Milan Nedeljković, membro do Conselho de Administração da BMW AG responsável pela Produção, e Hans-Peter Kemser, diretor da fábrica de Debrecen.
Milan Nedeljković, membro do Conselho de Administração da BMW AG responsável pela Produção, e Hans-Peter Kemser, diretor da fábrica de Debrecen.Direitos reservados/BMW

A fábrica que nasceu digital para construir o futuro elétrico da BMW

Em Debrecen, na Hungria, tecnologia, sustentabilidade e inovação cruzam-se para dar início à nova era elétrica da BMW. Fábrica de onde sairá o novo iX3 foi a primeira a ser planeada de forma totalmente virtual e funciona sem recurso a combustíveis fósseis.
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Antes ainda de surgir, em betão e aço, na paisagem industrial a noroeste de Debrecen, segunda maior cidade da Hungria, a nova fábrica da BMW já funcionava em pleno num mundo paralelo: o virtual. Cada linha de montagem, cada robot, cada operação logística foi testada e afinada num gémeo digital da unidade, criado através da cooperação entre a marca alemã e gigante tecnológica Nvidia.

Foi nesse espaço virtual que os engenheiros começaram a “ensaiar”, há já dois anos e meio (março de 2023), a produção do primeiro BMW iX3 que, a partir dos finais de outubro, começará a sair em série da unidade húngara. A partir dali, inaugura-se fisicamente a Neue Klasse, a nova geração de automóveis elétricos que vai marcar a próxima década da marca alemã.

A fábrica de Debrecen, cuja inauguração oficial está agendada para o próximo dia 26 de setembro, é a primeira unidade do grupo BMW a ser planeada e validada de forma totalmente virtual. A ideia de uma fábrica concebida digitalmente pode soar a ficção científica, mas é a base da estratégia iFACTORY da BMW: unidades produtivas que são inteligentes, sustentáveis e altamente flexíveis. Em Debrecen, essa filosofia materializa-se com sensores espalhados pela linha de montagem, sistemas de inteligência artificial que monitorizam cada detalhe e veículos que, durante a produção, se tornam eles próprios “participantes ativos” do processo, comunicando dados em tempo real. Até os comboios internos que transportam as baterias de alta voltagem da nova geração (Gen6) circulam de forma autónoma, sem intervenção humana.

“O que fizemos aqui foi um nível completamente novo para todos nós. Na fase inicial, quando só tínhamos este terreno de 400 hectares — 4 milhões de metros quadrados, tudo verde —, simulámos tudo. Já estávamos a trabalhar com todos os nossos planeadores de fábrica espalhados pelo mundo. Até chegámos a discutir a cor das salas. Caminhámos virtualmente por elas. E no fim fizemos algo que nunca tínhamos feito. Chamámos-lhe o ‘carro fantasma’. É até assustador. Deixem-me dizer isto: depois de mais de 28 anos na BMW, isto não é apenas uma nova fábrica. Eu diria que é o início de uma nova era.”, assinalou Hans-Peter Kemser, o diretor da fábrica, numa visita guiada a um grupo de representantes dos media internacionais, para a qual o DN foi convidado.

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O primeiro palco da Neue Klasse

Debrecen não é, portanto, uma fábrica qualquer no universo BMW. A marca alemã investiu aqui cerca de dois mil milhões de euros para fazer desta unidade o berço da Neue Klasse, a nova família de modelos elétricos que promete definir o futuro da marca. Apesar dos esforços da indústria automóvel europeia nos gabinetes de lobbying em Bruxelas para suavizar os rígidos objetivos continentais de eletrificação – esta semana a Comissão já revelou abertura para rever as metas previstas para este ano, prometendo rever também as que traçou para 2035, data para a qual tinha fixado o fim do fabrico de veículos a combustão no espaço europeu - a estratégia de eletrificação da BMW é irreversível, com a marca alemã a visar aumentar significativamente a oferta de veículos elétricos até 2030.

O novo iX3, o primeiro a sair das suas linhas, serve de bandeira desta nova classe: um SUV concebido de raiz para ser elétrico, integrando soluções de design e tecnologia que serão replicadas em mais de 40 novos modelos da marca até 2027.

“Assumimos o desafio de construir um veículo totalmente novo como primeiro trabalho numa fábrica inteiramente nova e fazê-lo da forma mais eficiente possível. Construímos esta fábrica com uma lógica de simplificação máxima: menos processos redundantes, mais digitalização, mais eficiência”, sublinhou Kemser. A mensagem é clara: Debrecen não é apenas um local de produção, é um laboratório vivo para a próxima geração da BMW.

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Produção sem combustíveis fósseis

Se o digital está no ADN da fábrica, a sustentabilidade é o seu coração. Pela primeira vez na história da BMW, uma unidade de produção funciona sem qualquer recurso a combustíveis fósseis. Tudo é alimentado por eletricidade de origem renovável. Para este feito, foi crucial a inovação na área da pintura, tradicionalmente dependente de gás natural para atingir temperaturas elevadas (até 180ºC), mas que em Debrecen passou a operar inteiramente com eletricidade proveniente de renováveis, uma novidade mundial em todo o ecossistema da marca. Só aqui, a poupança de emissões ronda as 12 mil toneladas de CO₂e por ano.

