A indústria portuguesa de fundição vive dias com "sentimentos agridoce", devido à pandemia de covid-19 ter desacelerado o crescimento, apesar do setor, nos últimos dois anos, nunca ter parado. Atualmente, aposta nas suas competências e no "capital de conhecimento e saber-fazer" acumulado ao longo dos anos no desenvolvimento tecnológico, em inovação e também na sustentabilidade, revela em comunicado o presidente da Associação Portuguesa de Fundição (APF), Filipe Villas-Boas, a pretexto do XIX Congresso Nacional do setor, que se realiza nesta quarta-feira em São João da Madeira.
Mesmo com a nova aposta e com o desenvolvimento tecnológico, a crise energética vivida em quase toda a Europa, por efeito da invasão da Ucrânia pela Rússia, não ajuda. Esta é uma "grande ameaça para a plena recuperação" do setor, acrescenta o presidente da APF. O mesmo explica que esta é uma indústria muito consumidora de eletricidade, frisando que a guerra fez com que existissem várias perdas de competitividade e rendibilidade.
O impacto da crise energética nas indústrias mais expostas aos efeitos do conflito na Ucrânia vai ser abordado no Congresso, quando a presidente executiva do Banco Português de Fomento, Beatriz Freitas, se referir à linha de crédito de apoio à produção, criada pelo Governo para amortecer o aumento dos custos de energia e das matérias-primas na operação das empresas da indústria transformadora e dos transportes e logística.
Este é um setor que está, maioritariamente, implantado nos distritos de Aveiro, Porto e Braga, onde laboram mais de 80% das fundições existentes no país.
Com cerca de 60 empresas em operação, que devem ter fechado o passado ano com um volume de negócios na ordem dos 536 milhões de euros e que asseguram mais de 5000 empregos diretos, a fundição portuguesa há muito tempo que se assume como "fortemente exportadora", enviando para o exterior mais de 90% do que produz.
O subsetor dos não-ferrosos, onde sobressaem a fabricação de peças em ligas de alumínio, quase que unicamente destinadas à indústria automóvel, e as ligas de cobre, é aquele que mais contribui para as exportações do país, com vendas no valor de 325 milhões de euros em 2021. Este subsetor tem vindo a reforçar os seus fornecimentos ao estrangeiro, mas, no caso dos ferrosos, onde se enquadra a produção em ferro fundido e em aço, continua a ter uma quota exportadora importante no panorama da fundição nacional, com transações superiores a 210 milhões de euros no ano passado.
O tema "Fundição - futuro & desafios" foi o escolhido pelos dirigentes da APF para o Congresso Nacional do setor. Esta edição estava marcada para o ano de 2020, mas não se realizou devido às restrições impostas pela pandemia de covid-19 .
O tema do encontro espelha o que o setor atravessa de momento, os desafios e adversidades, depois de uma crise pandémica que afetou o seu maior cliente, a indústria automóvel.
As vendas de automóveis tiveram uma forte paragem nos últimos dois anos, principalmente na Europa, "sendo arriscado prever quando estará normalizado o fornecimento de chips aos principais construtores", adianta o presidente da APF.
Por seu turno, regista-se um incremento das atividades de construção e infraestruturas por quase todo o velho continente. No que toca ao mercado interno, o "investimento na ferrovia, área em que temos experiência e onde queremos reforçar as nossas competências e a capacidade instalada, abre oportunidades interessantes para as nossas empresas e para o país", ressalva Filipe Villas-Boas.
Vários responsáveis do movimento associativo empresarial português têm alertado que pode estar em causa a execução do Programa Nacional de Investimentos 2030, que tem alocados à modernização e expansão da ferrovia no nosso país aproximadamente 10 mil milhões de euros, o que as empresas filiadas na APF encaram como desafio, sublinha comunicado.
O administrador da EDP Comercial, Miguel Fonseca, é o primeiro conferencista do XIX Congresso Nacional de Fundição, logo após a sessão de abertura. Entre cerca de 180 participantes no encontro estão empresários, gestores e técnicos das áreas de engenharia, I&D e inovação, das cerca de 60 empresas de fundições que operam no nosso país. Também vão estar presentes representantes de centros de interface tecnológicos e de instituições de ensino superior, que vão debater os problemas da indústria portuguesa de fundição, partilhar conhecimento técnico e recolher informação estratégica, de modo a acrescentar valor à resposta das empresas e às novas necessidades sentidas no mercado, lê-se na mesma nota.
Nos quatro painéis de debate existentes, vão ser tratados temas da atualidade para o setor como a economia circular, a transição energética, o desenvolvimento de novas tecnologias, investimento na ferrovia, inovação e novos processos de produção (tanto no subsetor dos ferrosos como dos não-ferrosos), digitalização e capacitação da mão-de-obra.
Entre vários especialistas, nacionais e estrangeiros, estará Fynn-Willem Lohe, secretário-geral da CAEF - Associação Europeia de Fundição.