Estagnação e crise na dívida são maiores riscos de 2022 para líderes nacionais

Num mundo mais pessimista, relatório anual que habitualmente antecipa o Fórum de Davos põe a economia na frente das preocupações pós-covid em Portugal.
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O mundo está mais atento aos riscos sociais, em particular, aos efeitos de uma crescente perda de coesão social agravada pelas desigualdades, mas em Portugal a última crise parece ser ainda uma memória recente que coloca os receios de estagnação económica e do despertar de uma nova crise de dívida entre as preocupações mais imediatas de quem dirige os negócios do país.

O risco de estagnação económica é o primeiro numa lista de cinco maiores riscos de curto prazo assinalados pelos inquiridos portugueses no Relatório de Riscos Globais de 2022 do Fórum Económico Mundial, que se reuniria na próxima semana em Davos, na Suíça, tendo acabado adiado devido à variante ómicron do novo coronavírus. Nesta edição do documento anual, divulgado nesta terça-feira, são destacados resultados nacionais em 124 países para o que está no topo das preocupações imediatas das lideranças empresariais, a par dos riscos considerados por um painel global de parceiros e consultores do fórum.

Para Portugal, logo a seguir ao risco de ausência de crescimento, seguem-se os riscos de uma crise de dívidas soberanas, de uma crise de emprego e de perda de rendimentos, da desigualdade digital e de colapso ou falha do sistema de segurança social, por esta ordem.

Fernando Chaves, analista de risco da Marsh, uma das organizações principais na preparação do relatório internacional, considera "natural" que o foco empresarial português, desalinhado das principais tendências globais, incida mais nos aspetos económicos. "Estávamos a recuperar finalmente da grande crise de 2008-2009, onde apesar de não sermos o olho do furacão fomos colocados no meio dele. Só fomos colocados no meio dele porque éramos e somos uma economia pouco resiliente, que se adapta com alguma dificuldade a um choque global. Demoramos mais tempo a reagir por diversos fatores", analisa.

O que está em causa no inquérito às perceções dos diferentes países são os riscos previsíveis para os próximos dois anos, lembra, período que se estima curto para a recuperação do sector que até à pandemia mais puxava pela economia nacional. O que também ajuda, segundo Fernando Chaves, a justificar as perspetivas dadas pelos inquiridos portugueses na amostra de mais de 12 mil indivíduos ouvidos em mais de uma centena a de países pela publicação (os dados de caracterização da amostra portuguesa não são divulgados).

"Não vemos o retorno do turismo em massa a Portugal, e os empresários também não o veem, como tema que venha a ter uma resposta no curto prazo, ou seja, nos próximos dois anos, aos níveis que vínhamos a ter até 2019", diz.

O inquérito, que foi conduzido de maio a setembro do ano passado, mostra que a preocupação com um futuro de estagnação económica aumentou globalmente, embora de forma bem menos expressiva que outros riscos, surgindo no top 5 de mais de seis dezenas de países. Contudo, é a maior preocupação em apenas 17 países. Dentre estes, na União Europeia: Croácia, Finlândia e Grécia, além de Portugal.

O cenário de risco de novas crises de dívida é atirado pelo documento do Fórum Económico Mundial para dentro de três a cinco anos, perante a subida do endividamento que um pouco por todo o lado se deu com o combate à covid-19. Mas a opinião dos líderes portugueses ouvidos é outra e antecipa o risco para o horizonte mais próximo.

Na análise de Fernando Chaves, a premência em assinalar o problema justifica-se pela dificuldade de encontrar respostas imediatas para reduzir a dívida. "Não podemos olhar para cada país de forma isolada, tal como não devemos olhar para os riscos de forma isolada. Há toda uma ligação entre economias. Mas a nossa em particular vai precisar de pagar o aumento de dívida que teve, especialmente, nos últimos dois anos, com uma inversão e alteração de políticas forçada, e agora precisa de encontrar respostas numa economia que está degradada. É difícil. Não pode ser feito no imediato e no curto prazo o que habitualmente podia ser feito por via de mais impostos", diz.

Além da preponderância das questões económicas, no topo das preocupações nacionais a possibilidade de um "colapso" da Segurança Social também emerge de uma maneira que não se verifica na generalidade dos outros países, e em nenhum dos outros grupos de inquiridos europeus e no chamado Ocidente. Partilham as preocupações dos empresários portugueses apenas os do Botsuana, Chile, China, Equador, El Salvador, Koweit, Líbano, Mali, Nicarágua, Panamá e Paraguai.

Para Fernando Chaves, tal acontece porque "Portugal tem uma pirâmide etária envelhecida" e a "preocupação tornou-se maior por parte dos líderes porque os sistemas de segurança social acabaram por ser mais stressados nesta fase, com apoios sociais aos mais necessitados".

Os dados para Portugal contrastam não apenas com os de outros países na mesma geografia, mas também com os principais riscos globais imediatos assinalados por mais de 900 parceiros e consultores do Fórum Económico Mundial, para os quais os riscos sociais e associados à emergência climática são os mais prementes num quadro de maior pessimismo frente ao terceiro ano em pandemia (só 15,8% veem perspetivas positivas ou otimistas a nível global).

Em 2022, o risco de perda de coesão social, assinalado em 31 países (incluindo França e Alemanha) é, aliás, aquele que mais cresce relativamente aos resultados da última edição do relatório do Fórum Económico Mundial. Seguem-se os riscos de crises de subsistência, de falhanço na ação climática e de deterioração da saúde mental das populações.

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