Christophe Girondel recebeu o DN no hub da Nordea na Quinta da Fonte (Paço de Arcos), um espaço despretensioso por fora, mas a fervilhar de atividade por dentro. De facto, é ali que a Nordea Asset Management - já com 150 portugueses a bordo - está a tratar dos projetos de Inteligência Artificial de um grupo com 300 mil milhões de euros em ativos sob gestão. Em ponto está o projeto da Nordea em Portugal?Não é muito conhecido, mas nós temos atualmente uma operação muito grande em Portugal. Já somos 150 pessoas nos escritórios, na gestão de ativos. E não só temos 150 pessoas, como todas as funções são representadas. Temos pessoas de distribuição, de investimento, não é apenas um centro operacional, é completo. E até temos gerentes que têm responsabilidades transfronteiriças. Temos aqui pessoas a quem reportam da Dinamarca, do Luxemburgo. Portanto, é uma operação muito forte, que está muito bem integrada na Nordea Asset Management. E eu acho que as pessoas não sabem em Portugal que temos uma operação tão forte aqui, porque representa cerca de 20% de todo o nosso pessoal. Portanto, não é uma pequena coisa para a Nordea, é até bastante grande.E por que razão a Nordea escolheu Portugal para ter aqui este centro?Uma das primeiras ou grandes razões tem sido o facto de que você tem aqui escolas realmente boas. A Nova, a Católica. E é lá que encontramos, realmente, bom talento.Está em contacto direto com as Universidades para esse fim?Sim, sim. Porque as 150 pessoas que temos aqui são todas portuguesas. Não temos expatriados aqui. Nós viemos aqui pelo talento. Não viemos para cá porque queríamos que os expatriados estivessem em Portugal. Nós abrimos aqui em pleno Covid. E foi um momento difícil. Mas nos últimos cinco anos trabalhámos imenso no sentido de trazer a nossa própria cultura. E estamos a tentar construir uma organização internacional.Muitos dos portugueses que você tem aqui, também trabalharam para empresas internacionais. E os que recebemos das universidades, também os ‘construímos’ dentro da nossa própria organização. Esta foi a nossa viagem.Houve alguma área na operação portuguesa que os tivesse surpreendido, ou a vossa perceção do país bateu certo?No início da operação ainda estávamos no Covid, por isso as pessoas trabalhavam a partir de casa, por isso foi um pouco... difícil criar uma ligação. Mas assim que se abriu, começamos a fazer com que as pessoas viajassem entre os diferentes hubs. Tivemos que investir muito mais do que pensávamos a conectar as pessoas. Mas onde fomos positivamente surpreendidos, ou saiu acima de nossas expectativas, foi a reserva de talento que encontramos aqui. Nas universidades, sim, mas também não nos tínhamos apercebido que vocês tinham tantas pessoas a trabalhar na área financeira. E, portanto, isso foi realmente um benefício para nós.Mas é algo que não é associado a Portugal, que temos bons profissionais a trabalhar no setor financeiro?Não, naturalmente não. Foi uma surpresa muito positiva. Encontrámos talento que não pensávamos que aqui existisse. Dos vários projetos que a Nordea tem em Portugal – e que possa falar deles... – qual é o tem mais impacto na vossa atividade?O que tem mais impacto é este: uma grande parte das nossas equipas de Inteligência Artificial estão a trabalhar a partir daqui, deste edifício. Várias das pessoas que trabalham com Inteligência Artificial na Nordea estão baseadas em Portugal. Temos algumas nos países nórdicos também, mas aqui também.Qual é o tipo de trabalho que eles estão a fazer para a Nordea?Essencialmente, estão a tentar optimizar alguns dos processos que temos. Dou-lhe um exemplo: se temos uma reunião com clientes, fazemos um relatório sobre esse encontro. Com a IA podemos acelerar esse tipo de processo. Alguma coisa com IA preditiva?Não, na verdade estamos a usar mais a IA para optimizar as nossas atividades do que para prever coisas novas. Eu acho que, até certo ponto, a IA só pode ler o passado. O Covid, por exemplo, a IA não poderia prever o Covid. E qual o seu impacto. Aqui existem limitações para este tipo de tecnologia, na medida em que não pode prever o futuro em termos de investimentos.Você pode analisar o passado e até fazer alguma previsão, mas não pode ter certeza suficiente para basear as suas decisões de investimentos nisso.Exatamente.Como grupo, como foram os vossos números na primeira metade do ano? Acho que o desempenho foi muito bom na primeira metade. Mas nós gerimos diferentes vertentes: equity, rendimento fixo. Temos estratégias diferentes. Mas o desempenho tem sido bastante forte, especialmente para nossas estratégias que estão no rendimento fixo. Aqui tivemos uma primeira parte do ano muito, muito boa. Também do lado do equity, na verdade, tivemos bom desempenho..“Onde fomos positivamente surpreendidos, ou saiu acima de nossas expectativas, foi a reserva de talento que encontramos aqui, nas universidades”.Uma parte boa de falar com alguém que está na gestão de ativos, de investimento, é que vocês têm o dedo em cima do pulso da economia. Portanto, pergunto como vê a segunda metade do ano?