Em janeiro, o Fundo Monetário Internacional (FMI) projetava, uma retoma global na ordem dos 4,4% em 2022. Agora, no novo panorama económico mundial (outlook), considera que não deve ir além dos 3,6%.
Diz que dois terços dessa perda são explicados pelos efeitos das sanções à Rússia e o contágio internacional provocado pela guerra deste país contra a Ucrânia, que atingiu em cheio a Europa.
Assim é que o resto da erosão na retoma mundial é explicado pelo enfraquecimento da própria economia europeia, muito pela dependência da energia da Rússia, dos cereais da Ucrânia e pela exposição a uma inflação geral demasiado elevada para os cânones monetários e financeiros seguidos na Europa, a partir de Bruxelas e Frankfurt.
O modelo monetário e económico europeu (zona euro) está montado para uma inflação estável em redor dos 2%. O FMI, esta terça-feira, prevê mais do dobro: 5,3% este ano.
A situação é preocupante e pode piorar, avisa a instituição sediada em Washington.
Por exemplo, há três meses, o FMI calculava que a zona euro pudesse avançar 3,9%, mas agora considera que não irá muito além de 2,8% em 2022.
Aliás, a degradação do cenário é evidente. Há cerca de um mês, o Banco Central Europeu (BCE), já com a guerra em velocidade de cruzeiro e avançando com medidas duras para combater a inflação (plano para encarecer o custo do dinheiro e do crédito), projetava um crescimento (cenário central, menos mau) de 3,7% em 2022.
A marca do FMI fica agora mais próxima do cenário "adverso" do BCE (crescimento de 2,5% este ano).
Segundo a entidade dirigida por Kristalina Georgieva, a Alemanha deve avançar apenas 2,1% (em janeiro era 3,8%), França consegue 2,9% (antes 3,5%), Itália pode crescer 2,3% (3,5% em janeiro), Espanha, o maior parceiro económico de Portugal, ainda pode chegar a 4,8% quando, em janeiro, a projeção central apontava para 5,8%.
De acordo com Pierre-Olivier Gourinchas, o economista-chefe do FMI, "as perspetivas económicas globais foram severamente prejudicadas, em grande parte devido à invasão russa da Ucrânia".
"Esta crise desenrola-se quando a economia global ainda não recuperou totalmente da pandemia. Antes da guerra, a inflação em muitos países estava a aumentar devido a desequilíbrios entre oferta e procura e ao apoio das medidas de política seguidas durante a pandemia, o que levou a um aperto da política monetária [subida dos juros através da descontinuação de programa de compras de dívida, no caso do BCE]", argumenta o economista.
Mas há outros receios, novos. "Os mais recentes confinamentos na China [como é o caso da enorme Xangai] podem causar novos estrangulamentos nas cadeias globais de fornecimentos", alerta o alto responsável.
"Neste contexto, para além do seu impacto humanitário imediato e trágico, a guerra irá abrandar o crescimento económico e aumentar a inflação. Os riscos económicos globais aumentaram acentuadamente, e os compromissos políticos tornaram-se ainda mais difíceis", resume o economista.
Portanto, comparando com janeiro, "revimos a nossa projeção de crescimento global em baixa para 3,6% em 2022 e 2023".
"Isto reflete o impacto direto da guerra na Ucrânia e das sanções na Rússia, prevendo-se que ambos os países sofram contrações muito acentuadas".
Além disso, "as perspetivas de crescimento deste ano para a União Europeia foram revistas em baixa em 1,1 pontos percentuais devido aos efeitos indiretos da guerra, tornando-a no segundo maior contribuinte para a revisão global em baixa", observa o mesmo responsável.
Pierre-Olivier Gourinchas argumenta que "a guerra vem juntar-se a uma série de choques de abastecimento que têm atingido a economia global nos últimos anos".
Mas "tal como ondas sísmicas, os seus efeitos irão propagar-se através dos mercados de mercadorias, do comércio e das ligações financeiras distantes e abrangentes".
"A Rússia é um importante fornecedor de petróleo, gás e metais e, juntamente com a Ucrânia, de trigo e milho. A redução da oferta destes produtos de base fez subir acentuadamente os seus preços" e "os importadores destes produtos de base na Europa" estão entre os mais afetados, refere o economista principal do FMI.