O caso tem contornos retorcidos. Rui Naldinho, militar já na reforma, pagou o Imposto Único de Circulação (IUC) do seu carro dentro do prazo, usando a referência para pagamento no Multibanco que extraiu do Portal das Finanças. Foi, por isso, com surpresa que alguns dias depois se viu confrontado com uma cartinha da Autoridade Tributária e Aduaneira a dar-lhe conta de que se tinha atrasado no IUC pelo que teria de o pagar novamente e ainda uma coima de 88,25 euros. Contestou, acabou por conseguir reverter o processo e espera que o seu exemplo sirva para que haja uma melhoria nos procedimentos informáticos. O PCP, que enviou ao governo uma pergunta sobre o que se passou com Rui Naldinho, espera que casos destes sejam evitados no futuro.
Da parte da sua repartição de Finanças, Rui Naldinho começou por receber duas explicações possíveis para o sucedido: o problema que originou a cascata de pagamentos em duplicado e de coimas estava no facto de o documento de pagamento do IUC gerado no Portal das Finanças ter sido anulado inadvertidamente pelo contribuinte ou devido a erro informático.
Sem pôr em causa que, de facto, pudesse ter anulado o documento de pagamento sem disso se ter apercebido, Rui Naldinho considera que o sistema informático deveria impedir que uma referência de Multibanco continue válida depois de o documento ter sido anulado.
Mas recuemos ao final de janeiro deste ano. Dois dias antes de expirar o prazo do pagamento do IUC, este militar reformado muniu-se do documento para pagar o imposto, no valor de 133,63 euros e pensou que tinha o assunto arrumado. Puro engano. A 21 de fevereiro recebeu uma notificação da AT a reclamar 88,25 euros (50 euros de coima e 32,25 de custas) por “falta de pagamento do IUC dentro do prazo”. Munido dos comprovativos, avançou para a repartição de Finanças onde ficou a saber da questão da anulação. Em paralelo recebeu nova carta das finanças a reclamar novo IUC, a que foram acrescentados 17 euros de custas. Pagou, de novo o imposto, mas apresentou uma contestação para a coima.
Entretanto, decidiu expor o caso aos deputados, tendo Paulo Sá, do PCP, avançado com uma pergunta ao governo a solicitar explicações para esta caso com “contornos kafkianos” e a alertar para a necessidade de serem tomadas medidas que evitem situações semelhantes no futuro.
Na resposta o Ministério das Finanças afirmou não poder pronunciar-se sobre casos pessoais de contribuintes, mas adiantou ter encaminhado a situação descrita para os serviços competentes da AT.
Rui Naldinho recebeu, entretanto, a devolução do primeiro pagamento do IUC e uma carta da AT a informa-lo de que a coima seria anulada. Acabou, no entanto, por ter de pagar os 17 euros de custas que entende não serem devidas. Mas nem é esta a parte da história que mais o incomoda. “O que está em causa não é ter pago mais ou menos 17 euros. É o abuso da situação”, referiu ao Dinheiro Vivo, manifestando-se chocado pelo facto “o sistema não desativar a referência para pagamento do Multibanco quando o documento é anulado”. “Se assim fosse, o contribuinte ficava a perceber que alguma coisa se passava e teria tempo para ir à repartição de Finanças verificar a situação”, precisa.
Paulo Sá, que acompanhou este caso, acentua que um dos objetivos das perguntas que o Grupo Parlamentar remete para o Governo é ajudar a resolver a situação presente, e também “abrir caminho para que se evitem processos futuros”.
E, neste contexto, referiu ao Dinheiro Vivo, “tenho expectativa que este caso ajude a criar condições para resolver outros semelhantes e evitar que se repitam”.
Número
Os donos carros e motos cujo IUC tem um valor inferior a 10 euros deixaram de ter de se preocupar com este imposto. Em 20 de dezembro de 2016 entrou em vigor uma alteração ao Código do IUC limitou a cobrança a valores superiores a 10 euros.