como o veículo e aos bilhetes pré-comprados para evitar perdas de tempo nas entradas e saídas.E alguns daqueles veículos poderão ser movidos a hidrogénio produzido em Portugal. Para as frotas rodoviárias, o Ministério do Ambiente e da Energia já definiu, de resto, a meta de ter um consumo mínimo de 1% a 5% de hidrogénio verde até 2030, já daqui a cinco anos, no âmbito da nova estratégia para o hidrogénio verde.Nesse sentido, também já há empresas nacionais e multinacionais a posicionarem-se para este mercado do hidrogénio, que apesar de ainda não ser muito competitivo, por falta de escala, é uma aposta com futuro. Assim como as gasolineiras continuam a apostar em combustíveis mais sustentáveis. É por exemplo, o caso da Repsol que lançou um combustível que diz ser 100% renovavél.Porque mobilidade sustentável vai muito além de fontes de energia, mas também tem a ver com dimensões como oferta, preços e acessibilidade, os últimos anos representaram uma baixa significativa do custo dos passes nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. E, em alguns casos, introduziu-se a gratuidade dos transportes para jovens. Cascais permanece, neste campo, um exemplo pioneiro de gratuidade no transporte rodoviário para residentes, trabalhadores ou estudantes no concelho.Ao nível da chamada mobilidade suave e ativa, apesar dos investimentos feitos em ciclovias, Portugal continua a ser dos páises europeus onde não só o investimento público em ciclovias é menor, como onde a utilização da bicicleta é mais residual.Mas o sistema de bicicletas partilhadas a nível europeu representa benefícios superiores a 300 milhões de euros, tendo em conta os resultados de um estudo divulgado este mês pelo EIT (European Instutue for transport and mobility) da União Europeia. O estudo contablizou cerca de 120 cidades e concluiu que os impactos positivos ao nível do ambiente, dos gastos pessoais e da saúde, implicam ganhos anuais superiores a 300 milhões de euros.Estes resultados são um incentivo para os investimentos públicos e municipais em redes de ciclovias e de bicicletas partilhadas. Mesmo que não imediatamente, eles acabam por ter um retorno ao nível do que se poupa no orçamento da saúde.Mas como vêm alertando alguns estudos, ainda é preciso levar as estações de bicicletas partilhadas para zonas mais distantes dos centros das cidades, entrando nas áreas suburbanas, para que o acesso não seja discriminatório.Porque, para além do dever de combater a pobreza energética, está na hora de combater também a pobreza de mobilidade, como lembrou recentemente a secretária de Estado da Mobilidade, Cristina Pinto Dias.