
Desenvolver a literacia alimentar e levar informação e consciência à população em geral é, atualmente, a missão da Kitchen Dates, um projeto que nasceu na cozinha de Rui Catalão e de Maria Antunes, quando viviam em Amesterdão há cerca de dez anos. Aos poucos, o casal começou a questionar-se sobre os produtos que comprava e sobre a alimentação que fazia. Os rótulos e as embalagens eram escrutinados ao pormenor, e a curiosidade por saber mais sobre os alimentos levou-os a explorar este mundo, em nada relacionado com as suas carreiras profissionais – Rui trabalhava na comunicação e marketing de uma agência de gestão de carreiras de futebolistas e ciclistas, e Maria no escritório de uma companhia aérea.
Com o conhecimento adquirido, explica Rui Catalão, “começámos a eliminar, passo a passo, a esmagadora maioria dos produtos mais processados que tínhamos na nossa alimentação” e, gradualmente, reforça, “a questionar todo o sistema alimentar e a fazer uma redução progressiva do consumo de carne e de outros produtos de origem animal”.
A dado momento, o fundador do projeto reconhece que a alimentação do casal era tão distinta da maioria das pessoas com quem se relacionava, o que despertou curiosidade e questões, e também o desafio de receberem em casa pessoas com os mesmos interesses e dúvidas alimentares. “Foi um casal amigo que deu a ideia de recebermos desconhecidos que podiam inscrever-se nestes jantares”. Rui reconhece que estranhou a sugestão, “mas a certa altura decidimos experimentar e gostámos tanto da experiência que continuámos a repeti-la durante alguns meses”.
Da experiência ao negócio
Meio ano depois, e já de regresso a Portugal, o casal contava com centenas de seguidores nas redes sociais, onde partilhava conhecimento sobre alimentação, e também as suas experiências alimentares. “O interesse era grande e, por isso, decidimos repetir a experiência dos jantares em casa”, revela Rui que reconhece que o sucesso dos encontros na cozinha deu forma ao projeto Kitchen Dates, que hoje é a ocupação principal dos dois membros do casal.
Sempre que lançavam nova data para um jantar em casa rapidamente esgotava, e o interesse era cada vez maior. “Estes encontros eram não só uma oportunidade de dar a provar a nossa alimentação e de tentar passar, através da comida, determinadas ideias em relação ao sistema alimentar, mas também por as pessoas a discutir o tema e a partilhar ideias”, diz o fundador. A conta no Instagram cresceu de tal forma que entenderam que era o momento de oficializar esta relação empresarial com a KitchenDates.
Mas, a cozinha de casa depressa se tornou pequena para a procura, o que levou o casal a procurar um espaço que seria a extensão de casa, com um ambiente semelhante, mas com mais lugares à mesa. “Abrimos uma espécie de restaurante, onde trabalhávamos apenas com produtos de origem local, de produção biológica, sem gerar desperdício e onde produzíamos de raiz coisas como adoçantes ou a nossa própria farinha e os cereais com que depois fazíamos o pão”, conta Rui Catalão.
Apesar do sucesso, a aventura acabou por ser mais curta do que imaginavam porque o espaço abriu poucos meses antes da pandemia, e deixou de ser possível manter os encontros à mesa. “Quando pudemos reabrir, já numa perspetiva de restaurante mais convencional, com mesas separadas e com uma carta, começámos a sentir que não era exatamente aquilo que queríamos fazer”, explica o fundador. O negócio corria bem, mas Rui e Maria não estavam satisfeitos com o rumo do projeto. “Passei a ser o chef de cozinha, mas deixei de ter tempo para me sentar à mesa com as pessoas e para os momentos de partilha que eram a alma do projeto”, acrescenta.
O restaurante encerrou em 2021, mas, desde então, a Kitchen Dates seguiu um caminho mais ligado à formação e à educação alimentar. No fundo, garante Rui, “a passar uma mensagem de que todos devemos olhar mais para a nossa alimentação, para as escolhas que fazemos e, pouco a pouco, transformar a forma como comemos, porque é cada vez mais evidente que aquilo que fazemos hoje não é sustentável a longo prazo”.
Atualmente, a Kitchen Dates continua a passar a palavra e a educar os diversos públicos sobre questões alimentares através de várias atividades que podem ser desenhadas à medida dos clientes. Desde os projetos de educação alimentar que desenvolvem em parceria com escolas e Organizações Não Governamentais (ONG), aos caterings e outras refeições que organizam em eventos, a pedido de empresas e de outras instituições, workshops e showcookings, não faltam oportunidades de continuar o caminho que definiram como missão.
Além disso, o conhecimento continua a estar disponível para quem tenha interesse em saber mais sobre os alimentos e a forma de comer melhor, quer através do Instagram, de uma newsletter e do podcast ‘Próprio para Consumo’.
Mais recentemente, a Kitchen Dates foi distinguida com um dos prémios Eletrão, na categoria ‘Desperdício Alimentar’. “O prémio está muito focado na gestão de resíduos, e de facto nós já temos muitos anos de trabalho de sensibilização para a redução do desperdício alimentar”, reconhece o fundador.
Para o futuro, Rui e Maria gostariam de voltar às raízes, e “ter a possibilidade de proporcionar mais experiências gastronómicas criadas por nós, muito mais do que os eventos que fazemos”. No fundo, salientam, “trabalhar novamente esse lado mais comunitário de envolver as pessoas à volta da mesa e de pô-las não só a comer o que gostamos de servir, mas também a ter esse lugar próprio para falar e para discutir”.