O sector do vinho do Porto, que atravessa uma dura crise, está disposto a contribuir com cinco milhões de euros anuais para a criação de um fundo promocional destinado, exclusivamente, à promoção de marcas próprias. . Mas, para tal, o Governo terá de aceder a transformar o Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP) em associação de direito público, de modo a que não haja o risco de, como aconteceu este ano, o Estado vir apropriar-se de eventuais sobras de dinheiro nas contas do IVDP. . Em causa estão os oito milhões de euros que, em Março, o instituto teve de transferir para o Ministério das Finanças, mesmo não sendo financiado pelo Orçamento de Estado, mas pelas taxas que cobra ao sector. Uma medida imposta pelo despacho do então secretário de Estado do Orçamento que obrigou os institutos públicos a transferirem os saldos de gerência para os cofres do Ministério das Finanças. . Oito milhões que o sector recusa dar como perdidos. "Consideramos que estão cativos e reclamamos que sejam disponibilizados para o fundo promocional. O dinheiro não é do Estado, é dinheiro que o instituto foi cativando, em taxas e serviços prestados ao comércio e à produção, ao longo dos anos", sublinha Isabel Marrana, directora-geral da AEVP. . O vinho do Porto é, não só, emblemático, como constitui o principal exportador dentro do sector vitivinícola. Mas, também aqui, o tempo é de vacas magras. "O sector está mal. Tivemos uma década complicada, as vendas caíram, perderam-se 12 milhões de garrafas e 44 milhões de euros. O Douro perdeu outro tanto, senão o dobro, em termos de vindimas", afirma Isabel Marrana, sublinhando que os 'stocks' no comércio são de "50 mil pipas a mais do que a lei do terço impõe [a lei do terço obriga a que por cada garrafa vendida haja três em 'stock']". . Adequar a oferta à procura é o primeiro pilar da estratégia definida, e é nele que se insere o corte de 25 mil pipas no benefício [autorização de produção de vinho do Porto] na actual vindima que passou de 110 mil pipas em 2010 para 85 mil este ano. Uma medida que gerou fortes protestos na região e levou ao afastamento do presidente do IVDP, Vilhena Pereira, pelo secretário de Estado da Agricultura, Daniel Campelo. Recorde-se que o quantitativo de benefício é definido pelo conselho interprofissional do IVDP, onde têm assento tanto os representantes da produção como os do comércio, tendo o presidente, nomeado pelo Governo, capacidade de veto. . "Foi um corte difícil e radical mas, enquanto não fosse feito os preços de venda na produção continuariam a cair, arrastando consigo os preços no comércio", refere Isabel Marrana, lembrando que, o sector dito exportador tem hoje "uma percentagem muito considerável de vinhas e, por isso, isto custa a todos, mas não havia outra forma". . O segundo pilar da estratégia é aumentar as vendas, e aí surge a "necessidade urgente" de promoção às marcas próprias, as únicas em que o sector se pode "sustentar para encontrar valia e valor acrescentado para poder viver". As vendas de vinho do Porto estão a cair 6%, mas em países como a Bélgica e Portugal, o seu terceiro e quarto mercado, a quebra é de dois dígitos: 11,2% e 18,2% respectivamente . Conscientes disso, as empresas estão disponíveis, garante a directora-geral da AEVP, para gerar receitas adicionais para apoiar os programas de promoção às marcas próprias. Mas querem que seja o IVDP a fazê-lo e não o Estado. "Não precisamos do Estado para fazer nada disto, senão ainda corremos o risco de em vez de oito nos tirarem 12 milhões", atira Isabel Marrana. E explica porquê: "As burocracias impostas pelas actuais regras do uso dos dinheiros públicos, a que o IVDP também foi sujeito, não permite que o instituto use o dinheiro que tem. E por isso sobra. E depois o Estado tira, fazendo com que sejamos duplamente tributados". . A responsável da AEVP sublinha que o objectivo não é a privatização do instituto. "Não queremos que seja uma comissão vitivinícola regional, embora estejamos em desvantagem nesta matéria. Mas entendemos que o vinho do Porto é uma denominação de origem tão forte que é uma marca nacional e não queremos que o IVDP perca as suas funções de certificação e de fiscalização. Só dizemos que este pendor do Estado tem de ser menor, porque está a perturbar o sector", frisa. . Há um ano que esta proposta de alteração jurídica do IVDP vem sendo apresentada e reclamada, mas a mudança do Governo não ajudou. Agora, o Ministério da Agricultura anunciou que até 28 de Outubro publicaria as novas leis orgânicas dos institutos, razão porque a AEVP volta à carga com renovada insistência. "É o momento certo. Já mandamos toda a documentação necessária à tomada de decisões e já pedimos uma audiência à senhora ministra, mas estamos à espera", diz Isabel Marrana. . E se o problema do Estado, em mudar a configuração jurídica do IVDP, se prende com eventuais receitas que espera poder daí arrecadar, os exportadores também têm resposta. "Podemos sempre chegar à conclusão que, se sobra dinheiro, é porque estamos a pagar taxas demasiado altas e que têm de baixar. Não é justo que o Estado vá buscar 1,5 ou 2 milhões todos os anos a um sector que está depauperado", frisa.