No exterior, um campo de painéis solares com 50 hectares assegura cerca de um quarto das necessidades energéticas da unidade. A energia que sobra em dias de menor consumo é armazenada num sistema térmico com capacidade para 130 megawatts (MWh), pronto a devolver calor quando a procura aumenta. No total, produzir um BMW iX3 em Debrecen gera cerca de 80 kg de CO₂e — dois terços menos do que em modelos equivalentes fabricados noutras unidades do grupo.

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Baterias Gen6: o coração elétrico produzido no local

Outro pilar da inovação é a produção local de baterias. Debrecen será a primeira de cinco fábricas mundiais da BMW com a valência de fabricar e montar nas próprias instalações as novas baterias de sexta geração, conhecidas como Gen6. Esta aposta permite “reduzir custos logísticos e aumentar a eficiência, mas sobretudo garante à marca maior controlo sobre a tecnologia que está no centro da transição elétrica”, refere Hans Peter-Kemser. Para isso, também muito ajuda a proximidade com o fornecedor das células de bateria, a chinesa CATL, que também tem uma fábrica em Debrecen.

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Logística que pensa sozinha

A arquitetura da fábrica não é fruto do acaso. O edifício foi desenhado com uma estrutura em “dedos”, inspirada na unidade de Leipzig mas ainda mais eficiente: permite que 80% das peças cheguem diretamente ao ponto certo da linha de montagem, sem percursos intermédios.

Dentro das instalações, a circulação é assegurada por veículos autónomos que transportam componentes, enquanto robots inteligentes entregam peças mais pequenas no exato momento em que são necessárias. O resultado é uma logística afinada ao milímetro, que reduz custos e tempo de produção.

A fábrica húngara da BMW emprega mais de 2.000 trabalhadores, muitos deles formados em outras fábricas da marca espalhadas pelo mundo, da Alemanha ao México, África do Sul ou China. Para os dirigentes da fabricante alemã, este modelo de circulação de conhecimento faz de Debrecen uma espécie de “plataforma global” onde se cruzam experiências e práticas de diferentes continentes.

No fim de contas, a unidade de Debrecen representa mais do que uma nova linha de produção. É um símbolo da transição para a mobilidade elétrica, uma montra de como pode ser a indústria automóvel do futuro: sem combustíveis fósseis, apoiada em inteligência artificial, com logística autónoma e uma forte integração global. O iX3 será o primeiro a dar corpo a essa nova era.

Um risco? “Sim, mas fazia sentido”

Construir uma fábrica de raiz já é um desafio. Lançar, ao mesmo tempo, um modelo inédito poderia parecer um risco demasiado grande. Milan Nedeljković, membro do Conselho de Administração da BMW AG responsável pela Produção, reconhece-o sem rodeios: “Sim, sabíamos que era arriscado. Mas fazia sentido.”

A decisão de avançar com a unidade de Debrecen, na Hungria, surgiu em 2018, “por questões de capacidade produtiva na Europa”, diz. Na altura, ainda não se pensava no lançamento do iX3. A pandemia de covid-19 travou os trabalhos, mas também trouxe clareza: o futuro seria a Neue Klasse, a nova geração de elétricos da marca. “Então pensámos: um novo carro numa nova fábrica simboliza melhor esta nova era. Um modelo antigo não marcaria a diferença.”

Com a produção em série do BMW iX3 prestes a arrancar, Nedeljković mostra-se satisfeito com a decisão: “Preparámo-nos bem. O risco transformou-se em oportunidade. Conseguimos.”

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Novo BMW iX3 estreia com ADN português e maior autonomia

O futuro elétrico da BMW ganhou um novo rosto com a apresentação do iX3, o primeiro modelo baseado na plataforma Neue Klasse, desenvolvida de raiz para veículos 100% elétricos. O SUV inaugura uma nova era para a marca, marcada por maior autonomia, carregamentos ultrarrápidos e um cockpit digital em que Portugal teve papel de destaque.

A Critical TechWorks, joint venture entre a BMW e a portuguesa Critical Software, foi decisiva no desenvolvimento do novo sistema operativo BMW Operating System X e do interface Panoramic iDrive. O resultado é um cockpit imersivo com ecrã panorâmico ao longo de todo o tablier, realidade aumentada no para-brisas e comandos intuitivos.

No plano técnico, o iX3 estreia a sexta geração do sistema eDrive: dois motores elétricos com 469 cv, tração integral e aceleração dos 0 aos 100 km/h em apenas 4,9 segundos. A nova bateria cilíndrica oferece até 805 km de autonomia (WLTP), com capacidade para repor 372 km em apenas 10 minutos de carga a 400 kW. Segundo a marca, há ganhos de 30% na autonomia da bateria e na velocidade de carregamento.

A produção arranca em finais de outubro na fábrica de Debrecen, Hungria, com chegada ao mercado português prevista para março de 2026. O preço de entrada do iX3 para Portugal está fixado em 72.900 euros.

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