(Risos) Acho que o mais desafiante é que, no que toca à administração Trump, por exemplo, houve muitos anúncios que não são muito positivos para o mercado. Como, por exemplo, a guerra comercial, a questão das tarifas. Mas os mercados não corrigiram. É como se os mercados estivessem a pensar que medidas aprovadas no lado da dívida vão contrabalançar o que se está a fazer no lado do comércio. Então, o mercado não está reagir de uma forma que diz ‘hmm, isto não é realmente bom para a economia. Pode estar a caminho uma recessão’. O mercado acredita que os estímulos são mais fortes do que o outro lado da balança.E a Nordea?Nós estamos um pouco mais cautelosos sobre isso. Acho que podemos ver, pelo menos no mercado de equity nos EUA, que há um risco que poderá criar uma correção. E na verdade estamos mais positivos em relação à Europa: as taxas de juro têm vindo a cair; acho que a Alemanha tomou uma decisão muito importante em termos de investimento e isso é muito favorável às empresas europeias. Por isso estamos bastante positivos sobre as ações europeias, na verdade.Acredita que as empresas de cibersegurança estarão no futuro numa categoria à parte das empresas tecnológicas?É uma boa pergunta. E honestamente, não sei. Mas é muito claro que a segurança cibernética é um tema muito, muito forte. É um tema extremamente forte no mundo de hoje. Há ataques cibernéticos diários sobre as empresas. Por isso, acho que, definitivamente, é um bom caso de investimento. Acho que é um caso de investimento realmente interessante, na verdade.Acha que as empresas europeias estão a preparar-se para um rearmamento?Fala em empresas ou países europeus?Países, mas também empresas. Sempre que há um conflito que envolve grandes potências, há ganhos económicos para empresas de vários setores. Estão todos a preparar-se para um conflito?Eu não diria isso. No entanto, o que tenho certeza é que temos de estar preparados. E acho que é para isso que todo o sistema está a preparar-se, para o que pode vir. Todos os pacotes financeiros dirigidos ao rearmamento da Europa, todo o trabalho feito em cibersegurança, na independência energética, tudo isso está vivo. Acho que é realmente um grande tema. Por isso lançámos um produto – o Empower Europe – porque achamos que esta é uma grande oportunidade de investimento para as pessoas.Segurança? Defesa? Ciber?Sim, mas também reindustrialização, aproximação das cadeias de produção e distribuição. Tudo isto achamos que é um tema de investimento muito, muito forte.Acredita que o contexto e o Relatório Draghi levarão a União Europeia a, finalmente, ser menos apertada em termos de regras e regulamentação?Primeiro que tudo, acho que é a primeira vez que temos uma discussão muito séria a em nível europeu, em comparação com os anos anteriores, sobre este tema. E eu sou um otimista. Por isso acho que sim: as empresas vão sentir mudanças ao longo do tempo..Gostaríamos de ter no hub de Lisboa uma equipa em torno das 200 pessoas, mais 50 do que agora. Basicamente, esse é o plano para os próximos dois anos .E isso será suficiente para impulsionar as empresas europeias?Isso impulsionará o crescimento. Obviamente que se alguma dessa regulamentação, da burocracia forem removidas, é óbvio que isso é muito positivo para as empresas e para os mercados. Eu acho que é muito claro: estamos num momento crucial para a Europa. É agora ou nunca. A administração Trump está a forçar a Europa a tornar-se mais forte. E acho que todos entenderam essa mensagem.Gostaria de direcionar as minhas perguntas para o futuro. Quais são os planos para esta unidade da Nordea em Portugal?Acho que gostaríamos de ter uma equipa em torno das 200 pessoas, mais 50 do que agora. Basicamente, esse é o plano para os próximos dois anos. E depois vai depender do nosso crescimento como empresa. Se continuarmos a crescer, então o hub vai crescer.Em que consiste um bom crescimento para a Nordea, em termos de ativos sob gestão? Dois dígitos?Em ativos, um bom crescimento é entre 3 e 5%. Dois dígitos... enfim... nós somos grandes. Já gerimos 300 mil milhões de euros. Não há números para Portugal porque é um hub e é um mercado pequeno. Mas queremos crescer também em Portugal. Como grupo estamos a virar para um negócio mais institucional, como fundos de pensões. Estamos a contratar pessoas na Suíça com vista a entrar no mercado de fundos de pensões na Suíça, estamos a contratar pessoas em França para atingir o mercado de fundos de pensões. E estamos a fortalecer as nossas atividades nos Países Baixos nesse mercado.E além do lado mais institucional? Temos estado também muito ativos no que chamamos a nossa estratégia semi-ativa, a beta plus. Acabámos de lançar um ETF e é uma área em que vemos muita procura, porque os clientes querem estar muito perto do benchmark. O outro grande tópico para nós, que vem de quem somos, é a sustentabilidade, o investimento no Ambiente.É mais uma questão institucional, agora, porque os investidores estão menos interessados nisso. Mesmo que eu pense que até certo ponto estão errados, porque como sabe existe um tema com o clima. Portanto, a transição também é uma boa forma de ganhar dinheiro.