Este alemão não nos deixa descalços

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"Merrell? É o iPhone dos sapatos." João Pedro, 18

anos, faz escalada e é fã da marca. Quando lhe digo que vai ter uma

loja nova na Rua do Ouro, responde rápido? "Vou lá passar a

vida."

É isto que Carlos Alemão quer: vender sapatos. Em 1990, Alemão

fundou com o irmão António a Bedivar, que hoje distribui, entre

outras, as marcas Caterpillar, Sperry, Palladium, UGG Australia,

Hunter e Keds - esta depois de conhecer, em 1992, a filha do dono num

avião - para 300 clientes, o que permitiu faturar 14 milhões de

euros em 2011 (vendeu 350 mil pares). A Merrell é o o seu bestseller, concretamente os modelos Waterpro, Moab,

Intercept e Chameleon.

Um sucesso extensível à empresa que

quer atingir, em 2015, os 25 milhões de euros, com 10% de resultados antes de

impostos. A Bedivar, instalada na

Póvoa de Sto.Adrião, numa área de 4500m2 de armazém e 900m2 de

escritório e 300m2 de showroom, tem 30 funcionários. Nos últimos cinco anos vendeu 50

milhões de euros, com resultados antes de impostos superiores a 10%.

Como é que escolhe as novas marcas e os novos modelos?

Vou cinco a seis vezes aos EUA, a Londres, aos sítios onde

aparece aquilo que é relevante. Não somos fashionistas, mas

tentamos ter marcas com grande massa crítica na gama média-alta.

O consumidor português ainda tem de ser educado, ou já conhece

as tendências?

Por causa da Internet e das revistas, as tendências são muito

uniformes. Não temos de educar o consumidor para adotar os modelos

falados por legiões de pessoas, de bloggers...

A Bedivar tem lojas próprias. É uma aposta para reforçar?

Temos duas lojas, uma no Porto e outra em Braga, com conceito

Cat/Merrell. E este mês vamos abrir uma flagship store da Merrell na

Rua do Ouro, em Lisboa. Vai ter um conceito abrangente, porque a

Merrell detém um grande espírito de comunidade, além do respeito

pela natureza e gosto pela aventura. Situada num edifício pombalino

que recuperámos, a loja vai ter, na parte de baixo, sapatos, roupa e

acessórios. Há um jardim vertical que comunica para o piso

superior, onde os fãs da Merrell (mais de 40 mil no Facebook) podem

reunir-se, ler revistas, ver as exposições, ouvir música ou beber

café, orgânico, claro.

É um projeto em contraciclo.

Sim. E ainda outra loja na zona de Lisboa, com conceito

Cat/Merrell, num centro comercial. Estamos a finalizar as

negociações. Portanto, este ano vamos ter duas novas lojas.

Não tem medo de que os portugueses percam poder de compra?

Temos tido uns anos extraordinários. Em ano de hesitação do

consumidor, vamos ter numa ou noutra marca uma pequena retração.

Mas o que esperamos é que o crescimento de umas marcas venha

colmatar a queda de volumes de outras. Temos dois perfis de marcas:

as mais estabilizadas, que nos últimos anos têm vendido muito, e

agora em ascensão ligeira, e as em ascensão acelerada.

Ainda lhe faltam marcas para alguns nichos de mercado?

Estamos a negociar uma nova marca mais abrangente no sentido de

dar para o trabalho, para o dia a dia do homem e da mulher. Mais

popular no preço, apesar de média-alta. Não é desportiva, já que

as principais estão a operar em Portugal como subsidiárias. Eu

próprio estive na Reebok dez anos como distribuidor e managing

diretor (1998-2008). Estaríamos a lutar com mais de dez marcas para

ter 5% do mercado.

A Bedivar nasceu em 1990 criada por dois irmãos. Com que marcas de sapatos começaram?

Sim, somos irmãos, amigos e as coisas mantém-se desde então. O nome Bedivar tem na

origem a junção de dois nomes: Benetton e Di Varese, porque nos

finais dos anos 80 a Benetton era distribuidora da Reebok em Itália.

Eram donos de uma grande fábrica de calçado, a Di Varese, que produzia

os sapatos United Colors of Benetton e Sisley. Pediram-nos

para vender estas marcas em Portugal. O negócio Reebok continuou de uma maneira e

este de outra, instalações físicas

diferentes, armazéns diferentes, software diferente, empregados

diferentes. O negócio com Benetton e Sisley foi um desastre porque

os italianos funcionavam, do ponto de vista operacional, na idade da

pedra, comparado com a excelência das empresas

americanas e inglesas.

Ao segundo ano da Bedivar, ia eu num avião para Madrid e senta-se

ao pé de mim uma americana, filha do dono da Keds. Nessa noite houve

uma festa em Munique. Ela apresentou-me o pai, que simpatizou comigo e que me pediu: "comece a vender por favor isto lá em

Portugal que nós gostávamos desse mercado". Hoje somos o

distribuidor mais antigo, a nível mundial, da Keds. Ninguém resistiu estes anos todos.

Como conseguiram mantê-la?

Tivemos um negócio sólido em que vendíamos entre 20 a 30 mil

pares por ano e depois juntámos à Keds o negócio Sperry top-sider. Um

negócio que era estável tem um pico com um modelo de cunha, o Altitude,

que nos levou a vender cinco vezes mais. Mas depois aparecem empresas

como a Seaside e Status e fomos vítimas de

dezenas de cópias - eles colocavam um logo atrás com a marca

deles - e custavam um terço dos nossos. Passámos de um volume

brutal para quase zero, porque aquilo matou completamente a marca.

Depois seguiu-se um período de reposicionamento da marca

Keds.

Foi preciso procurar mais marcas para sobreviver?

Entretanto, na Bedivar começámos a ter relação com uma grande

empresa norte-americana, a Wolverine e daí vieram duas marcas

extraordinários - a Caterpillar (Cat footwear) e a Merrel - que foram catapultadas para volume muito maiores,

porque fizemos um conceito de retalho que são as lojas Cat/Merrel.

Neste momento há 11 lojas. A Bedivar tem duas dessas lojas (em Braga

e Porto) e as outras estão nas mãos de operadores, tipo

franchisados. Tem sido uma parceria de bastante sucesso, tanto para

nós para eles.

Mas o portfólio continuou a crescer. Com que marcas?

Depois vieram quase todas ao mesmo tempo. K-Swiss, Palladium, UGG

Australia, Hunter, e por fim a New Era.

Quando negoceia a representação de uma dessas marcas olha para

outros mercados?

Há um grande designer alemão, Dieter Rams, que dizia "menos

é mais". Eu digo que, às vezes, "mais é menos".

Fomos várias vezes convidados a distribuir em Espanha, Brasil ou

França. A tentação é dizer logo que sim. A Bedivar já tem o

trabalho (fiscal e logístico) meio feito para começar em Espanha

dentro de seis meses, mas a opção foi avançar apenas na retoma.

Mas está otimista?

Sim, a Bedivar, modéstia à parte, é uma empresa que tentamos

que seja bem governada. Portugal foi um país desgovernado. Tenho

muito orgulho de ser português, mas nós aqui... é um problema. Só

quando nos confrontamos com países quase perfeitos, como a Suíça,

é que vemos o que está errado aqui.

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