FMI corta projeções de crescimento da Zona Euro em 2022

Vaga ómicron e estrangulamentos na oferta de bens atrasam recuperação. Países do euro devem agora crescer 3,9%.
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O Fundo Monetário Internacional (FMI) reviu esta terça-feira em baixa as expectativas de crescimento para este ano, com as projeções de crescimento no espaço do euro a sofrerem um corte de quatro décimas para 3,9%, e as projeções de crescimento global a saírem moderadas também para 4,4% (menos 0,5 pontos percentuais).

No caso europeu, pesam o retomar das restrições à mobilidade devido à atual vaga pandémica da variante ómicron e também a manutenção dos estrangulamentos nas cadeias de abastecimento.

Na maior economia do euro, a Alemanha, a maior exposição ao comércio internacional dita uma das mais profundas revisões em baixa no crescimento, de 0,8 pontos percentuais. Para este ano, o FMI projeta agora uma expansão da economia que não irá além dos 3,8%.

A economia espanhola sofre também uma revisão em baixa de seis décimas, agora com uma projeção de crescimento de 5,8% para este ano, e as economias francesa e italiana surgem agora com um corte de quatro décimas, com o FMI a prever crescimentos de 3,5% e 3,8%, respetivamente.

A nível global, o principal fator detrator do crescimento está nos constrangimentos enfrentados pelas duas maiores economias mundiais, Estados Unidos e China, onde pesam ainda outros fatores para além da nova vaga covid e das disrupções nas cadeias de abastecimento.

O Fundo Monetário Internacional sinaliza, face às últimas projeções conhecidas em outubro passado, que a economia norte-americana não deverá expandir-se além dos 4%, com as previsões a sofrerem uma revisão em baixa de 1,2 pontos percentuais.

As novas perspetivas já tiram do cenário o pacote de estímulo Build Back Better de Joe Biden, e passam a contar com o acelerar do processo de normalização monetária pela Reserva Federal, que nesta semana poderá apontar a data para uma primeira subida nos juros, assim como com a manutenção dos estrangulamentos na oferta de vários bens e matérias-primas.

A projeção de crescimento da economia chinesa também sofre um corte de oito décimas, para 4,8%. No país, a redução do investimento no imobiliário e as fortes restrições à mobilidade das medidas de controlo sanitário têm limitado o consumo privado. São más notícias para os principais parceiros comerciais da China, incluindo União Europeia.

Já para 2023, o cenário global de crescimento surge ligeiramente melhorado, com uma atualização em alta de duas décimas da projeção que vê o produto mundial subir 3,8% face a 2021. A publicação de hoje do FMI explica que a melhoria é efeito mecânico de uma esperada dissipação dos principais obstáculos ao crescimento na segunda metade de 2022, mas que será ainda insuficiente para compensar os impactos mais negativos agora esperados da pandemia.

A projeção de crescimento global em 4,4% neste ano assume que a os piores efeitos da atual vaga da pandemia começam a recuar a partir da primavera.

"O impacto negativo deverá desvanecer a partir do segundo trimestre, assumindo que o aumento global de infeções com ómicron cede e que o vírus não sofre mutações para novas variantes que exijam mais restrições à mobilidade", refere o FMI.

Já os constrangimentos nas cadeias de abastecimento só devem desanuviar mais lá para o final do ano. São, nos cálculos apresentados hoje, responsáveis por uma perda de 1% no produto global e por um incremento de 1% na inflação global subjacente (sem contar preços de energia e de bens alimentares).

O problema com as cadeias de abastecimento, nesta fase, não tem estado tanto na chegada dos bens aos portos, mas antes na logística do abastecimento a partir dos portos, refere a publicação. Mas uma mudança esperada nos consumidores, a de que voltem a orientar-se mais para a compra de serviços, deverá contribuir para melhorar o cenário.

Entretanto, o comércio internacional vai permanecer moderado em 2022 e 2023 também, o que reduzirá, por um lado, o impacto dos atuais desequilíbrios. Na frente das exportações de serviços, avisa ainda o FMI, o turismo mundial vai continuar aquém da recuperação.

As projeções agora apresentadas agravam também expectativas quanto ao comportamento dos preços, com o Fundo Monetário Internacional a assumir agora que estes irão permanecer mais elevados por mais tempo.

Nas economias avançadas, a atualização de perspetivas de hoje agrava a previsão de inflação em 1,6 pontos percentuais, para 3,9%. Carrega também mais duas décimas sobre as projeções anteriores para 2023, antecipando-se 2,1% de subida de preços a nível global no próximo ano.

Já nos mercados emergentes, o FMI estima uma subida da inflação aos 5,9% em 2022 (mais um ponto percentual) e para 4,7% em 2023 (mais 0,4 pontos percentuais).

"A emergência de uma nova variante não foi o único risco que se cristalizou nos últimos meses", refere o fundo liderado por Kristalina Georgieva. "A inflação continuou a aumentar ao longo da segunda metade de 2021, conduzida por diversos fatores de importância variável nas diferentes regiões. Os preços dos combustíveis fósseis quase duplicaram no último ano, fazendo escalar os custos da energia e provocando inflação mais elevada, de forma mais proeminente na Europa".

Ainda assim, "a inflação mais elevada poderá desvanecer quando as disrupções nas cadeias de abastecimento aliviarem, a política monetária contrair, e a procura se reequilibrar na direção dos serviços e menos do consumo intensivo de bens".

O FMI espera também maior moderação no crescimento do preços da energia no biénio 2022-2023, o que ajudará a conter a inflação. A subida dos preços dos alimentos também deverá ser começar a ser contida ainda neste ano.

Entretanto, o crescimento salarial também permanece por agora moderado em grande parte dos países, exceto nos Estados Unidos onde o desemprego se mantém baixo mas a participação no mercado de trabalho permanece aquém dos níveis pré-pandemia, com muitos inativos afastados.

Com a Reserva Federal a antecipar a normalização da política monetária e a perspetiva de uma eventual subida dos juros até 1% até ao final deste ano, há notícias mais preocupantes para as economias em desenvolvimento e mercados emergentes com níveis elevados de endividamento em moeda estrangeira, mas que também implicam subidas nos custos de crédito para o resto do mundo.

Pelo lado do Banco Central Europeu, no entanto, a expectativa é de que as taxas de juros se mantenham sem mexidas até ser visível uma trajetória estável de inflação, ainda que a instituição liderada por Christine Lagarde se prepare para dentro de dois meses terminar as compras líquidas de ativos no programa de emergência criado em resposta à pandemia e transitar para o programa regular de injeções, com níveis mais baixos de estímulo.

As previsões mais negativas agora apresentadas pelo Fundo Monetário Internacional partem ainda assim do princípio de que pelo final do ano a maioria das economias terá ultrapassado os piores efeitos da atual vaga ómicron e que prosseguem os avanços nas taxas de vacinação e terapias disponíveis para combater o coronavírus SARS-CoV-2.

Mas, a instituição de Washington admite que muito ainda pode correr mal. Os principais riscos negativos identificados são os de uma má comunicação por parte da Reserva Federal da trajetória de normalização monetária nos Estados Unidos, de haver constrangimentos mais prolongados na oferta de bens e no mercado de trabalho no caso dos EUA, e de um abrandamento económico mais pronunciado do setor imobiliário chinês. Há ainda que contar com os riscos climáticos e com um cenário atual de fortes tensões geopolíticas. Nomeadamente, em torno da Ucrânia e de Taiwan.

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